Unhas de gel: seguras ou não?
A União Europeia proibiu a substância TPO em vernizes de gel, por ser potencialmente cancerígena
Desde o início deste mês de Setembro que estão proibidos, na União Europeia, os produtos cosméticos, particularmente vernizes de gel, com a substância TPO (Trimethylbenzoyl Diphenylphosphine Oxide). O que é que isso significa para esta indústria e será este o único potencial perigo das unhas de gel?
A 8 de Julho passado, a Infarmed anunciou que, a partir de 1 de Setembro, a substância TPO seria proibida. De facto, desde o início do mês que vernizes de gel com esta substância deixaram de poder ser utilizados em Portugal, e na União Europeia em geral, uma vez que a directiva teve origem na Comissão Europeia.
O TPO é utilizado como foto-indicador. É o ingrediente que, quando em contacto com a luz UV ou LED, permite que o gel endureça, transformando o líquido numa camada sólida mais resistente. TPO que passou a integrar a lista de substâncias proibidas segundo o regulamento europeu dos cosméticos em Maio de 2025.
A Autoridade Nacional do Medicamente explicou que, de acordo com a lei europeia, não é permitido usar este ingrediente em cosméticos, uma vez que está classificado como um produto potencialmente cancerígeno, mutagénico ou tóxico para a reprodução (CMR 1B) pela Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA).
A proibição foi, então, preventiva. Em entrevista à SIC Notícias, a dermatologista Margarida Gonçalo, directora do Serviço de Dermatologia da ULS de Coimbra e professora na Universidade de Coimbra, explica que o “TPO no verniz gel é usado em pequenas quantidades e a possibilidade de penetração no organismo, sobretudo nos casos dos utilizadores é reduzida”.
Como já referido, estudos recentes indicavam que esta substância podia causar problemas de fertilidade e de malformações nos embriões. Conclusão chegada após serem realizados testes animais e em doses elevadas. “Não há qualquer evidência que estes efeitos sejam extensivos aos humanos. Contudo, por uma questão de precaução e segurança dos consumidores, o uso do TPO em cosméticos foi proibido em toda a União Europeia”, esclarece.
Aos profissionais deste sector, aconselha-se a que se certifiquem e a pedirem garantias relativamente aos produtos que compram. A marca deverá enviar certificados de qualidade e de garantia que os produtos que comercializam não contêm a substância potencialmente perigosa para a saúde, agora proibida. Existem alternativas para o TPO, no que concerne ao brilho e durabilidade das unhas de gel. Algumas marcas já lançaram linhas ‘TPO-free’ (livres de TPO).
Os clientes, para se certificarem de que a lei está a ser cumprida, podem pedir para ver o rótulo do produto, entes de este ser aplicado. Caso encontre Trimethylbenzoyl Diphenylphosphine Oxide na lista de ingredientes, não deve permitir que o produto seja utilizado, e deve notificar o Infarmed. Atenção que existem substâncias de nomes semelhantes que não são, até ao momento, consideradas perigosas e cuja utilização é permitida.
Um ingrediente entre muitos outros
A proibição da substância TPO levantou outras questões sobre a manicure com recurso a verniz de gel, que carece de ser endurecido num catalisador com lâmpadas LED. O TPO foi proibido, mas a dermatologista Margarida Gonçalo lembra que este é um entre uma lista com diversos ingredientes, neste tipo de vernizes.
Substâncias como os acrilatos (derivados de sais ou ésteres do ácido acrílico), amplamente utilizados em produtos cosméticos, são outro ingrediente que preocupa, uma vez que mais de 4% das mulheres descobrem, em consulta, que estão sensibilizadas a estas substâncias.
Um risco comum aos utilizadores e aos profissionais de estética ungueal é a alergia (dermatite de contacto alérgica) aos diversos acrilatos que compões o gel/verniz gel. Estes químicos causam reações na pele dos dedos das mãos que podem ficar vermelhos, com vesículas ou bolhas e muita comichão ou com a pele grossa e a descamar e com fissuras dolorosas, tornando difíceis algumas tarefas da via diária. Margarida Gonçalo, dermatologista
A especialista alerta que os acrilatos são usados em procedimentos dentários e ortopédicos e, quando um paciente desenvolve uma alergia pode, no futuro, não conseguir receber certos tratamentos ou próteses. A este, junta-se o risco de cancro cutâneo, provocado pela “exposição repetida e continuada à luz LED ou ultravioleta para polimerização/solidificação do gel”. Apesar dos dados científicos escassos, Margarida Gonçalo aponta uma longa lista de riscos associados ao uso de verniz de gel, independentemente da presença da substância agora proibida.
Nos utilizadores de unhas de gel/verniz gel podem ocorrer deformações das unhas, que podem ficar mais finas e quebradiças, ou mesmo com irregularidades inestéticas. Podem sofrer um processo chamado onicólise, em que a parte dura da unha se descola do leito e a unha fica parcial ou totalmente descolada do leito, o que se manifesta por uma cor amarelada da unha. Este defeito é difícil de tratar e pode demorar muito tempo (meses/anos) a recuperar completamente. Margarida Gonçalo, dermatologista
A médica considera, mesmo, “que estes procedimentos estéticos deveriam ser descontinuados ou, pelo menos, deveria haver mais informação sobre os riscos para os profissionais e consumidores”. Isto, tendo em conta “o elevado número de casos de alergia de contacto a estes produtos que nós observamos, tanto em Portugal como em toda a Europa, e que temos vindo a relatar em publicações científicas”, explica.
Maior risco para profissionais
Mais expostos do que os clientes, estão os profissionais desta área. Na prática, quem trabalha com vernizes ou vernizes de gel mantém um contacto diário e continuado com as substâncias químicas e, por isso, tem maior probabilidade de apresentar reacções como a dermatite de contacto alérgica, ou de ver outras alergias antigas agravadas.
Um estudo de 2019, publicado na Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional, dava conta de que, nesse ano, os profissionais desta área já representavam cerca de 80% dos testes de pele feitos para avaliar dermatite de contacto relacionada com o trabalho. Um cenário que se complica pela ausência de normas que regulem o sector e pela existência de profissionais “inexperientes com as técnicas de trabalho”.
Um alerta, ainda, para quem se tenta substituir aos profissionais com kits caseiros. É fácil encontrar à venda todos os materiais necessários para fazer unhas de gel em casa, desde os catalisadores com luz UV a um sem fim de vernizes de gel de todas as cores. Surge a dúvida, contudo, se estes produtos são certificados e cumprem as normas europeias, nomeadamente a recente proibição da substância TPO.