Análise

Guião para as ‘Regionais’

Os resultados da Legislativas precipitaram alguns políticos para as Regionais do próximo ano, como se o chão lhes fugisse desde já, como se nada mais houvesse de importante até lá, como se o eleitorado fosse ainda demasiado infantil, logo, susceptível de ser aliciado com brinquedos de utilidade e durabilidade duvidosas.

2023 é já ao virar da esquina, mas não dispensa reflexão séria atempada, por mais repentistas que sejam os protagonistas em actividade. Uma equação que atenda ao essencial da próxima eleição, ao novo contexto político nacional, aos fenómenos que despertam à direita e definham à esquerda, à migração sem aviso dos contestatários, ao sempre difícil relacionamento com a República e ao desgaste da maioria de circunstância, ainda em vigor, em que os que têm andado à boleia dão a entender, através de ameaças e de insultos que tomaram conta do carro.

Os projectos de superação das crises e os programas de afirmação da Região, em áreas em que pode ser diferenciadora e competitiva, são bem mais importantes do que perspectivar quem vai mandar na Madeira do futuro, para que assim possa desde já ensaiar o poder pelo poder. As grandes causas das forças políticas deviam ser bem mais revigorantes do que engendrar à pressa coligações, ainda por cima em moldes distintos de 2019 e sem a recomendável discussão interna. Não admira que, por agora, não gerem consenso, já que manifestamente viabilizam mais interesses pessoais do que bandeiras colectivas. Mais determinantes do que as percentagens obtidas por cada candidatura domingo passado serão as estratégias que cada partido vai implementar, para combater a abstenção recorde, para cativar o eleitorado jovem e para depurar a demagogia discursiva de que todos padecem.

Nenhum partido se mostrou realmente interessado em saber de que é feito e quem são, neste momento, os eleitores que o suportam. Mesmo com resultados na mão, todos partem de suposições, de especulações e ainda do princípio que as eleições se ganham ao centro, mesmo que esse espaço não seja ocupado por uma tribo permanente e com ideologia definida. Uma contabilidade que nem sempre bate certo para os mais familiarizados com essa equação vencedora. Basta haver sondagens que deixaram de ser retratos para serem ‘influencers’. Basta haver dispersão de votos à direita ou à esquerda. Basta haver quem faça campanhas inteligentes, aposte em gente qualificada e adopte fórmulas que gerem empatia.

Mais do que maiorias, geringonças, caranguejolas ou arroz de lapas, o que os madeirenses deviam querer saber é se há ideias mobilizadoras para serem sufragadas em 2023. Cabe-lhes decidir, e não a nenhuma central de comando, quem querem ter na Assembleia Legislativa e no Governo. Se os mesmos de sempre, com os resultados de todos conhecidos, ou gente desconhecida, alguma com perigosos cadastros, passíveis de revelação se houver tentativa de salto para a linha da frente. Se os novos quadros, competentes e arrojados, ou os experimentados com currículo e barriga cheia sem pachorra para fazer diferente. Se os que pararam no tempo ou os que acompanharam a evolução demográfica e do tecido social. Se os que têm estratégia para dotar a ultraperiferia de mundo ou os que esbanjam oportunidades de afirmação na aldeia global. Se os líderes que têm medo da sombra ou os que fazem tudo para não deixar ninguém para trás. Se partidos que andam na rua e conhecem os dramas de cada cidadão ou os que se especializaram em comissões parlamentares ou em reuniões de condomínio, mas andam a leste da realidade. Se os que se dedicam a roteiros inovadores ou os que percorrem os sítios do costume, sobretudo o virtuoso triângulo Rua Fernão Ornelas-Mercado dos Lavradores-Alfândega Velha. Se os que seduzem os jovens com propostas de participação e de envolvimento ou os que os remetem para as plateias dos aplausos aos notáveis. Se os que têm as soluções mais exequíveis para resolver problemas e pactos com parceiros que promovam a melhoria da qualidade de vida ou os que tudo fazem para manter a miséria, de modo a que não percam trabalho, importância e influência social.

Todos temos tempo suficiente para avaliar e validar propostas. Mas convém ir pensado naquilo que é decisivo.