Crónicas

Falta de visão estratégica na política externa portuguesa

Temos andado nos últimos 15 anos apenas e só preocupados com a União Europeia. Não que ela não seja importante, claro que é, mas o nosso factor diferenciador, sempre foi a nossa ligação umbilical com os Países de Língua Portuguesa

“Estamos a olhar com mais intensidade para África e aprovámos há dois anos um novo plano em que África ganha mais importância na política exterior”. Não! Infelizmente não são palavras de António Costa, mas sim de Pedro Sanchez o seu homólogo espanhol. Na verdade, Portugal acordou com estas palavras e de repente toda a gente se lembrou do que têm sido uma sucessão de erros estratégicos, colossais para o futuro do nosso País. Mas vamos por partes. Temos andado nos últimos 15 anos apenas e só preocupados com a União Europeia. Não que ela não seja importante, claro que é, mas o nosso factor diferenciador, sempre foi a nossa ligação umbilical com os Países de Língua Portuguesa. Quer seja pela língua, que é um facilitador de negócios, quer pela afinidade existente desde os tempos coloniais, que se traduz numa proximidade cultural e afetiva, no que diz respeito às pessoas, mas também em relação aos nossos produtos.

Se queremos ser grandes, temos que assumir essa universalidade que sempre nos caracterizou e já nos devíamos ter assumido como a cola entre a União Europeia e os PALOP. Mas na realidade, andamos tão assoberbados com o nosso pequeno umbigo e sempre tão diligentes a entregar as nossas energias a pedir desculpas pelo racismo e por existirmos, que nos esquecemos de construir. E construir, nesses Países, significa também ajudar a melhorar as condições de vida dos que lá vivem. Já o disse e repito, daqui por uns anos, quando decidirmos voltar a África, quando África estiver “na moda”, iremos chorar porque não conseguiremos competir com Países com maior poderio económico e com uma banca mais estruturada e robusta, mas talvez nessa altura alguém faça questão de nos lembrar os anos com que partimos de avanço, as oportunidades que tivemos para alavancar a nossa economia, dando força à desses mesmos Países, e o que ( não ) fizemos para que esse património imaterial chamado língua portuguesa prosperasse.

Deixámos a CPLP definhar, ao ponto de hoje em dia ter esvaziado todo o seu conteúdo ou influência. Hoje não serve basicamente para nada e precisava urgentemente de ser refundada. Numa altura em que temos a presidência da União Europeia, roça o ridículo não desenvolvermos uma Cimeira com os Países que compõem a CPLP. Diplomacia pouca ou nenhuma e a nossa esfera de influencia vai-se perdendo aos poucos. Afastámos daqui o investimento angolano, com o pretexto de que todo o dinheiro que aqui chegava era sujo. Fomos até bem mais exigentes com eles do que com cidadãos de outros Países, com quem nunca tivemos qualquer ligação histórica. Estamos a deixar que escolas de outros países cresçam, nas nossas barbas, deixando as nossas obsoletas, ou a rebentar pelas costuras. Cada vez criamos menos instrumentos financeiros para apoiar as nossas empresas a investir na África Lusófona, e quando os criamos, como a InvestiMoz, é tão burocrático que só duas ou três conseguem lá chegar. Estamos a desistir de um espaço económico e social que nos poderia catapultar para outra dimensão, mas mais importante, que tem tudo a ver connosco. Nós temos famílias lá, eles têm famílias cá. Somos uns e outros e não sabemos crescer em conjunto, por um complexo histórico e por falta de visão estratégica.

África, para quem a conhece, é um paraíso por explorar. Cheia de problemas é certo, mas também repleta de oportunidades. Com muitas pessoas que falam a nossa língua, que vibram com os nossos clubes de futebol. Que veem os nossos canais de televisão, as nossas novelas e notícias. Que escolhem o vinho que tem o rótulo escrito em português nas prateleiras dos supermercados. Que se identificam connosco e que nos tratam com carinho. Pessoas que mesmo depois da descolonização, preferem os portugueses aos outros. Que são nossos cúmplices, nossos amigos. E devem ser por todas essas razões e mais algumas, parceiros estratégicos privilegiados. Se nós não temos uma banca pujante como a espanhola, ou empresas de dimensão mundial como a França, temos que chegar primeiro. Na vida quem chega primeiro tem sempre vantagem. E chegar primeiro aqui é apontar a nossa política externa para África e desenvolver com esses Países uma visão estratégica para o futuro. Com esses mas não só. Portugal deveria ter um papel crucial em todo o continente até por ser visto por muitos com neutralidade.