Coronavírus Madeira

Governo incorre em mais desenquadramentos legais

Ricardo Vieira diz que incumprimento do confinamento já constitui hoje crime de desobediência

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Foto Arquivo

Ricardo Vieira não foi surpreendido pela decisão da juíza Susana Mão de Ferro de não levar a julgamento a mulher que furou o confinamento obrigatório em Abril na Madeira e antecipa que outros problemas legais poderão ser enfrentados pelo Governo Regional no futuro precisamente devido à falta de enquadramento legal de algumas medidas. Em relação ao incumprimento referido, se fosse hoje o desfecho seria outro, acredita o advogado.

Neste momento a questão da desobediência, que faz manchete na edição desta quarta-feira do DIÁRIO, está um pouco mais resolvida, pois o Presidente da República no último decreto presidencial do estado de emergência referiu um conjunto de medidas possíveis de ser decretadas pelo governo e num dos artigos diz explicitamente que quem não obedecer está a cometer o crime de desobediência, explicou Ricardo Vieira. O problema, sublinha, é que para ser crime tem de estar expressamente previsto na lei.

“Lei é lei, não é resolução do governo. E mais, essa lei é de órgãos de soberania, não pode ser lei regional.”

A definição de crimes é competência da Assembleia da República. Como foi no âmbito do estado de emergência, Marcelo Rebelo de Sousa, no âmbito do seu cargo, acaba por ter também essa função.

Se fosse hoje o caso da senhora que furou o confinamento seria diferente. “Porque hoje é obrigatório andar de máscara e a lei já prevê isso abertamente e inclusive está previsto que quem não obedecer a ordem nesse sentido está a cometer o crime de desobediência, para além daquela contra-ordenação”, revela o advogado. Neste caso, era expectável. “Não me surpreendeu nada”.

Este caso vem juntar-se a outras situações em que a questão do enquadramento legal foi questionado. Ricardo Viera reconhece que esta situação de pandemia apanhou todos de surpresa, que ninguém estava preparado ou tinha conhecimento das medidas que podiam ou não tomar. “Mas houve aqui alguma imprevidência, talvez justificada pela velocidade dos acontecimentos, mas que devia ter sido melhor acautelada, melhor prevista, melhor regulamentada”.

No entender do advogado, a Assembleia Legislativa da Madeira (ALM) esteve aquém do que devia, envolveu-se pouco. “O papel da ALM aqui foi muito reduzido e só foi numa última fase”. Defende que deveria ter tido um papel activo desde início no sentido de criar os decretos legislativos para prever as contra-ordenações e acompanhar as decisões. “Os governos têm uma grande tendência para mostrar autoridade. O que é bom, a autoridade é uma coisa boa, num Estado é uma coisa fundamental. Mas a autoridade tem que ter regras, tem de ter formas, se não, ela resvala para o descrédito”, alertou.” Se calhar houve aqui um bocadinho de precipitação. Se calhar, não. Houve mesmo”, embora reconheça que houve a necessidade de conter a propagação. “Mas deveria ter sido feito com mais cuidado, com mais rigor, no fundo com mais credibilidade.”

Olhando para o presente, Ricardo Vieira diz que há muitas situações que ainda precisam de ser enquadradas legalmente para evitar más surpresas no futuro. “Muitas das coisas que estão em resolução do Governo e que não estão em decreto legislativo regional deviam estar”. E refere duas: a sujeição a segundo teste e as restrições à entrada de passageiros provenientes do Reino Unido. “Pode ter problemas amanhã. Em tribunal vem tudo ao de cima, conjuntando ter responsabilidades”.

Sobre o representante da República ser a entidade que executa o estado de emergência nas regiões autónomas, diz que é uma coisa “absolutamente desadequada” aos dias de hoje.

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