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A Festa da Esperança

A Festa somos nós, o povo que somos, que se orgulha da sua terra e desta forma tão nossa de viver

Talvez 2020 não deixe motivos para grandes festejos colectivos, a não ser o essencial de estarmos vivos, uma espécie de mote quanto baste para sairmos da anestesia do tempo e modo de vida a que este ano, marcado pela pandemia, nos sujeitou. Mas se o essencial da Festa é a vida colectiva que celebramos, como poderemos então vivê-la, distantes uns dos outros?

Estou convencido que a melhor forma será celebrando, ainda assim, a relação com os outros, apesar da distância. As tradições da época festiva ajudam, mas na sua ausência forçada e daqueles que habitualmente nos visitam, agarremo-nos à proximidade possível. Comecemos por cuidar dos nossos idosos: protegê-los não é abandoná-los à sua sorte, sobretudo para quem tem na família tudo o que lhes resta verdadeiramente. E também não peçam aos mais jovens que fiquem longe, porque se é certo que são eles quem, noutras guerras, partem primeiro na linha da frente, não é este o tempo para lhes pedirmos mais sacrifícios ainda. Depois, olhemos para o futuro: 2020 confirmou a nossa resiliência – e sendo certo que exigiu o melhor de nós, grande sentido de dever e responsabilidade, em alguns momentos revelou também o pior, quando à solidariedade colectiva se sobrepôs o egoísmo individualista de visões curtas.

Do meu 2020, ficam sobretudo cinco convicções. A primeira, sobre a importância que a Saúde assume enquanto pilar fundamental do desenvolvimento individual e social, a par da Educação, da Habitação e do Emprego. O direito à protecção da saúde nunca poderá ser colocado em causa, consagrado durante esta pandemia pelo Estado e pelo serviço público, de acordo com o que a Lei de Bases determina: a cada um de acordo com as suas necessidades e independentemente das suas possibilidades. A segunda, sobre a relevância da política: se dúvidas existissem de que tudo na nossa vida é condicionado por escolhas políticas, esta pandemia veio dissipá-las, neste tempo em que os nossos direitos e garantias individuais se subjugaram aos ditames da salvaguarda da Saúde Pública. A terceira é a imprescindível relevância da nossa Autonomia, que deve ser utilizada pela positiva e ser construtiva, para que consigamos fazer mais e melhor em todas as áreas sob a nossa responsabilidade. A quarta, a confirmação da importância do poder local, das Câmaras e das Juntas de Freguesia, que, num momento de especial dificuldade, fizeram da sua proximidade à população a melhor forma de apoiar quem mais precisa. A quinta está relacionada com a dimensão que “o outro” representa na nossa vida: num ano marcado por isolamentos e confinamentos, compreendemos todos como nos realizamos na justa dimensão da relação com os outros. Educados que somos para o colectivo, mantenho vivo o desejo de que todos voltemos a tê-lo nas nossas vidas, tão depressa quanto possível, sem limitações de tempo, espaço, ou número, para que a vida se faça novamente plena.

Perante a maior provação colectiva que muitos enfrentámos até hoje, é importante que mantenhamos a capacidade de perspectiva e de olhar em frente. Se resistimos a 2020, com mais ou menos fogo de artifício, melhor ou pior vista, entremos em 2021 com a esperança, a confiança e a determinação de quem se disponibiliza para superar outros obstáculos, com capacidade de aprender e corrigir caminhos. Que a Festa seja o momento de viragem por que esperamos, convictos de que à vacina para a doença juntar-se-ão outras que nos ajudarão a superar os desafios económicos, sociais e políticos que temos pela frente, sem deixar ninguém para trás. Que em 2021 se criem amplos consensos, sociais e políticos, para uma década de desenvolvimento que faça da Madeira de 2030 melhor que a do fatídico ano de 2020.

A Festa somos nós, o povo que somos, que se orgulha da sua terra, das suas gentes e desta forma tão nossa de viver: ingovernável, dirão uns; incontestável, dirão outros. Não se esqueçam, por isso, do essencial da Festa: as pessoas que somos e a terra que queremos ser. Luzes já temos; tenhamos também Futuro para onde olhar.

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