Entre a verdade virtual e a ficção real

Há um conjunto de temas difíceis que raramente são discutidos abertamente, mas que se tornam cada vez mais evidentes no panorama contemporâneo. Muitos observadores descrevem o atual rumo político e cultural da Europa como um processo de centralização extrema, que assume formas subtis de controlo social e moral. Trata-se de um modelo que se apresenta como defensor de direitos, igualdade e progresso, mas que, segundo algumas leituras, pode conduzir a um tipo de totalitarismo invisível. Nesse contexto, a imigração em larga escala não é vista como um fenómeno fortuito, mas como consequência de um projeto ideológico que considera fronteiro um obstáculo, identidades nacionais um risco e tradições algo a ser superado. A perceção é a de que esse processo tende a diluir culturas, enfraquecer raízes e gerar populações desestruturadas, mais fáceis de administrar e moldar politicamente. Historicamente, regimes totalitários compreenderam que religião, família, comunidade e nação funcionam como barreiras à submissão completa. Povos que possuem memória, fé, coesão e orgulho tornam-se menos vulneráveis à manipulação. A erosão gradual desses pilares pode resultar em indivíduos isolados, culpabilizados e dependentes, propensos à obediência e à conformidade social. Argumenta-se que esta dinâmica se manifesta, atualmente, sob uma retórica moralizante que desvaloriza culturas tradicionais, banaliza o patriotismo e revisita narrativas históricas para transformar identidades nacionais em fontes contínuas de culpa. Esse enquadramento associa conservadorismo, nacionalismo ou religiosidade a extremismo, atraso ou perigo, produzindo um clima de censura informal e autocensura. A chamada “agenda woke” surge, nesse contexto, como um pacote ideológico que incentiva culpa, vitimização e condicionamento linguístico. A imposição de determinados discursos, normas de linguagem ou interpretações identitárias é apresentada como política de inclusão, mas pode funcionar como mecanismo de regulação moral e social. Quem diverge arrisca ostracismo ou rotulagem.

O uso de tecnologias digitais adiciona outra camada de controlo. Relata-se a censura de conteúdos, penalizações algorítmicas e supressão de mensagens, justificadas como moderação de “conteúdos perigosos”. A perceção é que o objetivo não é proteger, mas restringir a circulação de ideias fora da narrativa dominante especialmente num contexto de crescente instabilidade social. Nesse cenário, surgem preocupações com medidas como moedas digitais emitidas diretamente por Estados, interpretadas por alguns como instrumentos de monitorização e condicionamento económico, capazes de limitar transações e impor sanções individuais. Projetos de vigilância de comunicações privadas também são vistos como manifestações de um novo paradigma de controlo, associado à justificação de segurança. Ao mesmo tempo, fenómenos de fragmentação social, tensões culturais e insegurança podem ser utilizados para demandar mais centralização e mais supervisão pública, num ciclo que alimenta o próprio problema que pretende resolver. Importa distinguir, contudo, críticas a políticas de gestão populacional de hostilidade a indivíduos. A oposição expressa não visa pessoas concretas, mas modelos políticos que instrumentalizam populações e fragilizam identidades coletivas. O receio é que esse processo conduza a sociedades espiritualmente e culturalmente empobrecidas, reduzidas a territórios administrados, carentes de sentido, coesão e liberdade.

A. J. Ferreira