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Pimenta na língua

À conta da desculpa de que não devemos criar pânico na população, ganhou-se o hábito de brincar com as palavras e dar a falsa sensação de que está tudo controlado.

A minha experiência de vida diz-me que só brinca com as palavras quem esconde e sabe que mente.

Gosto da verdade. Quanto mais cedo a enfrentamos, menos se sofre e mais rapidamente se tomam as decisões necessárias.

Caro leitor, a situação pandémica nunca esteve tão grave como agora e prepare-se que o número de doentes com covid vai aumentar. Na passada 6.ª feira, tínhamos já 305 casos ativos e 131 casos suspeitos. Infelizmente, alguns destes casos suspeitos serão positivos. Com estes números, está tudo controlado? Pimenta na língua!

Insistir que a situação está controlada é irresponsabilidade governativa, permitindo uma falsa sensação de segurança em comunidade e, consequentemente, algumas pessoas tendem a se descuidarem das medidas a tomar. A maior contaminação que agora ocorre é proveniente das pessoas que aqui vivem e não dos que nos visitam.

É verdade que existem os irresponsáveis, que consideram que tudo isto é uma baboseirada, que pensam que nada lhes acontecerá, que andam com o nariz fora da máscara, ou mesmo sem máscara, e que se põem a jeito para ficarem doentes e para contaminarem outros. Mas há muitos que contraem a doença apesar de tomarem cuidado.

Apelar para que haja maior responsabilidade nas atitudes e respeito pelas medidas de higiene e desinfeção, uso correto da máscara e distanciamento físico deve ser uma atitude cívica de todos nós. Este apelo assume ainda mais importância por parte daqueles que têm responsabilidade governativa. Mas, acusar que esta situação é “culpa das pessoas que são irresponsáveis” por não tomarem as medidas necessárias para o controlo da contaminação é não ter nível para governar. Novamente, pimenta na língua porque há formas corretas de se dirigir à população.

Está nas nossas mãos evitar o contágio, mas a tomada de medidas que evitem riscos acrescidos para as pessoas é da responsabilidade dos nossos governantes.

Em outubro deste ano, neste espaço de partilha de opinião, alertei para as regras desadequadas definidas pelos Horários do Funchal no transporte das pessoas durante este tempo de pandemia.

Infelizmente, apesar da lotação definida para cada autocarro, verifica-se que a lotação decidida continua desadequada. Continuamos com autocarros sobrelotados em horas de ponta e não há, conforme anunciado, desdobramentos de autocarros, sujeitando muitas pessoas cumpridoras das regras a ambientes que podem ser altamente contagiantes. Face ao número cada vez crescente de casos, isto é simplesmente inadmissível. Já deveriam ter aumentado o número de autocarros disponíveis em hora de ponta. Ainda por cima, alguns passageiros continuam a fazer todo o percurso com o nariz de fora, apesar dos alertas dos outros utilizadores para o uso correto das máscaras.

A administração dos Horários do Funchal está a ser irresponsável ao permitir a sobrelotação e o governante com responsabilidade nesta pasta está a ser extremamente negligente por não exigir à administração da empresa medidas que permitam maior segurança da população.

Senhores governantes, são céleres em pedir-nos para evitar ajuntamentos, inclusive nas celebrações religiosas e nos encontros familiares do Natal, mas já não são “céleres e exímios” na criação de condições de segurança nos espaços públicos à vossa responsabilidade? E deixem-se de esconder a verdade que só prejudica a preparação das pessoas para o que têm de enfrentar.

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