Reter Jovens, Reter Ciência
A retenção de talento científico é um dos principais desafios para o progresso da ciência, da tecnologia e da inovação em qualquer país. Portugal pode congratular-se por formar investigadores de excelência e de renome internacional; contudo, falhamos em oferecer-lhes condições para quererem, e poderem, construir carreira cá dentro. E este não é um problema isolado.
Na verdade, a “retenção de cérebros” está intrinsecamente ligada a uma questão mais ampla: a dificuldade em reter os nossos jovens. Reter jovens e reter talento científico são, a meu ver, duas faces da mesma moeda. Isto porque os jovens investigadores representam uma parcela significativa da população jovem qualificada e, portanto, enfrentam desafios semelhantes na decisão de permanecer ou de emigrar.
As consequências são mais do que sabidas. Cada jovem que parte não leva apenas os seus sonhos e as suas ambições. Leva consigo também uma fatia de todo o nosso potencial coletivo. E não só. Resulta num esvaziamento das salas de aula, dos laboratórios e, sobretudo, num enfraquecimento da massa crítica de estudantes e de investigadores que alimentam o nosso sistema científico e tecnológico nacional. Note o leitor que, segundo os dados mais recentes do Observatório da Emigração, aproximadamente 850 000 portugueses entre os 15 e os 39 anos, o que corresponde a cerca de 30% da população nesta faixa etária, reside atualmente fora de Portugal.
Reentrando no tema deste artigo de opinião, não significa isto que, ao resolvermos a complexa questão da retenção de jovens, estejamos também a resolver a questão da “fuga de cérebros”. A retenção de talento científico exige abordagens específicas que vão além das medidas gerais para manter os jovens no país. Isso inclui, por exemplo, elevar decisivamente o investimento em investigação e desenvolvimento, que permanece teimosamente nos 1,70 % do PIB, valor muito abaixo da média europeia de 2,22%. Sem músculo financeiro, as instituições de ensino superior e os centros de investigação não conseguem abrir posições permanentes, nem equipar laboratórios à altura da ambição dos nossos investigadores.
Acrescente-se a tudo isto a precariedade dos vínculos destes mesmos investigadores, com contratos a termo resolutivo certo ou incerto, a falta de acesso aos direitos sociais mais básicos, tais como subsídio de férias ou de desemprego. Enfim, poderia dedicar este artigo a listar as dificuldades enfrentadas pelos investigadores em Portugal que, em última instância, levam ao abandono da carreira científica ou à procura de oportunidades no estrangeiro.
Mas há sinais de esperança. Se o jovem leitor estiver a ponderar seguir uma carreira de investigação, saiba que a recente Lei n.º 55/2025, que aprova o novo Estatuto da Carreira de Investigação Científica, aponta na direção certa ao prever novas regras de remuneração e de vinculação mediante contrato de trabalho. Além disso, a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), por meio do seu novo programa FCT-Tenure, abriu a possibilidade de cofinanciamento para a contratação de 1 100 investigadores para a carreira.
Reter talentos científicos e, com eles, os nossos jovens, não é exercício de patriotismo; é investir no futuro coletivo. O dia em que um doutorado português deixe de sentir que, para avançar na sua carreira, tem de sair, será o dia em que Portugal terá cumprido o seu pacto intergeracional. Até lá, cada ponto decimal acrescentado ao orçamento da ciência, cada contrato precário convertido em contrato estável, será um passo sólido para reter, em território nacional, a engenhosidade e a criatividade essenciais ao nosso progresso, ao progresso do nosso país.
Finalmente, permitam-me sugerir que ouçam o episódio desta semana do podcast Peço a Palavra. Nele, além de apresentarmos a nova Licenciatura em Engenharia Física e Computacional da Universidade da Madeira, discutimos o futuro da ciência em Portugal com o Professor Pedro Almeida. O programa estará disponível na frequência da TSF 100 FM Madeira e também em formato podcast.