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Portas abertas. Para o fosso?

As últimas décadas da política portuguesa têm sido marcadas pela tibieza que quase todos os partidos têm demonstrado relativamente a assuntos que nos definem como civilização. Embebidos numa mistura de falta de coragem, oportunismo, eleitoralismo e politicamente correcto, a grande maioria dos nossos políticos tem propositadamente evitado tudo o que possa ser socialmente explosivo, e, à custa dessa ausência de verticalidade, têm dançado bailados de ‘mas’ e ‘meio-mas’ em assuntos quanto aos quais nós, como país, já deveríamos ter assumido uma posição inequívoca.

É esse o caso da eutanásia, do aumento das penas para crimes violentos, da perversidade das políticas de subsídios do Estado a quem não quer fazer absolutamente nada, dos apoios do Estado à banca, da melhoria de condições de trabalho para polícias e militares, da relação viciosa entre política e negócios e até da defesa da nossa Identidade Nacional, tantas vezes arrastada para uma guerra sem quartel que é alimentada por tendências ditas pós-modernas. Infelizmente, é também esse o caso da política de imigração e de obtenção de nacionalidade, que têm vindo a ser tratadas com uma displicência que muito nos custa e nos condena.

Quanto a esse assunto, o incêndio que teve lugar em Lisboa, no qual duas pessoas morreram e catorze foram assistidas nos hospitais, todas elas de nacionalidade estrangeira, é apenas mais um dos casos que deveriam levar as lideranças partidárias a criar, de uma vez por todas, leis e regulamentos que não só pusessem fim à selva urbana em que vivem muitos migrantes, mas que também enquadrassem o crescimento das necessidades de mão-de-obra (em sectores como a agricultura, a construção e o turismo) e reforçassem, com meios financeiros e humanos, os órgãos e instituições responsáveis pelo acompanhamento e fiscalização dos imigrantes.

No que toca a estes importantes assuntos, continuarmos com a cabeça enterrada na areia ou escondidos atrás do discurso de que as portas estão abertas para todos até é bom para a fotografia. Porém, as consequências de tal irresponsabilidade estão à vista de todos: cidades com verdadeiros guetos culturais, redes de tráfico humano, aluguer de colchões em prédios sobrelotados e proliferação de trabalhadores precários, com salários baixíssimos e que nem estão inscritos no Serviço Nacional de Saúde. Por outras palavras, um país que se está a converter num oásis migratório, incluindo para quem não tem interesse nenhum em contribuir para o nosso crescimento, mas apenas vem para obter subsídios (pagos por quem trabalha), cometer crimes e apascentar-se à pala de um sistema sem capacidade para proteger seja lá quem for, até os que querem trabalhar e integrar-se civicamente na sociedade que os acolheu.

Ainda neste âmbito, merece especial atenção o que tem sido a atitude de quase todos os partidos no que toca aos requerimentos para a obtenção da nacionalidade. Porque dois dos elementos mais identificativos da cidadania são a língua e a cultura, é lógico que a nacionalidade portuguesa deve ser atribuída apenas aqueles que os conhecem. É isso que é feito em tantos outros países (tais como Reino Unido, Suíça, Alemanha, Estados Unidos e França) e o nosso deveria seguir tais bons exemplos, se mais não fosse porque entendemos que a nacionalidade portuguesa é um património de dimensão mundial, representativo de um percurso civilizacional milenar único, e, por isso, um privilégio que não deve ser entregue ao desbarato ao licitador mais chorudo nem a quem não tem um verdadeiro interesse nos aspectos mais básicos de quem nós somos, como Povo.

Sem dúvida, Portugal deve ser um país que acolhe os imigrantes, incluindo quem foge de guerras e quer construir uma vida honesta. Mas, isso nunca pode significar portas totalmente abertas e entradas de qualquer maneira. Se o exemplo do que se está a passar em países como a França e a Alemanha nos deveria ensinar alguma coisa é de que a integridade do nosso país também passa pela nossa capacidade política de identificar as pessoas e as comunidades que podem interagir melhor connosco. Quando assim não é, a cidadania e a nacionalidade passam a ser moedas baratas de um Povo que age como se não soubesse quem é, nem o quanto vale.