O preço do “jeitinho”

Em Portugal, todos sabemos que a corrupção existe. Não é preciso grandes investigações para o perceber – basta abrir o jornal, ouvir as notícias ou prestar atenção às conversas de café. A corrupção, entre nós, não é apenas um problema jurídico. É, sobretudo, um problema cultural.

Crescemos a ouvir frases como “quem tem amigos não morre na cadeia” ou “é preciso ter cunhas para conseguir alguma coisa na vida”. O famoso jeitinho português — que às vezes parece inofensivo – é, muitas vezes, a semente de um sistema onde o mérito é substituído pelo favor e onde quem ousa jogar limpo é tratado como ingénuo.

A corrupção, a mais perigosa, raramente se vê. Não são só malas de dinheiro nem negócios escuros. É a nomeação do amigo do amigo para um cargo público. É o contrato adjudicado sem se saber bem porquê. É o silêncio cúmplice de quem sabe, mas prefere não se meter. Porque quem denuncia arrisca-se a ser o próximo a cair em desgraça.

O pior não é sabermos que há corrupção. O pior é já nem nos surpreendermos. Rimos das trapalhadas, comentamos com ironia, indignamo-nos durante uns minutos — e depois seguimos em frente. Tornámo-nos espectadores cansados de um espetáculo repetido. Até ao dia em que a corrupção nos toca diretamente. Aí percebemos que ela não é um problema dos outros – é nosso. Porque mina a confiança, destrói oportunidades e empobrece o país, não só no bolso, mas no espírito.

Mas nem tudo está perdido. Há sempre quem recuse o jogo, quem exija mais do que o mínimo, quem não aceite o “é assim mesmo”. O primeiro passo é não nos resignarmos. O segundo é termos memória. E o terceiro – talvez o mais difícil – é entendermos que a mudança não virá apenas de cima. Começa em cada um de nós, nas pequenas escolhas do dia-a-dia, no simples gesto de dizer: não, assim não.

Talvez o verdadeiro antídoto para a corrupção não seja uma nova lei, um partido que diz que denuncia e combate, mas uma nova consciência.

José Augusto de Sousa Martins