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Uma lógica inatingível

Se há dossiê na história da vida política portuguesa que daria uma grotesca produção televisiva seria, sem dúvida alguma, o da TAP. Foram já esgotadas as ideias para envolver a companhia em novas polémicas. Ou talvez não. A verdade é que quase todas as semanas criam-se novas temporadas, chegam-nos novos episódios e agora com o início da Comissão Parlamentar de Inquérito iremos ser contemplados, em direto, com acontecimentos que poderão definir o futuro de um determinado ministro, do hipotético próximo líder do Partido Socialista, ou até mesmo, do governo.

Momentos antes das eleições legislativas de 2015, o Partido Socialista e o seu aclamado líder, o Dr. António Costa, faziam da TAP um assunto central para a governação do país, chegando mesmo a equipará-la às caravelas portuguesas dos descobrimentos.

Desde então que o PS andou num carrocel de opiniões acerca da sua gestão. Em 2015, reverteram a privatização feita pelo governo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Em 2020, nacionalizaram totalmente a empresa, comprometendo-se a injetar 3.2 mil milhões de euros de todos os contribuintes. No final de 2022, anunciam a reprivatização da companhia aérea. O governo defendeu tudo e o seu contrário relativamente à TAP, igualando esse feito ao miserável episódio de André Ventura a votar de 3 formas distintas exatamente a mesma proposta no espaço de tempo de 12 horas.

A realidade dos factos é que a companhia aérea desde 2017 que não apresentava lucros, mas os resultados de 2022 são positivos e a empresa, finalmente, lucrou. Como é que é possível que, em 2020, a empresa apesar de apresentar prejuízos tenha sido nacionalizada e, em 2022, ao fim de 5 anos, depois de começar a dar lucros venha o governo anunciar a sua reprivatização? Uma lógica inatingível.

É incompreensível e eticamente inaceitável que o Governo da República tenha resgatado uma empresa para que esta não fechasse portas, invocando a sua relevância para o tecido empresarial português e o facto de ser absolutamente estratégica para o país, e tenha agora a decisão de reprivatizar depois de lá ter colocado mais de 3 mil milhões de euros do povo português. Mas ao que parece, tudo mudou. Enquanto dava prejuízo, o governo nacionalizou. Passou a dar lucro, o governo privatizou.

Se a posição tomada pelo governo do PSD/CDS não tivesse sido revertida pelo Dr. António Costa, os portugueses não teriam sido comprometidos a injetar quantias exorbitantes e astronómicas numa companhia aérea para depois nunca reaverem esse mesmo dinheiro, vindo agora o Estado privatizar a empresa quando esta apresenta saldos lucrativos.

Aguardaremos pelos próximos episódios. Uma coisa é (quase) certa, há quem possa não sobreviver politicamente às cenas que se seguem, apenas mais uns a juntar a todos aqueles que também não resistiram aos escândalos da TAP.