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Os espectros de Montenegro

O PSD vive momentos estranhos, algo já sabido entre as lides do partido e além essas fronteiras ideológicas. A Direita, fraturada como nunca, vive um clima de passivo-agressividade grande o suficiente para deixar qualquer um assustado com o que paira pelo ar.

Montenegro, para já, é o manda-chuva, mas um manda-chuva sem grande pressão, é mais uma pequena torneira que lá vai vertendo água. Talvez porque está a ser entupido, ou por se estar a entupir a si mesmo. Então, quem entope Montenegro? A pergunta que vale europeias e lideranças de partido (possivelmente). A resposta é simples e, ao mesmo tempo, não é. Vamos por partes: Num momento crucial de contestação à maioria do Partido Socialista, as eleições regionais da Madeira e as consequentes europeias chegam como um barómetro importante para perceber a vontade dos portugueses em relação à situação atual da governação do país.

Nesta fase delicada para o futuro do PSD, Montenegro é assombrado pelo fantasma do Natal passado, Pedro Passos Coelho, e pelo fantasma do Natal presente, André Ventura. Os leitores podem queixar-se da ausência do fantasma do Natal futuro nesta alusão barata ao conto de Natal de Charles Dickens, mas é aí que esclareço: o fantasma do Natal futuro não é, nada mais, nada menos que os resultados das futuras eleições em si.

É inegável que Montenegro tem tido uma tremenda dificuldade em se distanciar do Chega e do seu líder autocrata André Ventura, naquilo que tem sido o rumo recente do partido. A incapacidade do PSD em clarificar a sua posição em relação ao partido de extrema-direita, alicerçado em demagogias e cultos de personalidade fotocopiados de forma exemplar a líderes como Trump e Bolsonaro, deixa no ar uma enorme falta de clarividência e liderança naquele que é, até então, o principal partido da oposição.

Por outro lado, volta um ex-líder aos palcos mediáticos: Pedro Passos Coelho. De entre as cinzas como uma bela fénix calva a voar até às nossas televisões e jornais, rejuvenesce um ativo político que parecia extinto, mas que, na verdade, estava somente adormecido. Embora Montenegro o encare como uma mais-valia para o partido (acredite ou não naquilo que está a dizer), a verdade é que a sua presença gera dissonância. Ora vejamos, as aparições de Passos são motivo de barulho entre os média e uma força dissuasora da presença política de Montenegro, como foi demonstrado num recente evento em que Montenegro não compareceu por “motivos de agenda” em que Passos marcara presença.

É importante não esquecer também as recentes declarações do ex-líder do PSD em relação à Eutanásia, em que se manifesta claramente contra – demonstrando aquela belíssima veia conservadora e que entra em colisão com os ideais de Montenegro. Talvez não sejam tão unha e carne como querem transparecer.

A verdade é que Passos é um ‘wild card’, ninguém sabe verdadeiramente o que pode eclodir desta sua recente reaparição: uma candidatura à presidência da República? Uma longa e paciente espera pela liderança do partido? Quem sabe?

Ainda existe um outro jogador que não deve ser esquecido, de seu nome, Marcelo Rebelo de Sousa. O presidente da República não escondeu que não morre de afetos por Passos, da mesma forma que não esconde os desamores por Ventura. Gera-se assim uma intriga digna de uma novela mexicana, com amores, calculismos e dinâmicas de poder que ocupam a agenda mediática.

Sejam fantasmas ou novelas, ou fantasmas em novelas, uma coisa é certa, se calhar já era tempo do PSD arrumar a casa e de ter uma posição mais firme em relação às possíveis amizades com a extrema-direita. Ou até simplesmente chamar os caça-fantasmas. Eles ao menos pareciam saber lidar minimamente com atividades par(anormais).