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Fact Check Madeira

As empresas que vendem produtos em Portugal são obrigadas a entregar na Madeira?

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Chega o Natal e as compras online voltam a dominar o dia-a-dia. As campanhas multiplicam-se, as entregas prometem rapidez e os carrinhos virtuais enchem-se com a mesma facilidade com que se percorrem as ruas iluminadas nesta quadra. No entanto, para muitos madeirenses, o entusiasmo esbarra sempre no mesmo obstáculo. No momento de inserir a morada, surge o bloqueio. Não enviamos para a Madeira. Entrega não disponível. Apenas Portugal Continental. O ritual repete-se ano após ano e a pergunta continua a mesma. Afinal, as empresas que vendem produtos em Portugal são obrigadas a entregar na Madeira? Ou podem continuar a excluir a Região como se estivesse fora do mapa?

A resposta está escrita na lei. Desde março de 2022 que existe legislação específica para impedir este tipo de prática. A Lei n.º 7/2022, publicada a 10 de Janeiro desse ano, determina que não pode existir discriminação nas vendas electrónicas com base no local de residência do consumidor. O artigo 5.º, número 2, é directo e incontornável.

O comerciante tem a obrigação de disponibilizar condições de entrega dos seus bens ou serviços para a totalidade do território nacional. Isto significa que qualquer empresa que venda para Portugal tem de permitir entrega na Madeira. Pode cobrar mais pelos portes, pode impor prazos mais longos, mas não pode bloquear a compra por causa da morada. A recusa automática é ilegal e constitui uma contra-ordenação grave, com multas até 25 mil euros.

Apesar disso, a prática continua. E continua porque várias marcas, nacionais e estrangeiras, optam por ignorar a legislação ou por manter sistemas que excluem a Madeira de forma automática. Há várias razões para isto acontecer. Muitas empresas internacionais operam com plataformas globais que tratam ilhas como destinos de envio complexos, caros e pouco fiáveis.

Estas plataformas seguem políticas uniformes para dezenas de países e não integram particularidades de legislação nacional. Cumprindo apenas a norma europeia, que não obriga entrega universal, acabam por desrespeitar a lei portuguesa, que obriga à entrega em todo o território.

Há também razões económicas. Enviar produtos para a Madeira exige transporte marítimo ou aéreo, implica custos adicionais e, nalguns casos, mais risco de atrasos ou devoluções. Algumas empresas não querem assumir esse encargo e, mesmo podendo imputar o valor ao cliente, optam por não disponibilizar a entrega. Em vez de cumprir a lei, preferem bloquear. A prática é irregular, mas a probabilidade de fiscalização é baixa e isso incentiva o incumprimento.

Outro factor é tecnológico. Muitos sistemas de comércio electrónico vêm pré-configurados com uma separação artificial entre Portugal Continental e destinos insulares. Alterar esta configuração exige tempo, conhecimentos técnicos e adaptação das regras internas. Muitas empresas não consideram que o volume de clientes das ilhas justifique esse investimento e mantêm o erro original, deixando que o sistema impeça automaticamente as moradas madeirenses.

Existe ainda um elemento de inércia. Sem uma fiscalização intensa e sem casos mediáticos, muitas marcas assumem que a prática continuará a passar despercebida ou que não gerará sanções. A lei existe, mas a execução prática demora a chegar à rotina das empresas, sobretudo das que operam fora do País.

É neste cenário que surgiram, nos últimos anos, soluções criadas especificamente para colmatar esta falha de mercado. Serviços de reexpedição instalados em Lisboa permitem que madeirenses criem uma morada virtual no continente, recebam ali as suas encomendas e as encaminhem depois para a Madeira.

Estes serviços tornaram-se essenciais para muitos consumidores que, de outra forma, não conseguiriam aceder a produtos que as marcas não enviam directamente. Para muitos particulares e empresas da Região, estas plataformas são hoje uma ponte indispensável para garantir acesso a bens que deveriam estar disponíveis de forma directa, sem intermediários.

A conclusão deste fact check é clara. Sim, as empresas que vendem para Portugal têm obrigação legal de disponibilizar entrega para a Madeira. A lei é explícita, foi aprovada pela Assembleia da República, promulgada e está plenamente em vigor. No entanto, muitas marcas continuam a contornar esta exigência por razões económicas, tecnológicas ou puramente operacionais. Enquanto isso, serviços de reexpedição continuam a ser usados como solução paralela para aquilo que a lei já deveria garantir. E assim, mesmo numa era de comércio global, milhares de madeirenses continuam a enfrentar um obstáculo que a legislação já eliminou, mas que o mercado insiste em manter.

As empresas que vendem produtos em Portugal são obrigadas a entregar na Madeira?