Crónicas

O perigo das redes sociais

Como em tudo na vida há sempre um artista ou um vendedor da banha da cobra

Esta semana puxo um tema que pode parecer fútil ou inócuo à primeira vista mas que deve ser lido com atenção e levado muito a sério. Temos a tendência de achar que tudo o que diz respeito às redes sociais é menor, tem pouca importância e não é relevante. Mas não é bem assim. Como ponto prévio, antes de mergulhar no assunto, quero que fique bem claro que eu não sou daqueles que acha que tudo o que seja relacionado com as redes sociais é mau ou nocivo para a nossa construção, enquanto sociedade. Seria aliás hipócrita se o achasse, estando eu presente nas mesmas. Já vivi fora do país e sei o quão importante foram para me aproximar dos meus, sei também que sem elas não conseguiria manter contacto ou saber de pessoas que não vejo há muitos anos e que se preciso for estão à distância de um chat, que nos ajudam a colecionar memórias que antigamente se restringiam aos álbuns de fotografias e que nos alertam para os aniversários que nunca decorámos. Muitas outras coisas mais. Quando bem usadas têm um valor inestimável. O problema é que quem as usa somos nós e nós conseguimos sempre maneira de estragar tudo e mais um par de botas. Como em tudo na vida há sempre um artista ou um vendedor da banha da cobra, para descobrir uma forma de corromper o sistema ou de arranjar forma de usar estratagemas para retirar dividendos ilícitos do que quer que seja.

As pessoas da minha geração e sobretudo os mais novos cresceram no meio deste ambiente e por isso tudo lhes sai de forma natural. Não se deixam enganar porque sabem como tudo funciona. Não se passa o mesmo com as pessoas mais velhas ou com os info excluídos. Por muito que nos custe a acreditar para esses, este mundo está carregado de segredos e de pontos de interrogação. Há quem não saiba partilhar um post de outra pessoa, quem não perceba quando fala em privado ou em público e muito menos esteja atento e vigilante para esquemas ou estratégias desenhados, para ferir quem menos estudos tem da matéria. Somos nós os mais novos ou mais informados que devemos instruir os nossos pais, os nossos tios ou avós e devemos fazê-lo com a mesma paciência que eles tiveram no acompanhamento do nosso crescimento. Um exemplo prático fora das redes, as mensagens que circulam por aí de supostos filhos a informar os pais que mudaram de número e precisam de uma transferencia para o novo de determinado valor. Mal ouvi esta história nas notícias liguei aos meus pais, expliquei-lhes o que se estava a passar e informei-os que em caso algum eu lhes pediria para me transferirem dinheiro para o que quer que fosse por mensagem. Sem ouvirem a minha voz e uma explicação plausível, nada feito. Passado uns meses ligou-me o meu pai a dizer que tinha recebido a referida mensagem e que era só para confirmar que não era mesmo minha. Arrumámos assim o assunto por ali. Se calhar, se não tivesse dito nada, na ânsia que sempre tiveram em me apoiar em tudo sem pestanejar, podiam até ter caído na esparrela.

Como este caso existem muitos nas redes sociais. Nós que trabalhamos bem com elas nem damos conta mas elas estão por aí. Desde promoções de sites que parecem ser de marcas oficiais, com produtos a metade do preço a convites para aderirmos a chats de cariz sexual há de tudo um pouco. Eu como já estou vacinado cada vez que recebo um convite de uma miúda com ar suspeito nem preciso de ler o resto, bloqueio e denuncio. A partir daí quem de direito que trate do resto. O problema é com as tais pessoas mais velhas ou os info excluídos. Sobretudo os homens. Indo direto ao assunto, um homem com 60 ou 70 e tal anos, apercebe-se, pela indiferença ou capacidades físicas que já não chama a atenção das miúdas mais atraentes. Já ninguém ou quase ninguém os vê como um produto sexual e o sentimento do passar do prazo de validade apodera-se dos mesmos. É por isso que nessa idade são raros os divórcios. A pessoa apercebe-se que está fora do “mercado” e que o melhor é ficar por ali para ter companhia ou alguém que cuide dele na doença. Isso não deixa de lhes afetar o ego. O tempo passou e isso é evidente para todos. Ora, quando uma miúda, com ar jovem e fresco mete conversa com eles numa dessas ferramentas, os elogia e se insinua, parece que tudo o que é racional desaparece e o ego volta a insuflar. Não estão capacitados para entender que estão a ser enganados nem lhes interessa sequer pôr essa hipótese. Para nós é fácil, chegamos a um perfil, se tem fotos muito trabalhadas, se em todas elas não há um único comentário de um amigo ou familiar mas apenas de homens babados a dizer “fazia e acontecia”, se os seguidores são quase todos homens e as publicações no mural não demonstram nenhuma personificação está na cara que é falso. Mas nem toda a gente consegue ver isso assim.

Isso resulta em dois resultados. Um, o homem ilude-se perante a cantiga e o choradinho mais a promessa de encontro na semana seguinte e transfere-lhe uns euros para ajudar na consulta ou na propina. Dois, a (suposta) miúda começa a mandar umas fotos mais ousadas e a determinado momento pede uma em troca. O homem entusiasmado manda a fotografia mais íntima e a partir daí é chantageado com ameaças de partilha para amigos e família. Este com receio de que a imagem que construiu toda a vida seja destruída em dois segundos vai dando até não poder mais. Existem em Portugal milhares de casos tanto de um como de outro. Uns identificados e investigados mas a maioria, ocultados por vergonha. Esta semana, como ia escrever sobre o assunto alimentei dois casos desses e se num estava na cara que era esquema, no outro o esquema estava tão bem montado que cheguei a duvidar se seria uma miúda com completa falta de noção ou o enredo do costume. Claro que quando queremos parar com o assunto basta pedir uma video chamada para tudo desabar, mas isso somos nós que sabemos. É por isso fundamental que passemos esse tipo de informação aos que têm mais dificuldade em navegar pelas redes. Porque há por aí cada vez mais relatos de casos verdadeiramente dramáticos, que seriam facilmente evitados com um conhecimento um bocadinho maior sobre o tema. Não deixem de o fazer em casa, mesmo que por vezes isso pareça constrangedor.