A Ilusão do Salário Mínimo
A comparação entre Portugal e os restantes países europeus volta a expor fragilidades estruturais da economia nacional. Enquanto o salário mínimo português corresponde a cerca de 5,75 euros por hora, a Alemanha prepara-se para elevar o seu para 13,90 euros. Este contraste, embora desconfortável, reflete o verdadeiro problema: Portugal não tem conseguido gerar riqueza ao ritmo necessário para suportar uma melhoria sustentada dos rendimentos.
Nos próximos quatro anos, discute-se um aumento de cerca de 20% no salário médio e uma subida ainda maior do salário mínimo. Para que tal fosse viável, a economia portuguesa teria de crescer anualmente na ordem dos 5% ao ano. Contudo, os números não acompanham as intenções políticas: os salários têm aumentado cerca de 7%, a inflação situa-se em torno dos 3%, e a economia está longe do crescimento que permitiria absorver esta evolução.
A consequência é inevitável.Quando o custo do trabalho cresce mais do que a riqueza produzida, o país empobrece. Nenhuma empresa pode aumentar salários de forma contínua se vende menos, se enfrenta custos crescentes ou se não tem margem para investir. Tal como um agregado familiar, também o tecido empresarial não pode gastar o que não tem. É matemática elementar aplicada à realidade nacional.
O problema agrava-se quando se observa a estrutura económica portuguesa. O país tornou-se excessivamente dependente do turismo é hoje o quinto no mundo onde este setor mais pesa no PIB, mas nenhuma economia avançada se construiu exclusivamente sobre esta atividade. Os setores onde Portugal verdadeiramente acrescenta valor continuam a ser os tradicionais: madeira, cortiça, papel, têxteis, vestuário e calçado. Ainda assim, a balança comercial de bens apresenta um défice significativo, agravado pela forte dependência de importações, com a China já consolidada como o maior fornecedor extracomunitário.
O contraste com a Polónia é revelador. O país tem registado um crescimento económico superior à média europeia, impulsionado por mão-de-obra qualificada, forte consumo interno e aplicação estratégica dos fundos europeus em infraestruturas. Criou um ambiente favorável ao investimento, reduziu a criminalidade de rua e adotou medidas fiscais orientadas para as famílias, como a isenção de IRS para agregados com dois ou mais filhos até determinado rendimento. Enquanto um polaco demora entre 15 e 30 anos a pagar a casa, um português precisa, em média, de 33 anos.
O desfasamento entre os dois países é mais do que económico: é estratégico. A Polónia definiu prioridades claras para reter talento, promover competitividade e reforçar o poder de compra das famílias. Portugal, pelo contrário, continua a perder mão de obra qualificada, a atrair sobretudo trabalho pouco especializado e a manter uma das cargas fiscais mais elevadas da Europa, o que limita o investimento privado.
Perante este cenário, a discussão sobre salários não pode ser feita de forma isolada. Os salários devem ser a consequência natural do crescimento económico, e não o seu substituto. Sem um plano estruturado para aumentar produtividade, diversificar setores, modernizar a indústria e fortalecer as exportações, qualquer subida remuneratória será apenas aparente uma transferência de custos que acaba por deteriorar a competitividade das empresas e a qualidade de vida dos trabalhadores.
Portugal tem de decidir se quer continuar a gerir dificuldades ou se pretende, finalmente, criar condições para um desenvolvimento verdadeiro. Porque um país que aumenta salários sem aumentar produção não está a enriquecer, está a empobrecer, lenta mas seguramente.
Zózimo Castro