Natal essencial e constrangimentos

Natal de exceção, podíamos chamar a este Natal. Há quase um ano a viver sob o império do Covid-19, chegámos a este Natal, mais pequeninos, como o Menino. As luzes a anunciar a LUZ, não apagam as cenas de dor dos hospitais e das famílias enlutadas; as vacinas há meses anunciadas e, agora, chegadas, não estão ainda a mudar os cenários de ruas de gente de máscara que se esquiva à presença dos que possam oferecer ameaças; os hotéis, restaurantes e lojas mantêm espaços fantasmas; as salas de aula das escolas, ora cheias ora vazias; as festas familiares, comedidas ou proibidas, vão prolongando a modesta pobreza festiva do Natal e Ano Novo. E para os cristãos? As igrejas, a um terço de ocupação imposta, e as missas do parto sem aparatos festivos, antes e depois da celebração, reduzem-se à riqueza da gruta de Belém, mais cheias de Deus que de movimentação em festa de humanos. Os cristãos são como pobres pastores, a ser chamados pelos anjos; e a cidade, como a de Belém, a ignorar Cristo que eles foram visitar em alegria. A experiência de alguns sacerdotes torna-se mais de celebração na pobreza e pequenez com reduzidos grupos que aceitam o convite de viver o Natal de sempre. O Natal é sempre o da vinda do Filho de Deus, nascido homem, a visitar os homens, filhos do Pai do Céu. Faltam as grandezas da noitada, o consumismo do progresso endeusado, os jogos de quem é o maior pelos luxos ostensivos? Abundam os constrangimentos das máscaras e dos confinamentos? Enfim, tanta coisa que não têm nada a ver com o Aniversariante do dia 25 e dos 8 dias e aos 40 no templo, até ao nome e identidade única revelada. Nos hospitais, lares de idosos e cemitérios e seus lugares de celebração é onde mais se vive um Natal de limitações, apertos e exceções, e muitos cuidados. Nem faltam os choros, os lutos e faltas de espaço, os apertos de mão, os abraços e encostos ao ombro dos que podiam aliviar a dor e sofrimentos de perda. Mas o Menino, em meios tão vazios e tão confinados, é o mesmo. E sua Mãe quase é obrigada a viver, ao mesmo tempo, a alegria da Visitação, do Natal, do dia do Nome de Jesus e da sua apresentação no Templo, e tristeza, em cada infetado, em cada falecido, em cada funeral e cemitério. Tem que se juntar a tantos dos seus filhos e viver, em simultâneo, as duas profecias de Semião e do Espírito Santo, que os abençoou e disse a Maria, sua mãe: «Eis que Ele está aqui para a queda e o ressurgir de muitos em Israel e para ser um sinal de contradição– e uma espada trespassará a tua própria alma – a fim de se revelarem os pensamentos de muitos corações». E Simeão apesar do confinamento de idoso, pôde ter o Menino nos braços e sentir-se realizado para partir desta vida: «Agora, Senhor, podes deixar partir em paz o teu servo segundo a tua palavra, porque os meus olhos viram a tua salvação que preparaste diante de todos os povos: luz para revelação aos pagãos e glória do teu povo, Israel» (Lc 2, 25-35). Para Jesus, o protagonista, a colaboradora número um, Maria, os atores secundários em Belém, o Natal perdeu O sentido essencial por terem acontecido os constrangimentos de viagem, falta de estalagem, do aconchego da prima Isabel e pela perseguição de Herodes e fuga de refugiado para o Egito. E ainda por ter que ser em gruta, com o mínimo dos mínimos da palha, animais, manjedoura. Mas teve os pobres pastores e os anjos celestiais. E hoje? Aqueles que se esquecem do bebé no dia do batismo ficam de mãos vazias e têm que recomeçar. Para os que vão ao batismo por causa do bebé e não para ostentarem roupas de moda ou almoçar no restaurante mais chique de todos, nada mudou de essencial. Lá porque se deve ter cuidado e lavar as mãos, não se vai deitar o bebé fora com a água do banho. Apesar de tudo, muito Bom Natal para todos os leitores!

Aires Gameiro

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