Artigos

Repensar o território: uma nova oportunidade

Já aqui escrevi no passado que se a Madeira fosse um barco já teria indo ao fundo por excesso de peso a bombordo: Funchal, Santa Cruz e Câmara de Lobos (3 dos 11 concelhos da Madeira) têm sozinhos 72% da população. E esta distribuição tão assimétrica não só nem sempre foi assim, como nas últimas décadas se tem vindo a agravar.

Este fenómeno também acontece no Continente português, especialmente entre o litoral e o interior e em tantos outros territórios onde as migrações foram moldando a forma como os habitantes se distribuem nos territórios.

As pessoas procuram as urbes porque é nelas que se concentram as maiores possibilidades de emprego, habitação e outras oportunidades a diversos níveis. Isso continua a ser verdade, mas não tem de ser sempre assim e a vivência deste último ano e meio mostra que muito pode mudar na repovoação do território. Para isso acontecer temos três alavancas estruturais (às quais se podem juntar outros incentivos mais pontuais) e que são: as infraestruturas rodoviárias que construímos num passado recente, o teletrabalho (que se tem vindo a afirmar no sector privado, mas também no público) e, futuramente, melhores conexões e ainda melhores possibilidades ao nível das telecomunicações.

Rodovia: é hoje muito mais rápido circular na Região do que há 30 anos atrás e dentro da mesma geração todos experimentámos uma evolução que julgávamos impensável. Estamos perante novas possibilidades de inverter a tendência. Aquilo que procuramos como lazer para uma parte da semana pode começar a ser o espaço onde habitaremos a maior parte da semana.

Teletrabalho: as contingências da pandemia vieram mostrar (tema que também aqui já abordei no passado) que é possível um sistema misto entre o presencial e o remoto perante a entidade patronal, seja pública ou privada, mas, como é óbvio, apenas nas funções profissionais em que isso é possível. Se um dos problemas para viver mais longe das maiores cidades é, precisamente, viver longe delas, então o problema minora se não for necessária a deslocação, todos os dias, para essas cidades.

Conectividade: a crescente melhoria da conectividade em todo o território regional (e o futuro só trará melhorias a este nível) conseguirá que o teletrabalho em tempo parcial possa não só ser produtivo como uma realidade bastante mais presente nas vidas de muitas pessoas.

Independentemente da vontade de cada pessoa poder escolher o local específico do território onde se pretende instalar, a verdade é que hoje é seguramente mais fácil estarmos mais dispersos pela ilha, com conforto e sem estarmos tão distantes, na realidade, uns dos outros. E dispersar as pessoas pelo território de forma mais “equitativa” é dispersar massa crítica, investimento, emprego e valorização do próprio território. Estas movimentações não se fazem no quadro de uma legislatura, nem com um par de incentivos; têm de ser uma aposta estruturada e de todos, para voltarmos a olhar o nosso território e pensarmos que daqui a algumas décadas o podemos estar a habitar de forma mais sustentada, mais harmoniosa e mais feliz.