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Fact Check Madeira

Aprovar um código de ética para o Governo Regional não traz novidade?

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O Conselho de Governo Regional, realizado nesta quinta-feira, aprovou um Código de Ética a que ficam sujeitos todos os membros do executivo madeirense.

A notícia desse facto suscitou dezenas de comentários nas redes sociais do DIÁRIO, com muitos deles a acusarem de hipocrisia e falta de credibilidade o Governo, dizendo que o código “fica no papel” e não é aplicado na prática.

Um dos comentários diz que o “Código deveria de ser cumprido pelo Governo Regional”, deixando em aberto a existência de um que não é cumprido. Aprovar, agora, um novo, não traz novidade. Corresponderá à verdade o que é afirmado, explícita e implicitamente pelo leitor?

A verificação do que é dito é relativamente simples, por se tratar de uma análise objectiva. Ou já existia Código ou não existia. No caso de existir, não há novidade no facto de o Governo Regional ter aprovado um novo documento na quinta-feira.

Vejamos, uma síntese, a história do que são os códigos de ética dos executivos da República e das Regiões, no pós-25 de Abril. Aliás, antes nem regiões autónomas existia, por isso não poderia haver códigos de ética para algo inexistente.

Como habitualmente, neste tipo de casos, a nossa pesquisa, mais do que exaustiva, foi elucidativa, com o objectivo maior de aferir a veracidade ou não do que é afirmado.

Nesse contexto e condição, verificámos que o primeiro Código de Ética de um executivo é datado de 2016. Já lá vamos.

Os Código de Ética do Governo da República são aprovados por Resolução do Conselho de Ministros. O primeiro documento que identificámos é data de 1993. Mas não é propriamente um código de Ética. Será o que pode ser considerado um antecedente.

A 18 de Fevereiro de 1933, num Conselho de Governo presidido Aníbal Cavaco Silva, foi aprovada a Carta Deontológica do Serviço Público (Resolução do Conselho de Ministros n.º 18/93). Tratou-se de uma carta que integrou “os valores essenciais do serviço público e um conjunto de regras de conduta nas relações com os cidadãos”.

Essa carta viria a ser revogada em 1997 por outra resolução do Conselho de Ministros (Resolução do Conselho de Ministros n.º 47/97). “Em cumprimento do acordo salarial para 1996 e dos compromissos de médio e longo prazo, foi discutida e consensuada com as associações sindicais subscritoras do acordo um texto designado ‘Carta ética - Dez princípios éticos da Administração Pública’.”

“Entende o Governo que não deve aprovar o referido documento, mas dele tomar conhecimento como órgão superior da Administração Pública.”

Como se verifica, não é exactamente um Código de Ética para o Governo.

Um Código de Ética, como referido acima, viria a ser aprovado por Resolução do Conselho de Ministros em 2016 (Resolução do Conselho de Ministros n.º 53/2016, de 21 de Setembro).

O documento surgiu de necessidade sentida internamente e de recomendações internacionais, no sentido de garantir integridade e transparência à acção do Governo. O diploma fixou, entre outros, regras sobre aceitação de ofertas (com tecto monetário), hospitalidade, patrocínios, deslocações e relacionamento com entidades privadas, vinculando membros do Governo e respetivos gabinetes.

Em 2019, houve um ‘reforço’ do Código (Resolução do Conselho de Ministros n.º 184/2019, de 3 de Dezembro). Foi reafirmada a natureza autorregulatória do documento, clarificando conceitos e alargando a abrangência a membros de gabinetes e dirigentes superiores sob direcção do Governo).

Em paralelo, a Assembleia da República aprovou o Regime do Exercício de Funções por Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos (Lei n.º 52/2019).

Em 2022, nova resolução do Conselho de Ministros (Resolução do Conselho de Ministros n.º 42/2022, de 9 de Maio) aprovou uma nova versão do Código de Ética. O texto retomou os núcleos clássicos (ofertas, hospitalidades, conflitos, patrocínios, uso de recursos públicos) e reforçou o dever de reporte e a articulação com planos de prevenção ministeriais.

Em 2024, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 64/2024, de 24 de Abril, aprovou novo Código e Ética e levou à ao Plano de Prevenção de Riscos do Governo (Resolução do Conselho de Ministros n.º 102/2025, de 5 de Junho).

Nos Açores, houve, primeiro, um Código de Ética e Conduta da Vice-Presidência) em 2022, e, em 2024, por despacho do presidente do Governo Regional, idêntico documento para a Presidência. Mas, como os dois documentos deixam claro, existe leis nas mesmas áreas que devem de ser cumpridas. Outros códigos sectoriais têm sido aprovados.

Na Madeira, o Governo de Miguel Albuquerque aprovou o seu Código de Ética (Resolução do Conselho do Governo Regional n.º 1020/2024, de 2 de Dezembro) em 2024. Como então escrevemos, o documento é praticamente igual aos que têm vindo a ser adoptados pelos governos da República, tanto liderados por António Costa como, agora, por Luís Montenegro.

Nesta quinta-feira, como noticiado pelo DIÁRIO, o Governo Regional aprovou o Código de Ética para todo o actual executico.

Como se verifica, a aprovação de um Código de Ética pelo Governo Regional da Madeira, para si próprio, não representa qualquer novidade, por já existir a nível nacional e até nesta Região. Quanto ao cumprimento do mesmo, tratando-se de um documento de autorregulação, é muito difícil de controlar se o é ou não. Esse também não foi o objecto deste trabalho.

Por tudo o que é dito, avaliamos como verdadeira a posição implicitamente afirmada pelos leitores, de que já existem códigos de ética e que o agora aprovado não constitui novidade

“Esse Código deveria ser cumprido pelo Governo primeiramente" – J. Ornelas, no Facebook do dnoticias.pt