Artigos

Sobre a tribalização e o fanatismo

Voltaire, no século XVIII, explicou aos seus seguidores que uma das formas mais eficazes de diminuir o número de maníacos e de fanáticos era entregar essa ”doença do espírito” ao regime da razão. O pensador sossegou os incautos de que a receita poderia ajudar a clarividência dos homens e a promover uma maior tolerância.

O conselho do filósofo e humanista é válido para a nossa contemporaneidade político-partidária, sobretudo quando a ansiedade e o nervosismo eleitoral impera tanto sobre o siso como sobre o juízo de todos os intervenientes, sem exceção.

Haverá sempre um espaço para a paciência e para a brandura.

Sobre a tribalização, há dias, em debate muito interessante com um colega deputado da atual social-democracia, recordei um trabalho que fiz, salvo erro, no primeiro ano da faculdade (lá pelos idos 1992), sobre uma pequena seita europeia do século XVIII. A seita era um exemplo de mais puro fanatismo, pois o seu princípio e ideologia assentavam na afirmação fundamentalista de que era a “melhor do mundo”.

À guisa da nossa atualidade, e com pleno respeito pelo pensamento e opinião de todos os seres humanos, existem vários exemplos pródigos dessa tribalização fanática. A corrente da Renovação social-democrata encarna, globalmente, fazer parte de um sistema único no mundo inteiro, um sistema perfeito, idílico, inimitável, superior e excepcional. Parecem querer “mandar para as galeras as pessoas que não seguem a sua tribo, e repetem o seu credo”.

O fanatismo, o fervor excessivo, por vezes persistente e irracional, pode levar a estados de espírito delirantes. Um dos casos de estudo mais interessantes - sem a pretensão de menorizar o ser humano enquanto razão de valor essencial, - é do nosso colega, líder da oposição municipal social-democrata. O colega Bruno Camacho, enquanto correligionário da corrente “Renovação” ou dos “renovadinhos” é digno de estudo e de análise. Corresponde a uma peça rara e “bruta” (no sentido a permitir a delapidação); e fértil. Um produto da cegueira ideológica tribal e da “colonização mental seguidista”.

Afirmo isso, porque a coleção de declarações escritas é vasta! Como afirmou Pessoa, quem escreve às vezes não repara que está falando por escrito, e assim “há muitos que escrevem coisas que nunca ousaria dizer" (A Educação do Estoico, 2018).

Uma das últimas frases hilariantes de Camacho é o de afirmar que tive um encontro pessoal e demorado com André Ventura (Chega). E não ficou por aí! Foi mais criativo e desatinado: que dispomos (eu e o Ventura) de um acordo, assinado no Funchal, sobre a liderança de Santa Cruz.

(Sorrisos) tolerantes… Meu Deus ao que chegou um extremista exacerbado; um recriador na terra das visões do seu espaço; um produto do fanatismo social democrata.

Voltando à missão de Voltaire, teremos sempre de invocar o regime da razão para perceber as “doenças do espirito”.

Um outro exemplo de fanatismo intolerante reside na postura monologante do presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque, nomeadamente em não estabelecer uma saudável e moderna auscultação com os partidos da oposição sobre as medidas Covid19. É um eterno regresso ao passado, ao centralismo e ao absolutismo. Um saudosismo da relação ingrata entre morgado e colono; uma postura do quero, posso e mando, em total comunhão com o histórico déficit democrático.

Ficou claro, que o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, com o encontro institucional com os partidos da oposição (a seu pedido), deu uma valente lição de democracia a Miguel Albuquerque. Em 60 minutos, Marcelo, fez mais do que Miguel Albuquerque num ano inteiro, ao nível de maturidade e de sapiência democráticas. Passados mais de 300 anos sobre os ensinamentos da tolerância, continua a faltar ao presidente do Governo, aquilo que os humanistas do século XVIII afirmaram ser uma “civilidade tolerante” (François Fénelon).

Pessoa costuma afirmar, que não é no individualismo que reside o nosso mal, mas na qualidade desse individualismo.