Será que nos últimos 4 anos Miguel Silva Gouveia “escondeu a marca do PS” na CMF?
A ressaca das eleições autárquicas do último domingo tem sido fértil em declarações de figuras políticas com críticas e recados para o interior dos seus próprios partidos. Há exemplos nos vários quadrantes políticos. Alberto João Jardim acusou o PSD de ter perdido a costa norte da Madeira. Nuno Morna anunciou “o fim do silêncio” a que se autoimpôs e hoje mesmo classificou como “um disparate” uma proposta que o deputado do seu partido apresentou no parlamento regional.
Mas é no PS que se têm registado mais casos de ‘ajustes de contas’. Desde logo, com o líder demissionário, Paulo Cafôfo, a acusar o seu antigo ‘número dois’ na CMF e ainda vereador Miguel Silva Gouveia de, nos últimos quatro anos, “ter escondido a marca do PS, porque falava sempre em Confiança, quando a coligação ‘Confiança’ na verdade acabou no dia das eleições”. Será que foi mesmo assim?
Miguel Silva Gouveia foi vereador da Câmara Municipal do Funchal desde Maio de 2014 até Junho de 2019, altura em que, por Cafôfo ter renunciado ao mandato autárquico, subiu a presidente. Foi eleito primeiro pela coligação ‘Mudança’ (PS, BE, PND, MPT, PTP e PAN) e depois pela coligação ‘Confiança’ (PS, BE, JPP, PDR e Nós Cidadãos), mas sempre indicado pelo Partido Socialista. Nas eleições autárquicas de 26 de Setembro de 2021, foi cabeça-de-lista da coligação ‘Confiança’ mas perdeu a eleição para a CMF para Pedro Calado, que concorria pela coligação ‘Funchal Sempre à Frente’ (PSD e CDS).
Nos últimos quatro anos, Miguel Silva Gouveia assumiu o seu mandato de vereador da oposição, juntamente com os outros quatro eleitos pela mesma coligação (Cláudia Ferreira, Rúben Abreu, Vítor Jesus e Micaela Camacho). Apesar de alguns serem independentes, foram todos indicados pelo PS. Assumiram um papel muito activo na vida camarária, com dezenas de declarações e posições públicas, sobre os mais diversos temas. Os vários registos públicos, seja na comunicação social seja nas redes sociais, mostram que, de facto, fizeram-no sempre em nome da coligação ‘Confiança’ e nunca em nome do PS. Pelo contrário, os representantes do PS na Assembleia Municipal do Funchal assumiram “a marca do PS”.
Paulo Cafôfo também referiu que “a coligação ‘Confiança’ na verdade acabou no dia das eleições”. A Lei Orgânica n.º 2/2003 (Lei dos Partidos Políticos) dispõe que “uma coligação não constitui entidade distinta da dos partidos políticos que a integram”. Por sua vez, o artigo 17.º da Lei Orgânica n.º 1/2001 (eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais) determina que “as coligações para fins eleitorais não constituem individualidade distinta dos partidos e deixam imediatamente de existir logo que for tornado público o resultado definitivo das eleições”. Ou seja, na prática, cada autarca eleito passa a representar o partido que o indicou para a coligação. Neste aspecto, o líder demissionário do PS tem igualmente razão.
Numa publicação feita ontem no Facebook, Miguel Silva Gouveia disse não comentaria os reparos de Paulo Cafôfo. Hoje, quando interpelado pelo DIÁRIO, manteve essa posição.
Em sua defesa, poderia sempre dizer que não é o único que estende o prazo de validade das coligações autárquicas para além daquele que está previsto na lei. Afinal, na página da CMF, a presidente e os vereadores com pelouros continuam a ser identificados como sendo eleitos pela coligação ‘Funchal Sempre à Frente’ e não pelo PSD.