Mais de 220 anos de celebrações em honra do Senhor dos Milagres
Machico celebra, hoje, uma das festividades religiosas mais importantes da ilha, que anualmente atrai milhares àquele concelho, entre os dias 8 e 9 de Outubro.
Ao longo de 222 anos de história (148 dos quais acompanhados pelo DIÁRIO), "a grande romaria e popular festa do Senhor dos Milagres" foi por diversas vezes notícia no nosso matutino, que hoje recordamos neste Canal Memória'.
A efeméride assinalada remonta ao aluvião de 1803.
Segundo os historiadores, a 9 de Outubro de 1803, depois de dias consecutivos a chover, o leito da ribeira transbordou, inundando a vila de Machico e toda a zona Leste da freguesia. As águas também invadiram a capela, destruindo-a parcialmente e arrastaram para o mar, a imagem de Nosso Senhor na Cruz, obra do séc. XVI.
Reza a lenda que, três dias depois, uma embarcação americana que vinha do Funchal recolheu a imagem, que, apesar do seu peso, milagrosamente boiava. Ao pretender seguir viagem, o vento começou a soprar em direcção contrária, tendo o capitão decidido levar a imagem para a Sé do Funchal.
Em 1813 a capela é reconstruída pelos Irmãos da Misericórdia, voltando a imagem para a sua capela, num barco, acompanhada por alguns pescadores naturais de Machico. Como chegou de noite, foi recebida pelos pescadores com archotes, uma cena que é recriada anualmente na procissão de 8 de Outubro.
Ainda segundo a lenda, quando os barcos entraram na baía, os sinos tocaram a rebate sem que ninguém lhes tocasse. Devido a este "milagre" e à fé do povo, a capela passou a ser denominada de Capela dos Milagres.
Assim, em memória do dia em que Nosso Senhor dos Milagres protegeu aquela zona aquando da grande aluvião de 1803 e devido ao facto de se ter recuperado milagrosamente a imagem intacta, celebra-se a 8 e 9 de Outubro a sua festa.
O ponto alto é precisamente procissão, ocorrida na noite de 8 de Outubro, quando a lendária imagem sai da capela dos Milagres, percorre algumas ruas e dirige-se para a Igreja Matriz, acompanhada por duas filas de pescadores, vestidos a rigor, levando archotes acessos.
Atrás do andor, seguem os padres e atrás destes a banda, tocando uma música melancólica. São seguidos por fiéis, alguns com círios ou com partes do corpo feitos em cera. Outros caminham descalços ou simplesmente integram-se na procissão. Durante este ritual, a luz pública é desligada, ficando a vila de Machico iluminada pela luz das velas dos fiéis.
É curioso observar que as primeira menções à Festa do Senhor dos Milagres no DIÁRIO, que remontam ao sécula XIX, dão sobretudo conta das alterações no horário dos barcos a vapor que ligariam Machico e Funchal no dia da "popular festa", como estes exemplo de 8 de Outubro de 1882:
Já em 1903, o DIÁRIO registava o centenário do aluvião:
Volvido outro século, em 2003, a procissão dos Milagres estava "envolta em polémica".
O ex-presidente da autarquia machiquense e, à data, vereador municipal, Bernardo Martins, enviara uma carta ao bispo da diocese do Funchal (então, D. Teodoro de Faria) lamentando a inclusão da procissão nocturna no programa comemorativo da autarquia, acusando o executivo PSD de aproveitamento partidário de uma cerimónia religiosa.
De regresso ao presente, hoje, a partir das 20h00, tem início a procissão em honra do Senhor dos Milagres, acompanhada pelos archotes e promessas, e presidida pelo bispo do Funchal, D. Nuno Brás. A celebração culminará com a missa na Igreja Matriz de Machico.
Amanhã, na parte da tarde e depois de nova missa realiza-se uma outra procissão, mas em sentido contrário, regressando a imagem à sua capela.