Portugal já atingiu 30% de área marinha protegida com um papel decisivo da Madeira?
Ao longo da última semana de Outubro de 2025, circularam, em Portugal, incluindo na Madeira, notícias e comentários a sugerir que Portugal já teria alcançado 30% de áreas marinhas protegidas (AMP), atribuindo à Região um papel ‘decisivo’. Tais notícias e comentários surgiram a propósito da iniciativa do Governo da República, de criação da Reserva Marinha Madeira-Tore.
No entanto, terá Portugal já atingido os 30% de áreas marinhas protegida e, se sim, a Madeira foi fundamental nessa realidade?
A verificação da veracidade do que foi dito e comentado vai assentar, antes de tudo, na leitura atenta do que foi dito, do que foi decidido e anunciado publicamente.
No dias 24 e 25 de Outubro, a generalidade da imprensa nacional e o DIÁRIO (dia 25) divulgaram a iniciativa do Governo da República, através do Despacho n.º 12518/2025, de 24 de Outubro, que “inicia os procedimentos técnicos e jurídicos com vista à criação da Reserva Natural Marinha de Madeira-Tore, incluindo o Banco de Gorringe”. Tratou-se de um acto de arranque (delimitação, estudos, audiências), não da criação efectiva da área protegida.
As notícias da Lusa e da generalidade da imprensa nacional, nessa semana, são claras: Portugal prevê atingir 30% de AMP em 2026, antecipando a meta europeia de 2030, quando a nova reserva estiver concluída. Não há qualquer indicação de que os 30% já tenham sido alcançados neste momento.
Quanto à dimensão da nova área em preparação, a Lusa, na senda do que é afirmado no próprio Despacho, apontou para uma ordem de grandeza de sensivelmente 200 mil Km quadrados, abrangendo montes submarinos e planícies abissais entre o Cabo de São Vicente (Sagres) e a Madeira – ou seja, uma reserva oceânica nacional, não somente uma AMP regional da Madeira, ainda que boa parte dela se situe na área da Zona Económica Exclusiva da Madeira.
Aliás, como o DIÁRIO noticiou, o Governo Regional associou-se à iniciativa ‘como parceiro central no desenvolvimento de um projecto de grande escala’.
Nesse mesmo texto do DIÁRIO, foi reafirmado algo já noticiado anteriormente, que, ‘com 89% do mar territorial já sob regime de protecção, a Madeira é o território nacional com maior percentagem de área marinha protegida’. Mas isso não significa que seja a Região com um contributo ‘decisivo’ para Portugal Atingir os referidos 30%. Vejamos, então, qual é o peso específico da Madeira no total nacional.
As AMP efectivamente existentes na Região são muito relevantes ecologicamente mas pequenas em área, quando comparadas com os ‘blocos’ oceânicos. Destacam-se as Ilhas Selvagens, com 2.677 km quadrados, área de protecção total. Outras áreas costeiras de pequena dimensão juntam-se aos espaços protegidos, como a Rocha do Navio, Garajau, Cabo Girão, Ponta do Pargo, Porto Santo, etc.). Estes números, por si, não explicam o salto para os 30% nacionais.
Por contraste, o grande contributo quantitativo anterior veio dos Açores, que, em Outubro de 2024, aprovaram a maior AMP do Atlântico Norte, com cerca de 300 mil km quadrados (Parque Marinho dos Açores/’RAMPA’), passo amplamente noticiado e enquadrado em diploma regional aprovado pelo parlamento açoriano no dia 17 de Outubro e publicado em Diário da República a 24 de Dezembro, também de 2024.
No entanto, o contributo da Madeira não deixa de ser importante, mesmo percentualmente. Se não, vejamos. A Zona Económica Exclusiva total portuguesa é de 1.727.408 km quadrados. (continente, Açores, Madeira). 30% da ZEE equivalem a 518.222 km quadrados.
A combinação das AMP dos Açores (300 mil) mais a nova reserva (200 mil) dão sensivelmente 500.000 km quadrados. Só somando estas duas às já existentes - continentais e atlânticas, por exemplo, as Selvagens, Garajau, Rocha do Navio, etc.) permitirá ultrapassar o patamar dos 30%, quando a nova reserva for formalmente classificada.
Como se constata, o que foi decidido e anunciado revela que o Governo da República iniciou formalmente o processo para criar uma nova grande reserva oceânica entre Sagres e a Madeira, com a qual prevê atingir 30%, em 2026, de áreas marinhas protegidas e não neste momento. Quanto ao papel ‘decisivo’ da Madeira, os números conhecidos indicam que o salto estrutural rumo a referida meta resulta sobretudo das AMP dos Açores (cerca de 300 mil km quadrados, 2024) e da nova reserva oceânica, agora em projecto (cerca de 200 mil km quadrados), que é de jurisdição nacional e não uma AMP da Madeira, ainda que esta seja parceira do projecto.
Pelo explicado, avaliamos a afirmação como imprecisa