Crónicas

As férias grandes

Eu de aviões sabia como eram por fora, mas o que me fascinava não era saber como seriam por dentro, nem sequer como conseguiam voar por cima do mar.

Julho lembra a férias, mas não destas de ir passear mundo além, com malas e viagens de avião, mais as fotografias bonitas no Facebook e no Instagram. As minhas memórias de férias são muito mais modestas e por muitas razões. A Internet ainda não tinha sido inventada e o dinheiro não era para gastar assim.

O dinheiro, bem o dinheiro era curto e, quando sobrava, a minha mãe guardava-o na gaveta da cómoda, debaixo do papel de embrulho que servia de forro para gavetas. O que, só por si, dá para perceber como se vivia e poupava tudo, até os restos de papel dos presentes. A vida era o essencial e ir de férias estava fora de alcance.

A primeira pessoa a ir de férias foi a minha prima Ana, que era professora, bonita, nova e a imagem de tudo o que eu queria para mim quando fosse grande. Aquilo foi cá uma aventura, o vento atrasou a ida e a vinda, mas o mais extraordinário veio dentro da mala de Canárias cheia de tesouros como um estojo de cores e a manteiga de amendoim.

Um acontecimento que provocou ondas de choque na minha infância já que no Laranjal não se ia de férias a lado algum. As férias começavam quando acabava a escola a 30 de Junho e duravam três meses. A principal diferença era acordar tarde e deitar tarde, ir umas vezes ao Lido e depois ficar por casa a sonhar com viagens e aviões.

Eu de aviões sabia como eram por fora, mas o que me fascinava não era saber como seriam por dentro, nem sequer como conseguiam voar por cima do mar. O que eu queria mesmo, mesmo era comer aquela comida que serviam em tabuleiros, com café e sumo e bolos em chávenas de plástico com talhares que pareciam de brincar.

Teria sido a mais feliz das raparigas com esse repasto de avião, mas isso nunca aconteceu. As minhas férias foram sempre as mesmas e com poucas mudanças de ano para ano, tirando o Verão dos ensaios de teatro do grupo de jovens e o outro em que tentei aprender costura com a dona Deolinda.

Os outros foram sem interesse e mais ou menos por esta ordem: ver as notas, fazer a matrícula, ir às festas da paróquia, à praia e depois o tédio, que é no que dá ter tempo e pouco que fazer. Também li uns livros, fui ao cinema e tomar café depois de espernear muito, que a minha mãe não estava para gastar dinheiro em tolices.

E agora tenho saudades de tudo isso.