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A polémica do logótipo

A primeira decisão do Conselho de Ministros foi alterar o logótipo oficial. Há quem condene e também quem louve o recuo.

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Foi a primeira decisão do primeiro Conselho de Ministros do XXIV Governo Constitucional. António Leitão Amaro, ministro da Presidência saiu desta primeira reunião, ontem, a afirmar que: “Tomámos já decisões, a primeira corresponde a um compromisso, o de alterar o logótipo que representa a imagem do Governo da República portuguesa, regressando a uma imagem que tinha sido usada por vários governos anteriores e que repõe símbolos essenciais da nossa identidade, da nossa história e da nossa cultura.”

Efectivamente, a alteração de imagem já era visível desde terça-feira. Após a tomada de posse do novo Executivo, a página da Internet do Governo e também os emails enviados pela Presidência do Conselho de Ministros figuravam já o logótipo que volta a ter a esfera armilar com o escudo, quinas e castelos. A alteração de imagem era um compromisso assumido por Luís Montenegro muito antes da campanha para as eleições de 10 de Março, de onde saiu vencedor.

Já a anterior alteração do logótipo, pelo último executivo de António Costa, tinha gerado polémica pela simplificação da imagem. Recua-se a decisão e a polémica regressa, havendo que acuse o Executivo de “matar o design” em Portugal.

O antigo logótipo

A alteração, feita em 2023, foi fruto de um investimento de 74 mil euros, e resultou numa nova imagem, com formas geométricas simples, facilmente associadas à bandeira nacional, e em que foi retirada a esfera armilar, as quinas e os castelos.

No manual de aplicação da identidade visual, que data de Setembro de 2023, é possível ler-se: “A referência matricial no desenvolvimento da nova imagem do Governo da República Portuguesa é a bandeira nacional.” Sendo que, os símbolos foram retirados “para que não se torne uma cópia ou uma adaptação livre da bandeira original”.

Eduardo Aires, designer responsável por esta nova (agora antiga) identidade, afirmava que “adoptando o mesmo cuidado e parcimónia que outros países impõem na utilização dos seus símbolos nacionais, esta representação tem o cuidado de se cingir a uma forma abstracta, isenta, para assim representar o Executivo da República Portuguesa”.

O compromisso de Montenegro

Foi a 2 de Dezembro de 2024 que Luís Montenegro se comprometeu a, ganhando as eleições, deixar de usar o novo símbolo institucional do Governo de Costa. Na altura, o agora primeiro-ministro afirmava: “É que faz toda a diferença, nós nos nosso projecto não fazemos sucumbir as nossas referências históricas e identitárias a uma ideia de ser mais sofisticados, connosco não há disso. Já chega de política de plástico.”

Durante a campanha eleitoral, o antigo primeiro-ministro Durão Barroso criticou também a alteração do símbolo institucional do Governo. “Diziam eles que o logótipo, as nossas antigas armas, não eram suficientemente inclusivas, que há uma parte das pessoas que não se identificam com elas. Mas se esses portugueses não se identificam com o nosso brasão de armas, então para mim não são verdadeiros portugueses, nós não temos símbolos mais inclusivos do que esses", defendeu.

O descontentamento de Eduardo Aires

O autor da imagem que foi ontem oficialmente substituída entende que a mudança é “em parte ideológica e em parte estratégica”. O designer Eduardo Aires explica: “É estratégica e interessa à Aliança Democrática, porque acentua a demarcação simbólica em relação ao Partido Socialista, e capta o eleitorado flutuante ao Chega. Mas nesse processo é cega. Não reconhece nem está minimamente interessa em conhecer. Desvaloriza, desconsidera e deita fora o bebé com a água do banho.”

A morte do design

O estúdio de design Studio Merge, baseado no Porto, anunciava ontem a “morte do design” em Portugal. Numa publicação no Instagram relevaram “a importância que a nova identidade da República Portuguesa tem para um designer”. Assim, acordaram tristes ao “perceber que o valor daquilo que se faz em Portugal desapareceu”, sendo que para além “da já inexistência da valorização do design em Portugal, essa ausência acaba de ser decretada pelo Governo Português”. Foi, então, segundo o Studio Merge, “um dia triste para o design”. Deixavam a questão: “Como pode uma identidade tão bem reconhecida pelos pares, não só a nível nacional como internacional, existir num Portugal antiquado e conservador?”. A resposta: “Não pode.”

O congratular o regresso

Em Dezembro do ano passado, num texto de opinião no Eco, o director da agência Ivity Brand Corp assumia-se “manifestamente contra” a alteração da identidade da República Portuguesa, descrevendo como uma “simplificadeira” a identidade visual criada pelo Studio Eduardo Aires. Considerou a imagem: “Uma matriz ideológica que se diz inclusiva, plural e laica e esconde um desprezo pelo nosso caminho enquanto nação”. Não será surpresa que, agora, Carlos Coelho congratule o regresso ao anterior logótipo, afirmando que “os símbolos nacionais não podem ser motivo de brincadeira”.

A inversão total de prioridades

Mafalda Anjos, comentadora da CNN Portugal, entende que a primeira decisão do Conselho de Ministros “é uma inversão total de prioridades”. Justifica esta opinião com o facto de este tema “não ter nenhum impacto no dia-a-dia dos portugueses”. É, segundo a comentadora, “uma concessão ao discurso do Chega, uma entrada por territórios de elevado conservadorismo, que não faz sentido para um Governo que se apresenta de centro-direita, e que diz querer resolver os problemas dos portugueses”.

O debate que é um ‘fait diver’

O secretário-geral da Juventude Socialista, que é também deputado na Assembleia da República, considera todo este debate um ‘fait diver’. Miguel Costa Matos entende que esta é “uma discussão um bocadinho estéril”, mas admite ficar surpreendido pelo facto de ter sido a primeira decisão tomada após o Conselho de Ministros, “de todas as coisas que podiam fazer”. “É a prova real de que este Governo vai ser mais sobre recuar até aos anos passados do que andar para o futuro, não augura nada de bom”, critica.