De Karachi à Ribeira da Vaca
Tenho uma enorme dificuldade em sobreviver numa nação onde os direitos humanos são literalmente violados, é complexa e multifacetada, com questões de direitos humanos e restrições à liberdade de expressão e de imprensa, existem acusações de violações de direitos humanos, especialmente no que diz respeito à discriminação contra minorias religiosas e étnicas, e o uso das leis de blasfémia para silenciar dissidentes, apesar de se designar de um regime democrático a liberdade de imprensa e de expressão é restrita. Um belo dia descobri que havia a possibilidade de sair em busca de um novo horizonte e a Europa veio-me ao pensamento. Conversando com um amigo logo me indicou que numa das ruas da minha cidade havia uma pessoa que poderia ajudar-me a realizar o meu sonho. Logo imaginei: porque não tentar a fim de conseguir uma vida melhor para mim, a minha mulher e os meus três filhos. Lá fui à procura desse lugar indicado, um escritório onde à entrada estava colocado um pequeno anúncio: Se pretende trabalhar na Europa, tratamos da sua viagem para Portugal, contacte-nos e o n: de telefone. Liguei; do outro lado uma voz em inglês um tanto ou quanto percetível disse-me o procedimento e as condições. Eram necessários 600 mil, Rupias mais um passaporte que custava mais 500 e um contrato de trabalho outros tantos, total 700 mil. Com algumas economias do muito sacrifício feito, mais um pedido a um familiar conseguiria essa quantia e feitas as contas em pouco mais de um ano a trabalhar na Europa conseguiria pagar esse valor. Trabalhar na hotelaria, coisa que já tinha alguma experiência a integração no trabalho até seria fácil, talvez, a língua com o inglês básico seria uma primeira etapa, com alojamento garantido nesse contrato e o coração apertado, deixei a família para tentar a sorte. Voei na nuvem dos meus sonhos com todos os requisitos e depois de passar por diferentes etapas aterrei numa ilha e lá cheguei ao destino. Um meu conterrâneo felizmente me esperava indicado pelo angariador e ultrapassada a ansiedade fui dormir num quarto onde já lá estavam mais 5 casualmente conterrâneos meus. Tomei conhecimento pelo colega que me recebeu que iria trabalhar num hotel nos serviços de ajudante de cozinha, receberia à volta de 700 euros e alimentação, que pagaria 100 por mês pela renda do quarto e 50 pela lavagem da roupa. O quarto tinha 4 camas de beliche, uma casa de banho de apoio e no acesso um recanto com um pequeno fogão, uma pia e um tipo prateleira na parede do corredor que servia de apoio para as refeições, uma apenas, pois no local de trabalho teria duas refeições diárias. Acordava sempre ansioso enquanto de manhã cedo esperava o transporte que me levaria ao local de trabalho, no percurso a minha mente divagava o porquê da troca por dois modelos de liberdade muito semelhantes. Depois de algum tempo e isso conto um ano, enviava todos os meses 300 euros à minha mulher para ir abatendo a minha dívida e ajudar no sustento da família visto que ligava com frequência e ela me comunicava da pressão exercida pelo angariador. Eram essas as minhas inquietudes a insegurança e a ameaça que a família suportava pelo preço a pagar pela minha aventura. O trabalho era duro por vezes cansativo e desgastante, com muita exigência, mas o compromisso teria de o cumprir custe o que custar, sem ter possibilidade de alternativa, deixei a democracia sem liberdade do meu país para arriscar a que preço a liberdade de poder vir a ser prisioneiro ou escravo na esperança de uma vida melhor. Isto é uma história virtual de um imaginário imigrante. Qualquer semelhança com a realidade será mera coincidência.
A. J. Ferreira