Tribunal europeu condena Polónia por decisão judicial que restringe o aborto
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) condenou hoje a Polónia por uma decisão do Tribunal Constitucional que restringe o aborto e que só entrou plenamente em vigor três meses após a sua publicação.
No seu acórdão, os juízes europeus consideraram que esta "situação de incerteza prolongada" constitui uma ingerência nos direitos da mulher que apresentou a queixa, identificada pelas iniciais A.R., que estava grávida na altura e que acabou por se dirigir aos Países Baixos para realizar o aborto após ter sido detetada uma anomalia genética no feto.
O TEDH salientou que esta situação configura uma violação do artigo oitavo da Convenção Europeia dos Direitos Humanos que garante o direito ao respeito da vida privada e familiar.
Em outubro de 2020, o Tribunal Constitucional polaco declarou inconstitucional o aborto em casos de malformação do feto.
No entanto, este acórdão só foi publicado em 27 de janeiro de 2021 e só então produziu efeitos jurídicos.
O tribunal sediado em Estrasburgo considerou que "a ingerência nos direitos da recorrente resultou da situação de grande incerteza que se verificou no período entre o acórdão do Tribunal Constitucional, proferido em 2020, e a sua publicação, em 2021".
O TEDH insiste que a violação dos direitos de A. R. explica-se pela "situação prolongada de grande incerteza quanto à legislação aplicável e à autorização do aborto por anomalias fetais".
"O requisito da previsibilidade", acrescenta, "reveste-se de particular importância quando se restringe um direito anteriormente disponível no direito interno".
O TEDH observa que os acórdãos produzem efeitos a partir do momento da sua publicação, que é geralmente imediata. Embora possa fixar uma data posterior para que uma lei que declara inconstitucional deixe de ser aplicada, neste caso não o fez.
Além disso, os juízes europeus recordam que a decisão provocou grandes protestos na Polónia, o que "só aumentou a incerteza" sobre possíveis alterações ao quadro legislativo sobre o aborto.
Em suma, o tribunal define que "era difícil saber se as restrições à prática do aborto por anomalias fetais já estavam em vigor ou se o aborto ainda podia ser efetuado legalmente".
A Polónia terá de pagar à requerente 1.495 euros por danos materiais e 15.000 euros por danos morais.