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Os campeões à porta fechada

1. A violência doméstica continua a ser uma prática cuja repugnância e nojo pelos agressores, não representa (ainda) o tratamento jurídico que estes deveriam ter, em tempo útil. Desde logo porque são uns cobardes e fogem à polícia. Depois, por regra, são “campeões” apenas à porta fechada. O relato frequente das vítimas, muitas delas sofredoras uma vida inteira, é este: “só batia quando estávamos em casa”, “só batia quando estávamos sozinhos” ou “ele até tratava bem os pais e os amigos mas quando ficávamos sós, transfigurava-se e não era a mesma pessoa.”

O mundo poderá ser pequeno para uma vítima que tem filhos, casa e trabalho ou falta de trabalho e que vive na dependência económica do agressor, preferindo “aguentar” o sofrimento da pancada física e psicológica, como um mal menor. Será um mal menor? Expor crianças à violência dos adultos é um mal maior. O sofrimento prolongado de uma pessoa que gratuitamente é agredida é um mal maior.

A vindicta privada dos familiares e amigos das vítimas e as consequências daí resultantes, não raras vezes tendentes a novas cenas de violência, não nos pode afastar (a nenhum de nós) da responsabilidade de promover a denúncia junto das entidades competentes, mas sobretudo de ajudar as vítimas.

Cenas tristes como a da última semana em que um destes “excrementos de gente” filmou a cena de pancadaria a uma jovem e a exibiu perante terceiros com o posterior encaminhamento para a denuncia nas redes sociais, obriga-nos a pensar sobre o tipo de sociedade que temos. É preciso dizer basta.

2. É do conhecimento público que desde 15 de nov de 2019 integro o conselho de administração da entidade pública SESARAM. Nessa condição declaro expressamente a vontade e empenho pessoal (e partilhado com a equipa que me acompanha) na melhoria da resposta do serviço público, com a preocupação com os utentes que aguardam consultas ou cirurgias ou exames, e que se dependesse apenas do “papel assinado”, aqui, como em todos os hospitais portugueses, não seria assunto.

Toda a reflexão sobre o estado da saúde na Madeira nos últimos 20 meses, por obrigação moral exige que tenhamos a noção que os profissionais de saúde que estiveram (e estão) no combate à pandemia (que ainda não acabou), são os mesmos que estão no dia a dia nas diferentes unidades de saúde, a tratar de doentes. A realizar consultas, cirurgias e exames.

Enquanto isso, alguns concidadãos passaram meio ano a jogar playstation e a ver filmes na netflix, protegidos, com pantufas nos sofás e a passear o cão no jardim. Agora chegam, cheios de força, à dialéctica parlamentar, novamente protegidos de pantufas no sofá, sem o mínimo cansaço que outros levam destes longos meses de pandemia.

Na saúde, tal como na educação e noutros sectores governativos, são necessários meios físicos e humanos.

Juntem-se a nós! Deixem as pantufas e venham (voluntariamente) trabalhar de acordo com o vosso conhecimento técnico. Provavelmente adquirirão a compreensão por quem trabalha, sem lutas partidárias parlamentares. O mundo real não é isso.