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Explicador Madeira

Qual a diferença entre o arguido e o suspeito? E o detido?

Em termos legais, ninguém pode ficar detido mais de 48 horas sem ser presente a um juiz

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Fotos ASPRESS

Na passada quarta-feira, ainda antes de se saber, publicamente, que Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional da Madeira, tinha sido constituído arguido no âmbito do processo do Ministério Público que resultou na detenção do presidente da Câmara Municipal do Funchal, Pedro Calado, e dos empresários do sector da construção civil, Avelino Farinha e Custódio Correia, vieram à baila termos como ‘Suspeito’, ‘Arguido’, e ‘Detido’.

Foi o próprio líder do Executivo regional a lançar o tema, em declarações aos jornalistas, à porta da Quinta Vigia:

“Tenho o direito, como qualquer cidadão, de não ser suspeito eternamente. O pior estatuto que podemos ter na vida política e na vida pública é ser suspeito. Portanto, a constituição do arguido é um estatuto que é conferido pela lei, e é bom sabermos o que é que estamos a falar, para as pessoas se poderem defender e sobretudo apresentarem os contra-argumentos”. Presidente do Governo Regional da Madeira

Procurámos saber então o que diferencia os termos, e para tal nos apoiámos na Fundação Francisco Manuel dos Santos, que assume com um dos objectivos promover e aprofundar o conhecimento da realidade portuguesa, procurando desse modo contribuir para o desenvolvimento da sociedade, o reforço dos direitos dos cidadãos e a melhoria das instituições públicas.

Qual a diferença entre o arguido e um mero suspeito? Em que circunstâncias pode ou deve alguém ser constituído arguido, e que implicações tem esse acto?

Face ao explanado na página da Fundação Francisco Manuel dos Santos, um mero suspeito não é um sujeito processual e, por isso, não tem direitos nem deveres processuais específicos.

Já a atribuição do estatuto de arguido a alguém (constituição de arguido) é um acto de elevada importância, pois significa que o Estado pretende investigar e, eventualmente, julgar um crime, com a inerente compressão de alguns direitos de uma determinada pessoa.

“Consequentemente, enquanto sujeito processual, essa pessoa fica sujeita a um conjunto de deveres que visam facilitar a administração da justiça e passa a beneficiar de um conjunto de direitos específicos que limitam os poderes das autoridades. Ou seja, um suspeito é constituído arguido para ser parte no processo e para que, por via dessa posição processual, lhe sejam aplicáveis direitos e deveres específicos”.

Explicam ainda que a constituição de arguido pode ser realizada, conforme os casos, por um juiz, magistrado do Ministério Público ou órgão de polícia criminal. É obrigatória quando:

- for deduzida acusação ou requerida a fase de instrução contra certa pessoa;

- correndo inquérito contra uma pessoa e havendo suspeita fundada da prática de crime, ela prestar declarações perante qualquer autoridade judiciária ou órgão de polícia criminal;

- tenha de ser aplicada a alguém uma medida de coacção (por ex., a prisão preventiva, ou a proibição de contactar certas pessoas) ou de garantia patrimonial (por ex., a caução económica);

- uma pessoa for detida para ser julgada ou para ser presente a autoridade judiciária;

- for comunicado a uma pessoa um auto de notícia que a dá como autora de um crime, salvo se a notícia for manifestamente infundada;

- durante a inquirição de uma pessoa como testemunha, surgir contra ela suspeita de que cometeu um crime.

Por outro lado, qualquer pessoa suspeita da prática de um crime tem direito a ser constituída arguida quando forem realizadas diligências de investigação que a visem pessoalmente.

“No momento da constituição como arguido, as autoridades devem informar o visado dos direitos que lhe assistem e, se necessário, explicar-lhe em que consistem. Entre eles, destacam-se os de: constituir defensor; estar presente nos actos processuais que lhe digam respeito; ser ouvido pelas autoridades; ser informado dos factos que lhe são imputados antes de prestar declarações perante qualquer entidade; ser presumido inocente; apresentar provas; apresentar recurso de decisões que lhe sejam desfavoráveis; e não prestar declarações sobre os factos, sem que tal silêncio possa prejudicar a defesa”. Fundação Francisco Manuel dos Santos

Em contrapartida, também há deveres para o arguido: comparecer perante as autoridades sempre que a lei o exigir e para isso tenha sido devidamente convocado; responder com verdade às perguntas feitas pelas autoridades competentes sobre a sua identidade; prestar termo de identidade e residência logo que assuma a qualidade de arguido; e sujeitar-se a diligências de prova e a medidas de coacção e de garantia patrimonial especificadas na lei e ordenadas e efectuadas por entidade competente.

Por outro lado, aquando da megaoperação do DCIAP na Madeira, ouviu-se em alguns órgãos de comunicação social que o autarca do Funchal tinha sido preso. Mas o que aconteceu foi uma detenção.

Que tipos de prisão existem? Qual a diferença entre ser detido e ser preso?

Um cidadão pode estar na cadeia em prisão preventiva ou a cumprir uma pena de prisão definitiva. Há diferenças importantes entre estas duas situações.

A prisão para cumprimento de pena ocorre após uma condenação contra a qual já não é possível interpor recurso ordinário, ou seja, após um veredicto final de condenação.

A prisão preventiva, por contraste, ocorre durante o processo, num momento em que o arguido não foi condenado nem é certo que venha a sê-lo. É uma medida de coacção destinada a garantir o normal desenvolvimento do processo e cuja aplicação exige, além de outros requisitos, tratar-se de criminalidade especialmente perigosa ou de crime punível com pena de prisão superior a 5 anos, bem como a existência de “fortes indícios” de que o crime foi cometido pelo arguido.

Diferente da prisão preventiva é a detenção. Também envolve uma privação de liberdade e não pode exceder — desde logo, em termos de duração — o estritamente necessário. É, contudo, uma medida cautelar e de polícia, que pode ser ordenada não apenas pelo juiz, mas também pelo Ministério Público, pela polícia (situação mais habitual) e até, em caso de flagrante delito, por qualquer pessoa que assista à prática de um crime.

Ninguém pode ficar detido mais de 48 horas sem ser presente a um juiz. Já a prisão preventiva tem prazos máximos bastante mais alargados, dados os fins a que se destina, podendo prolongar-se por vários anos.