Madeira

Sérgio Marques denuncia “obras inventadas” na Madeira

Deputado do PSD-M faz ajuste de contas com o passado em declarações ao DN-Lisboa deste domingo

Sérgio Marques é actualmente um dos deputados eleitos pelo PSD-M à Assembleia da República.
Sérgio Marques é actualmente um dos deputados eleitos pelo PSD-M à Assembleia da República.

Parlamentar na Assembleia da República critica quem o afastou do Governo Regional

O Diário de Notícias de Lisboa (DN-Lisboa) publica este domingo, a propósito do ano de eleições Regionais, um trabalho especial de quatro páginas sobre a Madeira, traçando uma história já conhecida na Região de 47 anos do poder do PSD na Região, onde surgem declarações de vários protagonistas, de Jardim a Albuquerque, passando pela oposição como Sérgio Gonçalves (líder do PS-Madeira) e o governante socialista na República, Paulo Cafôfo.

Mas nesta reportagem destacam-se sobretudo as ferozes críticas à actuação do PSD-M, a figuras do partido e ainda a grupos económicos na Região, feitas por Sérgio Marques, actual deputado social-democrata madeirense em São Bento que, há poucos dias, surgiu como um dos cinco madeirenses, a par de Albuquerque, Calado, Sara Madruga da Costa e Patrícia Dantas, na lista dos ‘30 mais ricos’ no ranking global do País a partir das declarações entregues no Tribunal Constitucional.

Revista Sábado coloca 5 madeirenses entre políticos mais ricos do país

A principal reportagem da edição de hoje da revista Sábado faz a lista dos “políticos mais ricos do país”, a partir das declarações que os membros do Governo, deputados e autarcas são obrigados a entregar no Tribunal Constitucional. Cinco madeirenses figuram na lista dos “30 mais ricos” no ranking global, que soma e compara o património imobiliário, as participações sociais em empresas, as contas e os activos financeiros de 328 políticos que cumpriram as suas declarações legais.

Sérgio Marques começa por responder ao DN-Lisboa afirmando que, “neste momento”, a sua relação com Alberto João Jardim “não é a melhor”, e diz ser claro que o histórico líder do partido “foi a chave enquanto agente político e o PSD beneficiou muito da liderança dele”. “Esta longa permanência no poder vem muito por autoria de Jardim, que soube criar uma cultura de poder. Um partido muito unido, muito mobilizado, um partido quase feito à imagem de um exército, de uma força armada, com muito pouco espaço para dissidentes”.

Hoje, assegura Sérgio Marques, Jardim “continua a condicionar muito a vida política do partido”. “E muito com a ajuda dos grupos económicos que ele ajudou a formar para condicionar o PSD e a governação […]. O Jardim ainda tem como grande motivação, é a minha impressão, em vida dele, ter uma acção importante no afastamento do Miguel [Albuquerque] da presidência do governo”, adianta.

Depois, à semelhança de Miguel de Sousa, que neste trabalho do DN-Lisboa aponta a Alberto João um esbanjar de recursos financeiros que a Madeira não tinha, Sérgio Marques separa a governação de Jardim em dois momentos: antes de 2000 e depois de 2000. Antes “foi fantástica , respondeu a tudo o que a Madeira precisava. Foi decisiva”; depois “foi um ‘déjà vu’. E a dada altura começaram a inventar-se obras, quis-se continuar no mesmo esquema de governo, a mesma linha. Obras sem necessidade, aquela lógica das sociedades de desenvolvimento, todo aquele investimento louco que foi feito pelas Sociedades de Desenvolvimento”.

O antigo deputado na Assembleia Legislativa (1984 a 1999), eurodeputado (1999 a 2009) e secretário regional, entre 2015 e 2017, no primeiro governo de Miguel Albuquerque, critica João Cunha e Silva, antigo vice-presidente do Governo Regional de Alberto João Jardim: “O vice do Jardim, o meu colega Cunha e Silva, acabou por fazer com que muitos vícios, muitas coisas menos boas, tivessem ocorrido”. E deixa ainda reparos a uma outra figura do passado: “E depois a influência do Jaime Ramos [empresário e antigo secretário-geral do PSD Madeira]... o crescimento dos grupos económicos”.

O DN-Lisboa ouviu João Cunha e Silva, vice-presidente do governo regional de 2000 a 2015 - saiu a meio do mandato na que foi a quarta remodelação no governo -, que foi claro quando confrontado com as críticas de Sérgio Marques: “Não me arrependo nada do percurso que fiz. Pode ter havido um degrau ou outro em que eu talvez devesse ter saltado, mas isso são particularidades. No geral, não me arrependo do percurso político que tive, que não foi só regional, foi nacional também.”

E lembrando que “as inimizades estão mais dentro dos nossos próprios partidos do que nos adversários” e que “às vezes há uns inimigos que são capazes de maldades para atingir os seus objectivos”, sublinha uma ideia: “As pessoas que fazem muita coisa sujeitam-se à crítica pelo que estão fazendo. E há outra coisa: podem fazer 100 coisas boas, se fazem uma má, é dessa que se fala e as outras são esquecidas.”

“O que me faz imensa confusão”, acrescenta, “é a gente que passa pelos lugares e se limita à gestão, e até pode ser uma gestão competente, mas que não é atrevida, não vai para a frente, não dá a cara, não concretiza coisas. Esse ninguém critica, ‘tá tudo bem’”. Numa frase: “Só atiram pedras às árvores que dão fruto. Quando não dão fruta, não jogam pedras.”

Voltando a Sérgio Marques, o antigo secretário regional, entre 2015 e 2017, no primeiro governo de Miguel Albuquerque, volta ao ataque e afirma ao DN-Lisboa: “O problema é que esta governação social-democrata acabou por levar a que se afirmassem quatro ou cinco grupos económicos, que acabaram por acumular muito poder: Sousa, Avelino, Pestana, Trindade e Trindade/Blandy. E principalmente dois grupos […], o Luís Miguel [Sousa], com quem eu trabalhei oito anos, e o Avelino [Farinha] acho que foram os mais beneficiados da governação regional”.

Foram, diz o antigo secretário regional ao DN-Lisboa, “muito protegidos”. “Grupos que cresceram muito à conta dos negócios com a Região. E depois o que é certo é que acumularam, uns e outros, muito poder e a dada altura começaram a condicionar a governação.” E isso, assegura, “sentiu-se, e tanto que a dada altura foi um dos grandes argumentos do PS contra o PSD. Foi dizer que o PSD estava aprisionado pelos interesses dos grupos. Isso pesou tanto assim que os grupos viram-se na necessidade de controlar os media regionais”.

Sérgio Marques vai mais longe nas afirmações ao DN-Lisboa, numa espécie de ajuste de contas com o passado: “Quando houve a remodelação do governo [de Miguel Albuquerque], quando eu deixo o governo, houve ali muito dedo do Jardim. O Jardim jogou as suas peças e pôs o Avelino [grupo AFA] e o Sousa [grupo Sousa] em campo. O [Luís Miguel] Sousa consegue afastar o Eduardo Jesus porque o Eduardo Jesus [secretário regional] tinha uma agenda para reformular o porto. O Avelino [Farinha] não estava satisfeito com o meu desempenho nas obras públicas, porque eu é que era o secretário das Obras Públicas, e ele sempre se habituou a ter um secretário que o servisse. Comigo isso não acontecia […], o Avelino depois consegue afastar-me das obras públicas. Ele não queria que eu saísse do governo, ele queria era só afastar-me das obras públicas”.

Entretanto, neste trabalho especial e contactado pelo DN-Lisboa sobre as críticas de Sérgio Marques, Avelino Farinha entendeu não responder às questões colocadas pelo jornal nacional.

Já Luís Miguel Sousa, contactado pelo DN-Lisboa, afirma: “Isso é um absurdo. O meu amigo Sérgio [Marques] sempre teve a mania da perseguição e sempre adorou o papel de vítima”, considerou ainda o empresário.

Alberto João Jardim teve uma palavra como resposta às acusações de “dependência”, “intromissão” e de “condicionamentos” da governação: “Lérias!”.

"Nunca, em momento algum, afastou ninguém do seu governo por sugestão de empresários?". À questão do DN-Lisboa, Miguel Albuquerque é directo: "Não. As mudanças que eu fiz no governo foram mudanças políticas. Nunca por razões de pressão".

Declarações que beliscam também as opções governativas de Miguel Albuquerque e que vão dar que falar seguramente nos próximos tempos.

Pode ler a notícia na íntegra na edição de hoje do DN-Lisboa:

Madeira. Os ″gajos″ que tramaram Jardim, os milhões de obras ″inventadas″ e os governantes ″afastados″ por empresários

O "sucesso" de 47 anos de poder, as habilidades do "mestre", as obras e o "esbanjar de dinheiros", as desavenças e os "sacanas", o "poder" dos empresários e a certeza de Jardim: "Só perderam depois de eu sair." O retrato da região por 14 protagonistas da governação e da oposição. Domingo, no próximo artigo: "Os erros e falhanços do PS, os medos e as eleições "condicionadas" e o eterno braço de ferro pela bandeira da autonomia".