Quanto leva o Estado dos salários? Será metade?
O custo do salário é uma realidade para trabalhadores, mas sobretudo para as empresas. Mas perceber isso, mesmo com todas as mexidas no IRS que tem havido, permite constatar que o Estado é o principal beneficiário do trabalho
Enquanto o Estado ou, no caso da Madeira, a Região, não baixar o valor percentual que recebe pelo trabalho dos portugueses, dificilmente haverá ganhos salariais que, realmente, façam a diferença na vida das pessoas, das famílias.
Muito se tem falado disso, mas pouco ou nada tem mudado, uma vez que tanto o IRS, como os descontos para a Segurança Social no caso dos trabalhadores, ou a Taxa Social Única, no caso das empresas, continuam a sorver uma grande fatia dos salários, ficando os trabalhadores sem uma parte significativa do que ganham pelo que dão às empresas e ao próprio Estado, no caso dos funcionários públicos.
Mas, afinal, quanto pesa essa maquia percentual que acaba, em primeiro lugar, por garantir muitos milhões ao Estado directamente do bolso e dos cofres das empresas para as despesas públicas, como para garantir os fundos da Segurança Social para que, no futuro, não falte dinheiro aos reformados? Usamos o simulador 'PMESalarios', uma "ferramenta informática de gestão de salários a pensar nas pequenas e médias empresas"
Para um simples salário mínimo, que até tem crescido significativamente nos últimos anos, na última década - desde 2015, aumentou de 515 euros para os actuais 915 euros, ou seja subiu quase 78% -, 22 dias de trabalho custam descontos para a Segurança Social (11%) pouco mais de 100 euros e de IRS (10,1%) pouco mais de 92 euros. Ou seja, só o trabalhador tem de pagar 192 euros ao Estado por um salário que nem chega a mil euros. Na prática leva 721,94 euros para casa (remuneração líquida). E empresa? Paga 23,75% do montante bruto, ou seja além do salário paga 217,31 euros. Ou seja, por um valor global de 1.132,31 euros que a empresa despende pelo trabalhador a quem paga o salário mínimo, o Estado leva mais de um terço do valor, 36,2%. Neste caso, o trabalhador nem tem filhos, nem é casado.
Vamos aos outros casos mais complexos e com melhor remuneração. Um funcionário, casado com outra trabalhadora, com dois filhos dependentes, que tenha por salário base 1.807 euros (remuneração bruta total mensal média na RAM no final de 2024), pelos seus 22 dias de trabalho, o Estado leva 17,6%, num total de 318 euros, o trabalhador desconta 11% para a Segurança Social, que leva outros quase 199 euros e, além disso, a empresa tem de pagar a TSU (globalmente é 23,75% do salário bruto, para as entidades sem fins lucrativos, como as IPSS, esta taxa é de 22,3%) no valor de mais de 429 euros. No total, entre trabalhador e empresa, o Estado leva 946 euros, enquanto o trabalhador fica com quase 1.291 euros líquidos. Ou seja, por um custo do salário de 2.236 euros, o Estado leva 42,3%. Quer dizer que por cada 10 euros, o 'quinhão' é de 4 euros.
Como referido, quanto mais acima na tabela de rendimentos, mais o Estado cobra, num contributo das empresas e dos trabalhadores que é proporcional e, aparentemente, justo. No caso de uma pessoa que ganhe de salário base 2.500 euros, que já é bem acima da média, e sendo o casal titulares e com dois filhos, para a Segurança Social desconta 275 euros e para o IRS é retirado 590 euros (23,6%), sendo que a empresa paga já perto de 594 euros. No fundo, são 3.094 euros que paga a empresa. Mas se o trabalhador ainda leva para casa 1.635 euros desse total (já é mais de 50%), que dizer do Estado que embolsa 1.459 euros? Basicamente são 47,2%, já bem perto de metade.
Por fim, damos dois exemplos em um salário base de 3.000 euros. O primeiro caso é um casado (2 titulares) com 3 filhos dependentes, no qual o Estado leva 23,1% totalizando 693 euros de IRS, a Segurança Social leva 11% desse montante (330 euros) e a empresa ainda tem de colocar na TSU outros 712,5 euros. Isto totaliza despesas de 3.712,5 euros, dos quais o Estado fica com 1.735,5 euros, correspondendo a 46,7%, enquanto o trabalhador recebe na verdade 1.977 euros, pouco mais de metade. Se o mesmo trabalhador for casado (2 titulares) mas sem filhos, paga o mesmo para a Segurança Social (afinal está a descontar para a sua reforma), o mesmo acontecendo com a empresa, enquanto o IRS arrecadado é de 26,9%, ou seja 807 euros. Na prática, a um casal com 3 filhos é descontado somente 114 euros a menos do que o casal sem filhos. No fundo, o que importa é o que o Estado leva. Isto porque o trabalhador sem filhos leva apenas menos 114 euros (1.863 euros), que vão para os cofres do Estado, que recebe 1.849,5 euros, quase literalmente metade dessa fatia de 3.712,5 euros.