O papel dos pais e professores na identificação da dislexia
Com o regresso às aulas, muitas crianças começam uma nova etapa nas suas vidas, com muitas delas a frequentar a escola pela primeira vez. Este momento representa não apenas entusiasmo e curiosidade, mas também desafios no processo de aprendizagem, especialmente para aquelas com dificuldades específicas, como a dislexia.
Reconhecer e compreender a dislexia desde cedo é fundamental para criar um ambiente escolar inclusivo, que apoie o desenvolvimento académico e emocional de cada criança, permitindo que todos tenham oportunidade de alcançar o seu pleno potencial.
O que é a dislexia?
A dislexia é uma perturbação específica da aprendizagem que afecta a leitura. Manifesta-se através de um desempenho inferior ao esperado no que respeita à precisão, à velocidade ou à compreensão do que é lido.
Não resulta de problemas de visão nem de um simples atraso de desenvolvimento, mas sim de uma diferença neurológica que acompanha a pessoa ao longo da vida. Com a intervenção adequada e o acompanhamento de especialistas, é possível minimizar muitos dos desafios e ajudar a criança a desenvolver estratégias eficazes para aprender e progredir com sucesso.
"Quem sofre de dislexia apresenta um esforço acrescido para distinguir letras, formar palavras e compreender o seu significado. Os alunos que têm estas dificuldades não são preguiçosos, pouco inteligentes imaturos, nem têm necessariamente problemas visuais ou de postura. Requerem um tratamento terapêutico intensivo e apoio no processo de ensino-aprendizagem, para que consigam ter sucesso", refere a Associação Portuguesa de Dislexia.
Como se manifesta a dislexia?
A dislexia pode apresentar-se de formas diferentes em cada pessoa.
Na leitura:
- Dificuldades na aquisição e desenvolvimento do automatismo na leitura.
- Leitura silabada, hesitante e com muitas incorreções.
- Precisão e velocidade da leitura inferiores ao esperado para a idade e nível escolar.
- Dificuldade na leitura de palavras irregulares e pouco frequentes.
- Dificuldades na compreensão de textos e enunciados lidos.
- Dificuldades no processamento fonológico: consciência fonológica, codificação fonológica e recuperação dos códigos fonológicos.
- Dificuldade na descodificação de letras ou sílabas com trocas fonológicas e lexicais: o-u; p-t; b-v; s-ss-ç; s-z; f-t; m-n; f-v; g-j; ch-x; x/ch-j; z-j; nh-lh-ch; ão-am; ão-ou; ou-on; au-ao; ai-ia; per-pre;
- Substituição de palavras por outras de estrutura similar, com significado diferente (saltou-salvou) e/ou substituição de palavras inteiras por outras semanticamente próximas (cão-gato; bonito-lindo; carro-automóvel).
Na escrita:
- Dificuldades na escrita, na fase de iniciação e ou de desenvolvimento;
- Dificuldade na associação do som ao desenho da letra;
- Dificuldade na rechamada de palavras;
- Utilização de vocabulário restrito;
- Presença de muitos erros ortográficos e sintáticos;
- Frases com palavras unidas ou separadas;
- Palavras com letras ou sílabas repetidas, ou colocadas antes ou depois do lugar correto;
- Omissão ou adição de letras e sílabas (ex: livro-livo; batata-bata; flor-felore;);
- Ligação ou separação de palavras ou sílabas (às vezes-àsvezes; agora-a gora);
- Confusão de letras com sons próximos ou com desenho equivalente;
- Presença de erros de concordância em género e número ou tempo verbal;
- Não domina o uso de regras de pontuação;
- Desrespeita regras gráficas (uso da cedilha, do hífen, traços, letra maiúscula) ou de translineação;
- Dificuldade em exprimir as suas ideias, em iniciar e desenvolver uma composição;
- Dificuldade na organização das ideias no texto;
- Má qualidade da caligrafia, letra rasurada, e irregular;
Manifestações no comportamento:
- Demora muito tempo a realizar os trabalhos de casa.
- Recorre a estratégias para não ler.
- Não revela prazer pela leitura.
- Distrai-se com facilidade perante qualquer estímulo exterior.
- Apresenta curtos períodos de atenção.
- Os resultados escolares são inferiores à sua capacidade intelectual.
- Tem melhores resultados nas avaliações orais do que nas escritas.
- Dificuldade na aprendizagem de idiomas estrangeiros.
- Não gosta das tarefas da escola que impliquem ler ou escrever.
- Comportamentos de oposição e de desobediência para com a figura de autoridade (pais, professores).
- Comportamentos de isolamento ou anulação na escola e em sala de aula.
- Comportamentos de inibição ou bloqueio, sempre que tenha de se expor.
- Os resultados escolares não reflectem a sua aplicação e enorme esforço.
- Revela criatividade em algum domínio.
Alterações emocionais:
- Ansiedade nos momentos de avaliação ou actividades que impliquem ler e escrever.
- Sentimento de tristeza e de frustração quando não consegue concretizar uma tarefa.
- Baixa auto-estima e sentimento de inferioridade.
- Vergonha perante os insucessos escolares.
- Enurese noturna
- Perturbações do sono
Quando procurar ajuda?
Quando os pais, educadores ou professores notem a presença repetida de vários destes sinais, torna-se fundamental recorrer a uma avaliação especializada. Quanto mais cedo for feita a intervenção, maiores serão os benefícios para o percurso da criança, prevenindo que as dificuldades na leitura e na escrita afectem a sua auto-estima, motivação e desempenho escolar.
Como apoiar?
É fundamental procurar o apoio de equipas multidisciplinares, como psicólogos, terapeutas da fala e professores especializados, para dar resposta às necessidades da criança. Também é importante incentivar a leitura em contextos tranquilos e sem pressão, tornando o momento mais natural e positivo.
O recurso a ferramentas de apoio, desde audiolivros a programas digitais de leitura ou materiais pedagógicos adaptados, pode fazer toda a diferença no processo de aprendizagem. Paralelamente, deve-se reforçar sempre as competências e talentos da criança, valorizando as áreas em que se sente mais confiante e capaz.