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Só 20% das verbas para a reconstrução pós-Covid são amigas do ambiente

Relatório da Organização das Nações Unidas aponta oportunidades perdidas e diz que países com pressa escolhem métodos económicos familiares em vez de investirem num futuro sustentável e inclusivo

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Apenas um dólar em cada cinco gastos pelos Estados relacionados com a reconstrução pós-pandemia está a ajudar a combater as alterações climáticas e a sarar a natureza, segundo um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU).

As principais economias já comprometeram mais de 14,6 biliões (milhão de milhões) de dólares (12,2 biliões de euros) para procurar recuperar dos efeitos económicos da pandemia, com cerca de dois biliões destinados à recuperação de longo prazo.

Mas apenas 341 mil milhões de dólares, cerca de 18%, deste montante está a ir para as designadas despesas verdes, relacionadas com a ecologia e a sustentabilidade, e para 'reconstruir melhor' ('building back better', na expressão em Inglês), de acordo com o relatório conjunto do Programa na ONU para o Ambiente (UNEP, na sigla em Inglês) e da Universidade de Oxford.

"Parece que o mundo está a procurar combater um fogo em uma casa com uma mangueira de jardim, quando tem disponível uma boca de incêndio ali ao lado Brian O'Callaghan, do Programa de Recuperação Económica da Universidade de Oxford, autor principal do documento

Brian O'Callaghan salientou também que o relatório aponta oportunidades perdidas, mencionando a Austrália, onde apenas dois por cento dos 130 mil milhões de dólares da despesa para a recuperação estão orientado para responder aos problemas climáticos.

O documento foca-se na despesa de longo prazo, como os projetos de estradas, edifícios e energia, em oposição ao alívio imediato, como subsídios de desemprego e outras ajudas de emergência para permitir a sobrevivência de pessoas e empresas.

Os países com pressa escolhem com frequência métodos económicos familiares em vez de investirem em "um futuro sustentável e inclusivo", o que implica que as sociedades alterem a sua forma de funcionar, considerou a ministra do Ambiente alemã, Svenja Schulze.

O documento foi divulgado no mesmo dia em que o Congresso dos EUA aprovou um plano de estímulo e ajuda económica, promovido pelo presidente Joe Biden, no montante de 1,9 biliões de dólares. Este plano não foi incluído no relatório da UNEP e de Oxford porque é mais orientado para o curto prazo, além de ser recente, disse O'Callaghan.

Em termos de longo prazo, os EUA afetaram cerca de 25% do dinheiro para a recuperação pós-pandemia a projetos sustentáveis.

O documento coloca os EUA sob a designação 'potencial para agir', abaixo de Estados como Noruega, Alemanha, Finlândia, Canadá e França, mas à frente de China, Japão, Reino Unido, Federação Russa e Arábia Saudita em percentagem das despesas de recuperação consideradas verdes.

"No seu conjunto, até agora, a despesa verde está aquém da severidade das três crises planetárias das alterações climáticas, perda de biodiversidade e poluição", escreveu a chefe da UNEP, Inger Andersen.

Se o mundo se concentrasse em investir em energia limpa poderia sair desta crise "definitivamente mais capaz de lidar com o choque abrupto que as alterações climáticas estão a impor às nossas sociedades", acentuou a diretora do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva. Acrescentou que o mundo precisa de "criar mais empregos e melhores oportunidades económicas, investindo da maneira correta, não da forma errada".

Com 82% dos gastos da recuperação a não serem verdes, isto é, sustentáveis e inclusivos, está-se a apoiar o 'statu quo', o qual evolui na direção errada, em termos de ambiente e desigualdade de rendimentos, disse O'Callaghan, avançando que dois a três por cento dos investimentos são mesmos "sujos", ao promoverem o uso dos combustíveis fósseis, perniciosos para o ambiente.

O relatório destaca Noruega, Dinamarca, Finlândia e Alemanha, por dedicarem metade ou mais dos seus pacotes de recuperação a projetos sustentáveis e inclusivos.