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Grupos criminosos recrutaram crianças e adolescentes em Caracas

Foto Davide Bonaldo/Shutterstock.com
Foto Davide Bonaldo/Shutterstock.com

Grupos criminosos de Caracas recrutaram crianças e adolescentes para o crime, denunciou esta quarta-feira o Centro Comunitário de Aprendizagem (Cecodap).

A denúncia faz parte do relatório "Escravizar para delinquir", elaborado em conjunto pelo Cecodap e a Agência de Jornalistas e Amigos da Infância (Agência Pana), que reivindica do Estado venezuelano uma abordagem preventiva abrangente.

Entre os grupos assinalados, destaque para o 'El Koki', que controlava os bairros Cota 905, El Cementério e La Vega, a oeste de Caracas.

"O recrutamento de crianças e adolescentes pelo crime organizado (...) tem permanecido como uma atividade sem visibilidade entre todas as levadas a cabo por este grupo criminoso que emergiu das fracassadas 'Zonas de Paz' e que acumulou tanto poder de fogo como para espalhar o terror na capital do país", explica-se.

No entanto, acrescenta-se, apesar dessa "invisibilidade" nos processos penais contra os detidos na operação policial-militar para desmantelar o grupo, realizada em julho de 2021, "o Estado reconheceu tacitamente o recrutamento de crianças e adolescentes, ao fazer acusações pelo delito de utilização de meninos, meninas e adolescentes para delinquir".

"Trata-se de um reconhecimento incompleto, uma vez que a questão mais relevante em termos de proteção de crianças e adolescentes é determinar as causas e consequências do recrutamento de menores de idade pelo crime organizado", salienta-se.

No documento precisa-se que as principais causas dos recrutamentos de crianças são "a situação socioeconómica precária em que vivem, a insegurança alimentar, o abandono da escola e a violência doméstica".

"O recrutamento de menores é forçado pelas circunstâncias e pela violação dos seus direitos humanos. Não equivale ao alistamento voluntário, uma vez que as crianças e adolescentes não se juntam ao crime organizado num pleno exercício da sua vontade", nota-se.

Segundo o Cecodap, "o principal isco é a oferta de um rendimento semanal em dólares" para que possam "cobrir as necessidades reais ou sentidas: alimentação, vestuário e calçado", como símbolos de estatuto social, e "a proteção numa lógica da lei do mais forte".

"Na maioria dos casos, o recrutamento está determinado pelas relações de vizinhança e familiaridade entre os delinquentes recrutadores com os recrutados, uma vez que ambos fazem parte da mesma comunidade", explica-se.

No documento salienta-se que quando 'El Koki' precisou aumentar as suas fileiras, "para combater as forças de segurança do Estado, o recrutamento tornou-se mais coercivo e maciço".

 "A incorporação tem diferentes graus de envolvimento, associados a cargos e funções que formam uma verdadeira carreira. Quanto mais alto for o nível, maior é o risco de morte", sublinha.

A investigação, de 160 páginas, identificou quatro graus de vinculação das crianças ao grupo criminoso: Os rapazes dos recados, que se encarregam do fornecimento de bens de primeira necessidade e outros; os sentinelas de áreas estratégicas de territórios controlados; os pequenos traficantes e os "malandros" que aspiram pertencer ao grupo e que recebem uma arma de fogo para fazer cumprir as regras e cometer os crimes que sustentam a economia do grupo, entre eles a extorsão, o sequestro, o tráfico de drogas e o roubo de viaturas.

"O objetivo último do recrutamento é a exploração, baseada no abuso de poder e violência e, neste sentido, constitui uma violação contínua e simultânea de quase todos os seus direitos: vida, integridade pessoal, liberdade, educação, saúde física e mental, ter uma família e não ser separado dela", fundamenta-se no relatório.

O Cecodap e a Agência Pana recomendam ao Estado venezuelano que compreenda que este tipo de recrutamento "é uma forma contemporânea de escravidão moderna" que requer "uma abordagem abrangente para previr e erradicar as causas de um delito especialmente complexo".

Por outro lado, defendem que a primeira tarefa do sistema de proteção das crianças e adolescentes é realizar "um diagnóstico do recrutamento" e que dar visibilidade ao problema "é o primeiro passo para solucioná-lo".

Por outro lado, recomendam ainda o uso dos organismos públicos já criados, prestar assistência e que o sistema penal priorize, respeite e faça respeitar, os direitos das crianças e adolescentes que são recrutados.