Um certo dia na Guiné

Já lá vão muitos anos, algumas décadas, quando fomos mobilizados para a Guiné - hoje conhecida como Guiné Bissau – onde decorria a guerra para a independência daquela antiga Província Portuguesa.

Não vamos falar dos sentimentos de tristeza, de amargura, de frustração de todos aqueles jovens que se viam obrigados a deixar, uns, os seus trabalhos, outros, os seus estudos e todos as suas famílias, os seus amigos, a sua respetiva terra, no fundo as suas vidas, umas mais difíceis que outras, mas todas incomparavelmente mais seguras, mais harmoniosas e onde começavam a dar os primeiros passos para a construção da sua estabilidade e do seu futuro.

E, pior que tudo isso, o medo que possuíam de poderem ir e não mais voltar.

Aliás, o que, infelizmente, iria acontecer.

Muitos foram e não regressaram mais para junto dos seus entes queridos, outros vieram com marcas profundas que carregaram até ao fim das suas vidas e outros ainda hoje sofrem os efeitos dessa fase triste da sua vida.

Bom, mas não é bem isto o que nos levou a escrever este apontamento, nem falar da justiça ou injustiça da guerra ou se estávamos lá por direito próprio ou, afinal, quem devia lá estar eram russos, chineses, americanos ou outros a “explorar “aquele povo – tal como o povo moçambicano e angolano – como dizem os novos donos daqueles agora países, relativamente aos portugueses.

O que nos levou a escrever este apontamento foi num determinado dia uma conversa que mantivemos com um nativo, porventura um homem simples que desempenhava as funções de “alfaiate “sentado atrás de uma modesta máquina de costura num local bem próximo da sua tabanca.

Homem simples, já o dissemos, provavelmente analfabeto, mas que, pelos vistos, sabia melhor da sua terra e das suas gentes do que bandos de idiotas doutorados que andaram e ainda andam por aí a falarem do que não sabem, a dizerem o que nunca viram e a comentar sobre aquilo que não percebem.

A conversa com este “homem da tabanca” era simples, versava assuntos rotineiros, do dia a dia que, passados todos estes anos, já não nos recordamos para pormenorizar, mas houve uma pergunta que lhe fizemos e a resposta que obtivemos que jamais nos saiu do pensamento.

- O que acha sobre a independência da Guiné? Na sua voz pastosa, calma e serena e após olhar ao nosso redor para certificar-se que estávamos sós, e no seu português aprendido não na escola, mas na convivência com os militares portugueses, respondeu-nos da seguinte maneira: Ai da gente se a Guiné for um dia mandado por gente da nossa cor!

Existe mais ódio entre as várias etnias do que aquele que é sentido com os portugueses.

Não precisamos de fazer mais comentários, estes 50 anos de independência não têm mostrado outra coisa.

Também este apontamento não pode deixar de se referir às palavras grosseiras e mal-educadas de um indivíduo em Angola que aproveitou o momento solene dos 50 anos da independência daquele País e perante todos os convidados, incluindo o Presidente da República Portuguesa para dizer ou querer dizer que o mal de Angola vem da colonização dos portugueses.

Para nós não vem da colonização dos portugueses, vem da miserável descolonização dos portugueses após abril de 74.

Se em muitas situações, Angola – e não só - está pior do que há 50 anos a culpa é pura e simplesmente daqueles que têm governado os respetivos Países.

Se muito do seu povo passa fome e vive em degradadas situações num país, por exemplo, com as riquezas naturais de Angola é porque os milhões gerados têm supostamente seguido rumos que não são os do bem-estar da população e desenvolvimento do país.

Procurem os que foram e os que são culpados e não arranjem bodes expiatórios.

Juvenal Pereira