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Explicador Madeira

Solidão na época natalícia

Ordem dos Psicólogos defende que combate à solidão deve ser prioridade

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O Natal, época de alegria, é, para muitos, uma altura de pressão sobre a saúde mental, evidenciando questões que, em outra altura do ano, poderiam passar despercebidas. Emoções como tristeza, ansiedade ou sentimentos de solidão são comuns. Psicólogos promovem formas de combate à solidão.

Existem várias razões pelas quais o Natal pode ser um momento difícil, muito devido a expectativas sociais. Relações familiares complicadas, perdas de pessoas importantes, desafios de saúde mental ou estar fisicamente longe da família podem contribuir para que esta época seja vivida com maior dificuldade.

Para muitos, o Natal acentua a ausência de familiares, amigos ou pessoas importantes. As redes sociais e meios de comunicação, por vezes, vincam uma imagem de felicidade colectiva nesta altura do ano, que não corresponde à realidade, e pode exacerbar a sensação de exclusão.

Primeiramente é importante que quem está a passar por uma altura mais complicada saiba que os seus sentimentos são válidos, normais, e que não são a primeira pessoa que se encontra naquela situação. Reconhecer as emoções menos positivas é um importante primeiro passo para lidar com elas.

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Sandra Rodrigues , 22 Dezembro 2025 - 15:38

Além de reconhecer e normalizar os sentimentos, algumas acções podem ajudar a tornar esta época menos difícil. Procurar e criar ligação com uma rede de apoio, que pode incluir amigos e familiares de confiança, mesmo que isso aconteça virtualmente. Praticar o voluntariado é também importante para os outros e para o próprio. Ajudar traz uma sensação de propósito e de pertença, diminuindo a sensação de isolamento.

Num ano de grandes reviravoltas, podemos sempre criar novas tradições. Uma pessoa que está a lidar com mudanças significativas ou perdas, pode tentar encontrar formas de dar um novo significado ao Natal. Uma nova tradição pode ser um passo para começar a criar memórias diferentes e mais leves e positivas.

Por outro lado, nem todas as pessoas atribuem um significado especial ao Natal. Para alguns, é só mais um dia, sem qualquer ligação emocional ou espiritual. Para outros, é mesmo uma data a ignorar, devido a experiências passadas negativas. Em casos como estes, insistir para que essas pessoas participem em celebrações ou sigam tradições natalícias pode ser invasivo e desrespeitador.

Algumas pessoas não se importam de passar o Natal sozinhas e, para elas, essa opção pode ser a mais tranquila e confortável. Ou seja, é importante respeitar a diversidade de opiniões sobre o Natal, e não forçar celebrações a quem não o quer fazer.

Iniciativas solidárias

Habitualmente, na quadra natalícia, existe um aumento de iniciativas solidárias voltadas para pessoas em situação de vulnerabilidade, particularmente idosos, pessoas em situação de sem-abrigo e crianças de famílias carenciadas. Organizam-se ceias colectivas, visitas a lares e outras instituições, angariações de fundos e prendas, e outras acções para minimizar a solidão.

São gestos valiosos, mas paradoxais, segundo a Coordenadora da Psicologia Clínica na Clínica de Neurociências e Saúde Mental do Hospital Cruz Vermelha, Roberta Frontini. “A atenção a quem está sozinho tende a ser sazonal e pontual, desaparecendo no resto do ano. A verdade é que a solidão não se limita ao Natal, e milhões de pessoas vivem isoladas ou em situações de solidão, isolamento ou abandono emocional durante todo o ano”, assevera.

A psicóloga defende que o espírito da solidariedade deve viver durante todo o ano. “A verdadeira solução para o isolamento social não passa por gestos pontuais, mas sim por redes de apoio consistentes, onde as pessoas possam sentir-se incluídas e valorizadas independentemente do calendário”, elucida.

Como formas de combate ao isolamento social, sugere a adopção de práticas simples ao longo do ano, como a promoção de redes de vizinhança, incentivar encontros regulares ou iniciativas comunitárias para integrar pessoas que vivem sozinhas, apoiar organizações sociais, fomentar uma cultura de atenção constante, e ter gestos de cuidado, carinho e disponibilidade todo o ano.

Combate à solidão

Em vésperas de Natal, a Ordem dos Psicólogos Portugueses alerta que a solidão é considerada um dos grandes desafios da nossa sociedade e um problema global de Saúde Pública. Pede, por isso, ao Governo da República que o combate à solidão se torne uma prioridade de saúde pública.

Num 'policy brief' dirigido a decisores políticos, lembra que a solidão não tem apenas efeitos negativos na nossa saúde e bem-estar, mas também um impacto real na economia e na sociedade. Pode causar maior perda de produtividade, maior vulnerabilidade económica, maiores custos em Saúde, maior risco de exclusão social e menor coesão social.

O documento apresenta dados concretos sobre os custos que a solidão pode ter para a saúde. A solidão aumenta em 14% o risco de mortalidade por todas as causas, pior estado geral de saúde física, aumenta o risco de doença cardiovascular e de diabetes tipo 2. O impacto equivale a fumar 15 cigarros por dia.

Está, também, associada a problemas de saúde mental como a depressão, ansiedade, perturbação bipolar, psicose, perturbação de stresse pós-traumático, perturbações da alimentação, ideação suicida e comportamentos autolesivos. Com o isolamento, o risco de demência pode aumentar em 31%.

Em Espanha, estimou-se que, em 2021, o impacto económico da solidão atingiu 14 mil milhões de euros, o equivalente a 1,17% do PIB nacional. No Reino Unido, a solidão custa aproximadamente 3 mil milhões de euros por ano às empresas. O custo societal da solidão, no mundo, ronda entre os 2 mil milhões de euros e os 25 mil milhões de euros, especialmente devido a gastos em Saúde e à perda de produtividade

Assim, a OPP destaca que as intervenções para combater a solidão são custo-eficazes, sendo que o retorno pode ir de 2 a 14 euros por cada 1 euro investido. “Combater este problema requer uma abordagem integrada e multinível que envolva a Saúde, Educação, Trabalho, Urbanismo e Políticas Públicas – uma estratégia nacional que fortaleça a coesão das comunidades e reconheça o papel dos Psicólogos neste domínio”, conclui a Ordem dos Psicólogos.