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Estudo alerta para riscos da concentração de Organizações Não-Governamentais nos PALOP

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Foto Shutterstock

A Plataforma Portuguesa das ONGD alerta que a concentração da intervenção destas organizações nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) as expõe a riscos de controlo político e dependência financeira, comprometendo a autonomia e a capacidade de actuação.

Segundo o novo estudo "As ONGD Portuguesas face aos desafios atuais", a intervenção e cooperação das Organizações Não-Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD) portuguesas concentra-se nos PALOP, maioritariamente em Moçambique (24), Guiné-Bissau (17) e São Tomé e Príncipe (16), sendo a actuação noutros países africanos "praticamente inexistente".

Angola (13), Cabo Verde (nove) e Timor-Leste (seis) também têm presença destas organizações portuguesas.

Esta concentração geográfica torna as organizações especialmente vulneráveis, uma vez que o espaço cívico está ameaçado a nível global, reflectindo-se de forma grave nos países prioritários, como Moçambique, Angola e Guiné-Bissau, considera a Plataforma.

No documento indica que as organizações estão a operar num contexto de crises múltiplas e cumulativas, como a crise de paz e segurança, crise da democracia e crise das desigualdades, que estão a aumentar drasticamente as necessidades de financiamento para o desenvolvimento e a causar "crescentes dificuldades na prestação de ajuda e ataques a trabalhadores humanitários".

Em Moçambique e Angola, as propostas legislativas visam impor maior controlo e restrições à actuação das Organizações da Sociedade Civil (OSC), sob o pretexto de combater o branqueamento de capitais e o financiamento ao terrorismo, aponta.

Já na Guiné-Bissau, a sociedade civil é alvo de intimidações e detenções arbitrárias por denunciarem "as violações dos direitos humanos, perseguições aos opositores políticos e as tentativas de condicionamento do exercício da liberdade de imprensa no país".

"No espaço de poucos anos, a lacuna de financiamento global dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) nos países em desenvolvimento passou de 2,5 mil milhões de dólares (2,1 mil milhões de euros) para mais de 4,2 mil milhões de dólares (3,6 mil milhões de euros)", indica o estudo.

Quanto à dependência de financiamento, aponta para um desafio estrutural interno devido à menor autonomia e independência das ONGD.

A maioria das ONGD obtém mais de 70% do seu orçamento de fundos destinados a projetos específicos, existindo 11 organizações onde esse financiamento ultrapassa os 90% do orçamento total. Em oposição, "o peso dos fundos ou receitas 'próprias' no orçamento total das organizações, ou seja, que não estão à partida destinadas a projextos pelos doadores e financiadores, é bastante baixo (em mais de dois terços das ONGD inquiridas, representa abaixo dos 30%)".

De acordo com o relatório, "as ONGD tendem a ser, cada vez mais, implementadoras e executoras de projextos financiados externamente, que correspondem às agendas, prioridades e regras/critérios definidas pelas entidades financiadoras".

Esta dependência traduz-se numa menor autonomia e independência, especialmente nos PALOP, onde a ajuda pública ao desenvolvimento está sob pressão e onde os governos procuram diminuir a dependência da ajuda externa.

Embora a intervenção das organizações se concentre na saúde e na educação, áreas críticas como ambiente, alterações climáticas, água e saneamento e monitorização de políticas públicas têm ainda pouca expressão apesar de o contexto global da crise climática exigir maior foco nestas áreas, lê-se no documento.

O estudo conclui que o impacto destas mudanças será inevitável nas estratégias, recursos e abordagens das ONGD. O desafio para as organizações portuguesas não é apenas responder às necessidades crescentes, mas também garantirem que conseguem reforçar o seu papel num ambiente de risco, diversificando parcerias e fontes de financiamento para salvaguardar a sua autonomia.