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Masterclass: uma janela de e para o mundo

O leitor podia ter encontrado este termo em variadíssimos contextos, mas o significado sempre se reduz a um processo pedagógico em que alguém com o particularmente aprofundado conhecimento da sua área transmite esse conhecimento a um discente que tem o desejo específico de receber este conhecimento num contexto privilegiado e muitas vezes individual.

Seja isso um “curso de aperfeiçoamento”, um “workshop” ou um “seminário”, desde 1884 a instituição de “masterclass”, além duma transmissão simples dos saberes, representa frequentemente uma iniciativa de introduzir pontos de vista alternativos e até divergentes, de espoletar a interação enriquecedora e impulsionar o desenvolvimento pessoal e profissional.

A palavra é sobretudo utilizada nas artes, sendo que a instituição de ensino individual, característica para a pedagogia artística, é alargada, num contexto da masterclass, para um grupo relativamente restrito de presentes, os quais, no fundo, estão a testemunhar o decorrer duma aula individual, com a mais-valia duma possível interação com o grupo e a exposição e explicação dos assuntos específicos abordados na aula.

Efetivamente, nas artes a instituição de “masterclass”, embora sem ter sido identificada especificamente por esse termo, existia há já uns 30 anos antes da primeira “masterclass” assim chamada. Foi o grande pianista e pedagogo Franz Liszt que começou a ensinar deste modo, no meio dum grupo de jovens talentos de vários países, nos meados dos anos 50 do século XIX, em Weimar, Alemanha. O raciocínio dele foi que os jovens se iriam incentivar uns aos outros, ouvindo todos a tocar e desejando melhorar o seu próprio desempenho. Desde então esse modelo de ensino ganhou muita popularidade e teve muita adesão.

Muitos artistas e pedagogos estão a orientar masterclasses deste tipo pelo mundo fora, e normalmente é a sua reputação, o seu percurso artístico e o seu dom de ensino que atraem os frequentadores, na maioria jovens de idade formativa.

Ouvir conselhos de outras pessoas, sobre qualquer coisa que seja, muitas vezes não agrada a ninguém. Não foge a essa afirmação axiomática o caso dos artistas, os quais, de grosso modo, estão muito convictos na sua maneira de ver as “coisas de arte” e na sua própria expressão artística.

No entanto, os grandes artistas sempre foram aqueles que, enquanto jovens, tinham a humildade e abertura para se abrir às alternativas, para fugir dos dogmas e interpretações impostas unipolares. Porque, quem se dirige por esse caminho tortuoso e, às vezes, doloroso, reconhece a natureza assintótica do lema “Per aspera ad astra”, por ásperos (caminhos) até aos astros. O ideal deve permanecer o ideal, pois, se o alcançarmos, ele deixa de ser um ideal. Daí, os jovens começam a entender que a sua aprendizagem continuará ao longo das suas vidas e que, sobretudo nas artes, esse processo demora para dar os seus frutos.

Nos dias de hoje, e apesar de toda a comunicação digital e masterclasses “online”, o encanto e a atração do contacto ao vivo continuam a entusiasmar os jovens artistas. Nesse sentido, e sobretudo ao longo da última década, são exemplares as oportunidades que o Conservatório – Escola Profissional das Artes da Madeira tem proporcionado aos seus alunos. Em primeiro lugar, devido à colaboração com a ANSA, através da Orquestra Clássica da Madeira, cujos artistas convidados orientam com regularidade as masterclasses no Conservatório, para mais variados instrumentos. Também, entre outras instituições, através da colaboração com a Associação Amigos do Conservatório de Música da Madeira (AACMM), que igualmente tem por objetivo contribuir ao máximo possível, dentro das suas atividades, para estes contactos artístico-pedagógicos. Para muitos alunos, essas são as primeiras janelas abertas para o exterior, através das quais eles conseguem vislumbrar as exigências e os padrões de qualidade que vigoram noutras paragens. Para outros, é um acordar imprescindível que aumenta a motivação e orienta os seus esforços. Esses contactos motivam igualmente os professores e ajudam-lhes no processo regular da aprendizagem dos alunos.

Neste contexto, dentro de cerca de duas semanas, a partir do dia 12 de julho, a AACMM vai inaugurar (depois do cancelamento da primeira tentativa, dois anos atrás, devido à Covid) a primeira edição da Masterclass Internacional de Piano, através do seu projeto Academia Internacional das Artes da Madeira. Esta masterclass, realizada em colaboração com o Conservatório, pretende ser uma janela artística do mundo para a Madeira, trazendo para este destino exclusivo docentes e alunos do exterior, mas sempre com a porta aberta para os talentos regionais. Professores convidados de renome, alunos de nível bastante elevado, muitos dos quais estrangeiros, a hospitalidade e a beleza da Madeira – eis os ingredientes para uma iniciativa que se espera poder crescer e fortalecer os laços pedagógicos, artísticos e institucionais. Um bem-haja a todos!