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Em busca do elixir da verdade

Quem está no poder, tem controlo, e embebeda-se por mais poder. Os camaradas de esquerda sabem bem o que é esta tentação, até pela visão tentacular e paternalista que têm, do que deve ser o “Estado”, e do abraço-de-urso que lhes inspira à medida que nos apertam sempre com mais impostos, e agora mais recentemente com a tentação de controlarem a “verdade” nas avenidas da internet que se lhes escapa.

A obsessão de fazer os “fact-checks”, da informação fidedigna e da falsa informação, tem um substrato bem menos altruísta, do que aquela bonomia que nos pretendem impingir com muito amaciador à mistura. Essa moda emergente parte do pressuposto de que a maioria dos leitores/consumidores são estúpidos, e de que há uma patranha por detrás do biombo, para orientar uma manada acéfala. Por outro lado muitos dos arautos dos “media” convencionais, que lidam mal com as redes sociais e a blogosfera, vêm aí sempre uma ameaça, à medida que o desinvestimento aliado à quebra de receitas, quer por via do mercado publicitário, quer pela exiguidade de subscritores, os definha, desqualifica e em suma, até os desacredita. Todavia, o rigor não tem de ser necessariamente mercantilizado e desvirtuado, havendo felizmente no nosso panorama honradas exceções.

Com o advento das novas tecnologias e com a crescente democratização no seu generalizado acesso, por oposição ao privilégio das antigas elites, todos têm potencialmente “voz”. E como reflexo dessa explosão de manifestos, fica estampada a pulsão da sociedade com todas as suas virtudes e desvios, enquanto expressão duma comunidade livre, democrática e que abraça a “modernidade” e um dos pilares da transição digital que é a informação.

Ter acesso a mais conteúdos, não significa ser-se mais informado. Além do mais alguns títulos consagrados e convencionais, não são mais as vacas-sagradas da informação fidedigna e inquestionável, que determinavam as agendas da atualidade. Até porque a atualidade é cada vez mais efémera e, a voracidade informativa já não se compadece das escolhas alheias, nem dos estágios básicos da “digestão informativa” que muito ajudava na assimilação dos conteúdos. Esta estonteante velocidade temperada com algoritmos que enveredam o nosso olhar, é potencialmente enganadora pois, não raras as vezes, olhamos o foco do projetor, enquanto a “verdade” e o relevante está na zona de penumbra do palco. Da mesma forma deixamo-nos seduzir pelas letras garrafais da primeira página, ou alerta informativo do nosso apelativo monitor, apenas porque a informação vem em forma dum espetáculo que prende a atenção. Ora, tudo isto é uma evidência, porventura uma necessidade no atual modelo de negócio da “informação”, contudo, não devemos assumir que a generalidade da população seja suscetível a estes desvirtuamentos a que muito se assiste. Mais me provoca náusea pensar sequer, que o Estado, tenha a cor que tiver, se sinta tentado a se imiscuir enquanto “provedor da verdade” através duma entidade como a ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) - uma completa aberração - em jeito de lápis censor daquilo que deve, ou não, ser veiculado. O elixir da verdade já não depende do feiticeiro.