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Sindicatos de enfermeiros vão refletir se mantêm greve na próxima semana

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FOTO MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Os sete sindicatos de enfermeiros, ontem reunidos numa concentração em frente ao parlamento que juntou cerca de 200 profissionais, vão analisar se mantêm a greve marcada para a próxima semana, uma vez que o Orçamento do Estado foi 'chumbado'.

A informação foi avançada à agência Lusa pelo presidente do Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor), Carlos Ramalho, na concentração, na qual os enfermeiros reclamaram justiça e respeito.

"Esta manifestação já estava prevista, entretanto, as coisas que aconteceram nos últimos tempos [o 'chumbo' do Orçamento do Estado para 2022 e a provável dissolução da Assembleia da República] vão obrigar-nos a refletir se a greve marcada para 03 e 04 de novembro "se vai manter ou não, e se todos os sindicatos vão estar de acordo".

"Uma coisa é certa o protesto vai-se manter independentemente da situação política e social do país", vincou o presidente do Sindepor, que saudou a união de todos os sindicatos que representam os enfermeiros nesta luta.

Os sindicatos e os manifestantes presentes no protesto exigiram, entre outras medidas, a contratação dos enfermeiros em situação precária, uma avaliação de desempenho adequada à profissão, a correção dos problemas relativos à contagem de pontos.

Estas reivindicações ficaram bem patentes nas palavras de ordem entoadas pelos manifestantes como "enfermeiros unidos jamais serão vencidos", "união", "respeito" e nos cartazes que ostentavam.

Durante uns minutos, sentaram-se no chão em círculo a gritar repetidamente "exaustão" e a pedir "respeito".

Enfermeira no Centro Hospitalar Universitário do Porto, Ana Gomes disse à Lusa que fez questão de participar no protesto porque os enfermeiros há mais de 20 anos que reivindicam os seus direitos e não têm qualquer resposta do Governo.

"A enfermagem é a maior classe dentro do SNS, mas parece o parente pobre, nunca ninguém vê os enfermeiros como um investimento", lamentou.

A exercer há 16 anos, Ana Gomes disse não compreender que um colega que entre agora e que tenha ajudado a formar ganhe o mesmo ordenado, além de que para chegar ao fim da carreira terá de trabalhar 100 anos, se o atual sistema de avaliação se mantiver.

"Se continuarmos assim não há quem queira vir para a enfermagem porque infelizmente não é uma carreira que alicie as pessoas", rematou.

Enfermeiro-chefe do IPO de Lisboa, Carlos Pires contou "a história" que o levou a estar presente no protesto: "É para manifestar a total indignação pela forma como temos sido tratados e a burla que o Ministério da Saúde tem feito relativamente a enfermeiros".

Quando no início do ano "havia ambulâncias paradas em todas as urgências dos hospitais" devido à covid-19, Carlos Pires decidiu responder ao apelo da ministra da Saúde para que os profissionais de saúde fizessem um esforço além do seu horário de trabalho.

"Apesar de ter 56 anos, uma incapacidade de atestado multiusos superior a 60% acabei por ir trabalhar para a urgência do Hospital de Santa Maria [Lisboa] a tentar ajudar a crise que estava instalada nas urgências", adiantou.

Iniciou o trabalho em fevereiro e não foi pago no final do mês, o que também aconteceu em março.

"Quando chego a abril recebo algum dinheiro referente a fevereiro e março que não tem nada a ver com o que estava contratado, mas não me pagaram abril, maio e junho", disse, contando que decidiu terminar as funções.

"Até hoje ainda não me pagaram porque IPO tem uma interpretação da lei, o Santa Maria tem outra interpretação da lei. A única solução é ir para tribunal, mas o que tenho para receber é inferior ao que terei de pagar ao advogado", lamentou.

Carlos Sousa, enfermeiro na Unidade de Transplantes de Medula do IPO do Porto também se manifestou indignado com a forma como a classe é tratada.

"O país precisa de mais enfermeiros, as pessoas para estarem seguras nos hospitais os rácios têm que ser cumpridos, os enfermeiros não podem andar a correr, sem ter tempo de ir à casa de banho, sem ter tempo de comer e de pensar convenientemente", alertou.

Devido a esta situação, disse, "as pessoas podem ficar em risco e nós queremos primariamente ajudar as pessoas, as pessoas têm que perceber isso", disse Carlos Sousa, que exerce a profissão há quase 20 anos e ainda está no escalão base de enfermagem.

"As nossas queixas são muitas e variadas, há imensas irregularidades e injustiças na nossa profissão que se vão multiplicando à medida que vão saindo medidas que são completamente avulsas e que não resolvem na sua base os problemas que a nossa profissão tem", lamentou Carlos Sousa.