Crónicas

O jornalismo precisa de tratamento

O jornalismo deveria ser ao dia de hoje um garante da verdade e independência como foi em tantos exemplos da nossa história. Mas na realidade, tornou-se mais numa agência organizada de mexericos, tendenciosa e por vezes egocêntrica, usada como joguete de influências e altamente manipulável. A era da internet traduziu-se numa autêntica enxurrada de informação que nem sempre é fácil de filtrar mas que dá aso a que toda a gente possa fazer as suas próprias comunicações e espalha-lhas pelo Mundo. Rapidamente se estragam vidas e se deturpam notícias conforme nos convém. A procura desenfreada pelo sensacionalismo, pelo que vende e que reproduz impacto, o que choca e chama a atenção substituiu aquilo que era uma ferramenta onde iamos beber factos, que muitas vezes nos escondiam de uma forma intencional e que não tínhamos hipótese de comprovar.

Ler ou ouvir um orgão de comunicação social tornou-se depressivo pela forma critica e dramática com que contam cada história. Isso leva-nos a um cansaço emocional de cada vez que terminamos de ver um bloco de notícias na televisão ou de desfolhar umas páginas de um jornal. Sempre as mesmas pessoas, todas com o mesmo jargão, painéis cheios de especialistas de nada e comentadores que falam de tudo um pouco. Desinformação constante, fake news inventadas com determinados propósitos, propaganda, teorias da conspiração, cartilheiros e bajuladores à espera que as suas palavras culambistas provoquem nos todo poderosos uma sensação orgásmica, esperando que o engraxanço faça efeito para tirar o devido proveito e lhes caía em sorte qualquer pequenina recompensa na mão já dorida de tanto estender.

Quando lemos ou vemos notícias criamos sempre a expectativa que saia algo de independente, um facto com a descrição exata da realidade. Quem escreve, porém, confunde cada vez mais uma notícia com um artigo de opinião e mandando a ética deontológica às urtigas corrompe o que seria supostamente a verdade para infligir um cunho pessoal, muitas vezes encomendado por alguém, condicionando e prostituindo a mensagem que passa ao leitor. O jornalismo precisa de tratamento, precisa de gente séria e com caracter. Precisa também de ser menos dramático e pessimista. Não é verdade que só as más notícias vendem. Temos diversos exemplos que atestam o contrário. Mas precisa também de se libertar do negativismo. Somos mais populares quando criticamos, é certo, mas também aí existe um papel importante a desempenhar na sociedade. Nunca foi fácil ser jornalista mas sempre me pareceu bem recompensador conseguir determinar as suas publicações pela ética e pelos valores mais nobres. Sem prejuízo dos mais fracos mas também sem descriminações positivas. A verdade pela verdade.

É importante desmistificar esta falsa realidade de que boas noticias não são noticias. O jornalismo é como um espelho e é através desse espelho que a sociedade vê muitas vezes o Mundo. Quem o disse ( e bem ) foi o jornalista Charles Groenhuijsen. Disse também que a realidade é que esse espelho é embaciado pelo lado negativo da vida com a ênfase no momento como os “Alertas” ou as “Breaking News”. Mas são essas cortinas de fumo que muitas vezes não deixam passar para fora tudo o que de positivo foi conquistado ao longo dos tempos. Quanto crescemos e o que conseguimos mudar. E isso são os factos. E é nisso que nos devemos focar. Do que evoluímos no tema da igualdade, no racismo e xenofobia, mas também na erradicação da pobreza, nos direitos humanos, mortalidade infantil. A evolução na esperança média de vida e na qualidade com que vivemos a mesma. Claro que devemos estar atentos às atrocidades e expô-las. É aliás um dever. Mas um jornalista deve também saber dar boas notícias. Só essas conseguirão ajudar a construir um Mundo melhor e mais positivo em vez de encher a cabeça das pessoas com crimes, desastres e atrocidades que as deprimem e lhes afeta a saúde mental. É isso que nós, que escrevemos, devemos saber transmitir. Os factos, as verdades mas também o lado bom da Vida. Porque na vida nem tudo é mau e numa altura como esta precisamos de quem nos faça acreditar, que nos dê esperança e nos mostre que há eventos fantásticos a acontecer neste preciso momento que merecem ser divulgados. Como em tudo na vida existem maravilhosas excepções mas regra geral o jornalismo precisa de tratamento.

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