Dar à luz em tempos de COVID-19…

No passado dia 22 de novembro, por volta das 21 horas, a minha esposa deu entrada nas urgências do Hospital Dr. Nélio Mendonça com contrações regulares que se repetiam de sete em sete minutos. O que se previa era que, à semelhança dos partos anteriores, ela entrasse em trabalho de parto a qualquer momento, só que não: depois de ela ter feito uma cardiotocografia (CTG) e de ter sido observada por um médico, foi informada de que o colo do útero estava muito subido e que o nascimento do nosso filho não era para já. Não era para já, mas de lá ela já não saiu, pois a dilatação do colo do útero já estava nos dois centímetros e aos três tinham de lhe administrar a epidural. Até aqui nada de novo. Eram os procedimentos normais. De novo – e anormal – só mesmo o facto de lhe terem dito que eu não podia entrar para lhe fazer companhia. É verdade, pela primeira vez em três partos eu não ia poder estar com a minha esposa por causa da pandemia e das regras de combate à propagação da COVID-19. E o que diziam as regras? Que o pai tinha de fazer um teste à COVID-19 e testar negativo para poder assistir ao parto. Mas isto já nós sabíamos. O que nós não sabíamos era que «assistir ao parto» significava literalmente «assistir ao momento da expulsão». E foi exatamente isto que disseram à minha esposa quando ela perguntou se eu podia entrar. Resumindo: Fizemos o teste PCR. O teste da minha esposa deu negativo. O meu teste também. No entanto, ela entrou no hospital e eu não. Porquê? Porque no hospital onde a minha esposa deu à luz o pai só pode entrar no momento da expulsão. Ou seja, para a administração do hospital, o que importa é o pai ver a mãe de pernas abertas a parir. Estar ao lado dela naquelas longas horas que antecedem o parto, em que os nervos e o medo tomam conta de qualquer mulher grávida, não importa nada. E foi só por isso que a minha esposa ficou sozinha na sala de partos, sem a minha presença, durante mais de dez horas... E eu pergunto: Porque é que um pai – com um teste negativo feito no dia – só pode assistir ao parto no momento da expulsão e não a partir do momento em que a mãe dá entrada na sala de partos? Por precaução, porque os testes à COVID-19 não são totalmente fiáveis?!... Então, e no momento da expulsão, os resultados dos testes à COVID-19 já são totalmente fiáveis? Além do mais, se é só para assistir ao momento da expulsão, porque é que um pai é obrigado a fazer um teste à COVID-19? Não bastava ter de usar máscara e desinfetar as mãos? Sinceramente, não percebi. Mas não foi só eu que não percebi. Alguns profissionais de saúde daquele hospital também não. E foi exatamente isto que um deles nos aconselhou: reclamar formalmente, porque aquela regra não fazia sentido.

Pois bem, não reclamámos formalmente, porque o cansaço não deixou, mas reclamo aqui, publicamente, já depois de ter descansado, para que todos tomem conhecimento e possam opinar. E se me vão dizer que, nos tempos que correm, todos os cuidados são poucos e que as regras têm de ser apertadas, permitam-me que eu me antecipe e vos diga que concordo plenamente e que nada tenho a obstar. Contudo, «apertadas» não são sinónimo de «incoerentes». E incoerência é a palavra que melhor define esta regra deste hospital. Porquê? Porque as regras não podem dizer que um pai precisa de ter um teste negativo para assistir ao parto e depois só poder entrar no momento da expulsão. Não faz sentido. Porque as regras não podem dizer que um pai só pode entrar no momento da expulsão e depois não dizer que tem de cumprir com as regras de distanciamento. Não faz sentido. Porque as regras não podem dizer que um pai tem de ter um teste negativo para assistir ao momento da expulsão e não dizer que tem de ter um teste negativo para visitar a esposa e o filho nos dias que se seguem. Não faz sentido! No Hospital Dr. Nélio Mendonça, há muita coisa que não sentido!

Renato Marques

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