Crónicas

Crise de identidade no PSD

Em breve o partido irá a eleições internas. Parece que pelo menos existirão dois candidatos, Luis Montenegro e Jorge Moreira da Silva

O Partido Social Democrata vive um dos seus períodos mais difíceis e exigentes. Parece-me inegável que os anos sob a liderança de Rui Rio empurraram-no para uma crise profunda onde se encontram ainda mergulhados. E as razões que se lhes podem apontar são várias mas na sua grande maioria por culpa própria. As soluções que tardam em aparecer seja no domínio das pessoas ou nas ideias que apresentam para o país tornam os anos que aí vêm absolutamente decisivos até para a sua sobrevivência, pelo menos da forma como o conhecemos. Em relação às pessoas e talvez com excepção da Madeira e de mais uns quantos casos isolados, o partido deixou de conseguir atrair para as suas fileiras os melhores quadros da sociedade, as referências foram aos poucos deixando de existir e as sucessivas lutas internas tornaram-no num espaço de facções onde parecem não caber uns onde cabem os outros, onde o todo parece simplesmente não conseguir coexistir, colocando um pouco de lado a imensa diversidade que por ali se encontrava a diversos níveis.

Nos próximos anos, aquela que parece ser à primeira vista a bancada parlamentar mais fraca de sempre, terá que lidar por um lado com o aparecimento de novas forças políticas que lhe roubaram bandeiras e protagonismo e por outro com uma excessiva colagem ao PS, que os eleitores sancionaram nas urnas, ainda recentemente. Se por um lado o Chega consegue saltar invariavelmente para as capas dos jornais, à base do sensacionalismo e da falta de receio do confronto, por outro apareceu uma Iniciativa Liberal que de repente parece ter-se conseguido assumir como o partido das empresas, dos empresários e do crescimento económico, apresentando um ímpeto reformista que em tudo caracterizava os sociais democratas. É difícil, nos dias que correm perceber quais são as verdadeiras ideias que têm para o país e para os portugueses, a mensagem não passa e a sociedade não se consegue identificar com quem o lidera. Já vimos, noutros países, diversos exemplos de forças políticas que eram tidas como centrais e que aos poucos foram perdendo a sua força e a sua importância e isso deve servir como sério aviso.

Ainda este fim de semana, no congresso que elege a JSD que se apresentava com vontade de rasgar com o estado atual, surgiu um aviso aos participantes que os proibia de usar calças bebes e blazer azul. Como é que é possível uma geração de jovens que se assume desempoeirada e como alternativa de futuro poder apresentar como cartão de visita a proibição de um qualquer congressista de se vestir como quer e como bem lhe apetece? Fiquei até curioso para perceber, uma vez que vivemos num tempo em que tanto se debate a igualdade e a descriminação de que forma é que podiam ir as congressistas porque a comunicação surgiu só para “os meninos”. Ora, alguém que se apresenta com vontade de mudar e se cola imediatamente a um culto instalado na nossa sociedade que parece querer fazer das proibições e das restrições uma forma de estar, não parece estar de acordo com os princípios e valores com que o PSD sempre se apresentou, ou será que nestes longos últimos anos o partido mudou assim tanto?

Em breve o partido irá a eleições internas. Parece que pelo menos existirão dois candidatos, Luis Montenegro e Jorge Moreira da Silva. Veremos o que têm para apresentar, o que pensam sobre os grandes temas da nossa sociedade, o que querem para Portugal e quem trazem ao seu lado. Acho sinceramente e sem me querer imiscuir na vida do partido que ou vão mais longe e conseguem apresentar soluções que empolguem as pessoas, reformas estruturantes e uma visão estratégica para o futuro ou será mais uma oportunidade perdida e que provavelmente não existirão muitas mais. Acredito sinceramente que a crise identitária latente, a juntar ao facto de se preferirem muitas vezes, os medíocres sacos de votos ao invés de se apostar na qualidade de pensamento e de posições, muitas vezes mais independentes e por isso incómodas, pode fazer perigar o partido e feri-lo de morte. É bom que tenham ciente que o caminho do passado recente, que purga em vez de unir, que segrega em vez de aglomerar e que pelos vistos quer proibir em vez de se reinventar não interessa aos portugueses. Essa é uma reflexão que deve ser feita, que coloque na ordem do dia que bandeiras são essas e que a mensagem passe de forma clara e objectiva. De outra forma caminharão para um espartilho cada vez mais apertado entre um PS que quando toca a rebate se une e se fortifica e uma Iniciativa Liberal que lhes vai “assaltando” o espaço político reformista virado para a produção e o crescimento económico.

A tarefa não se afigura nada fácil mas talvez seja tempo de se deixarem de tricas internas e de se dividirem entre “uns” e os “outros” dentro do próprio partido, de dar oportunidade a novas caras, de rasgar de facto com o passado recente através de uma estratégia verdadeiramente mobilizadora para o país mas que seja feita através de elementos com que a sociedade se identifique, com soluções para os atuais problemas dos portugueses, que se faça no domínio da clarividência e do exemplo das boas práticas. De outra forma sobrarão cada vez menos lugares e menos protagonismo, venham eles vestidos de bege de laranja ou de caqui. Não é a roupa que nos define, são as nossas atitudes, as nossas práticas e a vontade de fazer melhor.