Há de a Poesia Ficar
O título desta homenagem é de um dos últimos livros de poesia, da professora, investigadora, poetisa madeirense, Fátima Pita Dionísio, que ontem nos deixou, com os seus experienciados 75 anos de vida. Com um percurso terreno de desassossegos, a poetisa foi uma voz comprometida com a educação de várias gerações de alunos, com a escrita irrepreensível, com a análise critica sobre antologias regionais, nacionais e estrangeiras e com o perfume do seu amor pela liberdade, dando-se aos outros sobretudo através do seu espírito livre e crítico, conciliando esse seu modo de respirar com o ensaio e o conto. Da dor do próximo e da solidão dos últimos, construiu a sua inquietação permanente – a beleza revolucionária, narrada na sua arte fina de comunicar com os seus leitores, os quais reconhecem o seu legado literário e a maneira como elevou o mundo através da sua escrita inquietante. O seu percurso pela escrita inspira-nos a ser mais sensíveis e mais capazes para compreendermos e sentirmos a música, a arte e a força pedagógica da comunicação tão fundamental para as pontes de proximidade entre povos. A propósito, escreveu o poeta espanhol Piquera, assumindo convincentemente, que a poesia “… é comunicação que gera a tolerância e a liberdade… porque traz à luz o mais nobre do ser humano, descobre a ternura de que o Homem atual precisa”. Por seu torno, escreveu Graça Alves, como prefácio do livro que a professora Fátima Dionísio lançou em 2016, que “só a poesia há de ficar, portanto, quando tudo se for embora, quando as asas dos pássaros se recolherem no chão, quando, finalmente, se assumir o risco de saltar para o abismo das coisas impossíveis. É essa a busca do poeta – queríamos ser imortais”. Essa imortalidade é e será o seu maior prémio, a sua maior recompensa enquanto a sua memória perdurar no universo do tempo de todos os amam a poesia.
Não tendo sido seu aluno, tive o privilégio de a conhecer pessoalmente, assim como, a sua poesia mais de perto, por ocasião da realização da 13 edição do “Luar da Poesia”, em Junho deste ano, organizada pelo Grupo de Teatro de Machico. Em cada edição, esta Associação de índole cultural, homenageia a escrita poética de poetas madeirenses, tendo sido eleito para a edição de 2025, a poetisa Fátima Pita Dionísio, que ainda em vida lhe foi rendida a justa e merecida homenagem. No palco do Forum Machico, já com uma voz frágil, esforçou-se para elevar e enaltecer a poesia e seu papel preponderante nas relações entre povos e comunidades onde só a poesia há de ficar, quando de facto tudo se for embora. Antes do final, houve ainda tempo para recitar o poema da autoria da sua filha, Carolina Dionísio - No amor imperecível das memórias - um hino único de gratidão dedicado à sua mãe “De ti fica o que me ensinaste, mas, sobretudo, fica a tua poesia: a forma como te ‘reconcilias’ com a vida como dizia o nosso Eugénio. Amamos muita coisa juntas. Que seja assim: para sempre na Eternidade.
Severino Olim