Violência doméstica: uma ferida aberta na nossa sociedade
“Quando uma criança implora ao pai que não bata na mãe, não é apenas uma família que sangra — é a sociedade inteira.”
A violência doméstica não é um desentendimento conjugal: é um crime. E, em Portugal, é um crime público: não depende de queixa da vítima. Qualquer pessoa que tenha conhecimento tem o dever moral, e muitas vezes legal, de denunciar.
A realidade é dura e muitas vezes escondida. Milhares de mulheres e crianças vivem em silêncio, vítimas de um ciclo que se repete geração após geração. “O lar devia ser porto seguro, não campo de batalha.” As marcas da violência não ficam apenas no corpo: ficam no olhar dos filhos que assistem em silêncio, ficam na confiança destruída e no medo que molda vidas inteiras.
O Código Penal é claro: a violência doméstica pode dar pena de prisão até 5 anos, podendo aumentar se houver especial crueldade ou se a vítima for particularmente vulnerável. Mas a lei só é eficaz quando aplicada com coragem. “Quem cala perante a violência torna-se cúmplice do agressor.” Cada denúncia é uma vida que pode ser salva.
Infelizmente, muitas vítimas enfrentam obstáculos adicionais: desde a demora nas respostas da justiça até à falta de recursos de apoio imediato. O Regime Jurídico da Proteção e Apoio a Vítimas de Crime garante medidas de proteção urgente e acompanhamento psicológico, mas só funcionam quando há denúncia e ação rápida. “O Estado oferece ferramentas; cabe à sociedade ajudar a que elas sejam usadas.”
Além disso, é crucial lembrar que a prevenção começa antes do crime. Programas educativos nas escolas, campanhas de sensibilização e a responsabilização firme de agressores são medidas previstas na legislação portuguesa para combater a violência de forma estrutural. “Ignorar estes mecanismos é perpetuar o ciclo de dor e medo que afeta milhares de famílias.”
Não podemos aceitar a normalização da violência. A cultura do silêncio, do “sempre foi assim”, permite que o abuso cresça à sombra da indiferença. Combater a violência doméstica não é uma causa feminista, é uma causa humana. Todos temos um papel: vizinhos atentos, amigos que escutam, autoridades que intervêm. “A mudança começa quando deixamos de virar a cara para o problema.”
A violência doméstica não se combate com silêncio. Combate-se com coragem, com denúncia e com a certeza de que o lar deve ser refúgio e nunca prisão. “Cada ato de coragem é um passo em direção a uma sociedade mais justa, segura e humana.”
António Cartaxo