Tribunal de Contas envia para o MP conclusões sobre caso da visita de Albuquerque e comitiva ao Curaçau e Venezuela
A Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas (TdC) acaba de divulgar as conclusões da denúncia apresentada pelo grupo parlamentar Juntos Pelo Povo (JPP), em 2023, sobre a visita oficial do presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque, à Venezuela e Curaçau, ocorrida entre 9 e 18 de Outubro de 2022.
Em traços gerais, o TdC aponta ao Governo Regional diversas irregularidades na gestão de recursos públicos associados à viagem, desde a inclusão de acompanhantes sem justificativa legal até problemas nos procedimentos de contratação.
Um dos pontos de crítica foi a inclusão da companheira do presidente da Região na viagem, justificando-se com um convite para ambos visitarem a Venezuela. Embora a Lei n.º 40/2006 permita o uso de recursos públicos para cobrir despesas de cônjuges ou companheiros de altos cargos em determinadas circunstâncias, o Tribunal destacou que essa justificativa foi utilizada apenas para a visita à Venezuela (13 a 16 de Outubro), sem que houvesse qualquer explicação para a viagem prévia a Curaçau, o que, segundo o Tribunal, “parece ilegal”.
Outro aspecto que chamou a atenção do Tribunal foi a presença de uma comitiva com sete jornalistas (1 do DIÁRIO, 2 do JM, 2 da RTP/RDP e 2 do canal naminhaterra) e 3 músicos, cujo objectivo seria garantir uma “cobertura jornalística correcta e plural” e apoiar a programação festiva após a inauguração de um santuário na Venezuela. No entanto, o Tribunal considerou essa explicação “vaga” e insuficiente para justificar a inclusão dessas pessoas na viagem, levantando dúvidas sobre a legalidade do procedimento.
O relatório do TdC também identificou falhas no processo de selecção das empresas responsáveis pela organização da viagem. Diz o TC, após a consulta ao Registo Nacional das Agências de Viagens e Turismo, foi possível apurar que só a empresa ‘Gustavo & Andreia 2 - Agência de Viagens e Turismo, Lda. (Intertours)’ é que estava habilitada ao exercício da actividade das agências de viagens e turismo, sendo que as outras duas entidades convidadas pelo Governo Regional a apresentar propostas (Rameventos e Press Power) não estavam habilitadas a prestar os serviços que a Presidência pretendia adquirir. Quem acabou por prestar os serviços foi a Rameventos (à época detida pelos sócios EDN e EJM, tendo sido esta última a liderar o processo da viagem à Venezuela).
Além disso, o TdC diz que foi fixado um prazo de apenas 24 horas para a apresentação de propostas, o que o tribunal considerou excessivamente curto e prejudicial à concorrência. Segundo a legislação em vigor, o prazo normal deveria ser de pelo menos nove dias.
O Tribunal também criticou o facto de apenas uma proposta ter sido apresentada, a qual, além de incompleta, foi considerada válida sem uma análise mais rigorosa. Isso representou, segundo a entidade, uma falta de abertura à competitividade, infringindo as normas estabelecidas pelo Código dos Contratos Públicos (CCP).
Outro problema apontado foi a emissão de passagens aéreas antes mesmo do lançamento do procedimento de contratação. A Presidência do Governo justificou essa antecipação com base em alertas sobre a escassez de voos e a subida dos preços devido à pandemia da covid-19 e à situação sociopolítica na Venezuela. No entanto, o Tribunal ressaltou que essa prática viola os princípios da transparência e não discriminação previstos nas regras de contratação pública.
Ao longo do relatório, o TdC enfatizou que as consultas preliminares informais realizadas para preparar o procedimento de contratação não devem comprometer a concorrência. Além disso, o Tribunal destacou que não foram fornecidas informações detalhadas sobre quais empresas foram consultadas previamente para organizar a viagem, o que compromete a transparência do processo.
Outro ponto levantado foi a ausência de retroactividade nas passagens aéreas emitidas antes da abertura do procedimento, uma prática que o Tribunal considerou contrária ao artigo 287.º do CCP. Ainda que os custos não tivessem ultrapassado os limites do ajuste directo, o TdC frisou que o valor total do contrato deve reflectir o benefício económico que a empresa adjudicatária poderá obter, conforme previsto na lei.
O Tribunal concluiu que a viagem poderia ter sido organizada pela Presidência do Governo com maior antecedência, permitindo uma contratação mais eficiente e dentro das normas, evitando a emissão prematura de passagens e assegurando o cumprimento dos princípios da eficiência e da transparência na gestão pública.
Por fim, a Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas decidiu concluir o processo de denúncia e indicou que poderá realizar uma auditoria em 2026 ou 2027 para avaliar as questões levantadas na denúncia. Além disso, determinou a inserção da decisão no dossier permanente da Presidência do Governo Regional, a notificação do denunciante e da entidade denunciada, bem como a comunicação dos resultados ao Ministério Público.
Albuquerque rejeita qualquer "falcatrua" na visita oficial à Venezuela
O presidente do Governo da Madeira, Miguel Albuquerque, rejeitou hoje que tenha havido qualquer "falcatrua" relativamente à viagem oficial que realizou em outubro do ano passado à Venezuela e ao Curaçau.