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Longa vida à Democracia

Passada quase uma semana sobre a data dos resultados eleitorais faço aqui uma análise serena à campanha – na qual não participei profissionalmente. Escrevo como cidadão e faço-o, confesso, menos preocupado com os resultados do que com o conteúdo da campanha.

Deixem-se de conversas sobre putativos perigos e vencedores de lugares de honra. A Democracia venceu. 76,6% dos portugueses escolheu o voto democrático (Marcelo, Ana Gomes e Mayan Gonçalves),11,9% escolheu o extremismo populista de André Ventura, 8,2% escolheu a extrema esquerda de Ferreira e de Marisa e 2,9% fizeram uma “opção política” respeitável e escolheram Vitorino Silva. Marcelo Rebelo de Sousa ganhou as eleições em toda a linha. Reforçou-se, embora não tenha cumprido o sonho de suplantar Mário Soares como o mais amado, mas sai em glória e entra bem no discurso de vitória. Assim cumpra o que deu a entender que iria fazer. Ana Gomes teve, como disse o secretário-geral do PS, os votos daqueles militantes do PS que não conseguiram votar em Marcelo e viram nela um mal menor. Qualquer outro bom candidato do PS teria, pelo menos os mesmos votos. Ventura Capitalizou a cristalização do PCP no Alentejo, a inexistência política de outra força de direita no país – o CDS sumiu a nível nacional – e Mayan Gonçalves foi o garante do segundo lugar de Ana Gomes, ao juntar à volta da Iniciativa Liberal um conjunto de gente que, cansada de Marcelo, vota pela democracia civilizada e não alinha em modas xenófobas, racistas, homofóbicas, antes se preocupando com uma forma de desenvolver o país e dar futuro aos portugueses. Achei-o um mau candidato, mas teve coragem, deu a cara e a IL saiu reforçada. Dos outros não reza a história. Ficará João Ferreira até se saber se conseguiu com os fretes que fez garantir o lugar de Jerónimo. Esforçou-se. Vale bem mais do que demonstrou.

Sobre a Madeira, duas ou três notas, apenas para os mais distraídos. Abstenção menor que a nível nacional. Marcelo com mais percentagem de votos do que na média nacional. André Ventura, embora com o seu terceiro pior resultado no País, a ficar em segundo lugar, e Ana Gomes em terceiro porque, como diria um ilustre madeirense, nem com Iglésias a saltitar consigo conseguiu ultrapassar os sorrisos de Cafôfo a Marcelo ou o estender do tapete do Presidente da Câmara do Funchal a Marisa. Creio que a democracia ganhou bem. Mayan Gonçalves não teve a votação que pensei, mas porque Marcelo foi mais forte.

Gostei da organização de debates em todas as televisões dando oportunidades iguais a todos. Nisto da separação de poderes e da democracia é sempre bom que não sejam os jornalistas a decidir quem debate ou não debate e não sejam as audiências a determinar a nossa escolha. Grande decisão das várias estações de televisão. E em pandemia foi a escolha mais acertada, até por que, com a honrosa excepção de Vitorino Silva, nenhum candidato se comportou como devia em matéria de confinamento. O número de debates foi excelente. O conteúdo dos mesmos muito fraco. Melhores ou piores prestações como moderadores, mas as perguntas, os temas, que dor!

Qual a função de um presidente e, logo, quais os temas a tratar em debates sobre as eleições presidenciais? Falou-se de grandes questões como ambiente, desenvolvimento sustentável, saúde, educação, continuidade territorial, o mar, regiões autónomas, descentralização, regionalização, etc.? Falou-se de União Europeia, das relações com os EUA, China, Índia, Países Árabes, CPLP, etc. Nem uma vírgula! E vi os debates todos. Até aqueles que faziam lembrar solteiros contra casados. E a culpa não foi só dos candidatos. Foi, também, dos moderadores. De quem pensou o conteúdo dos debates. Construíram-se os cenários com intenções diversas, do género como deitar abaixo o Ventura e só o reforçaram. Discutiram-se, exclusivamente, factos do dia-a-dia: o covid, os mortos, os infectados, as escolas as gaffes dos ministros que o primeiro-ministro não demite, Ana Gomes mentiu vezes sem conta sobre situações que ela mesma cria para ter de que falar, Ventura trouxe os seus ciganos de estimação, enfim … no debate a democracia esteve mais pobre. Viva a democracia!

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