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Brasil manteve má gestão da pandemia e dos direitos humanos em 2021

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Foto AFP

O Brasil foi marcado por crises, pela manutenção de uma má gestão da pandemia e vários episódios de desrespeito pelos direitos humanos em 2021, segundo o relatório anual da Amnistia Internacional (AI) divulgado hoje.

A organização de defesa dos direitos humanos frisou no relatório "Líderes políticos e grandes empresas colocam lucro e poder à frente das pessoas, desrespeitando promessas anteriores de uma recuperação justa da pandemia" que o prolongado período de instabilidade e crise no Brasil persistiu no ano passado.

"O Governo Federal não assumiu o compromisso de coordenar respostas efetivas na gestão da pandemia de covid-19, que afetou os direitos humanos da população. Pessoas que pertenciam a grupos historicamente discriminados foram desproporcionalmente afetadas pela emergência sanitária, que agravou a crise económica e social e aumentou a precariedade das suas condições de vida", destacou a organização não-governamental (ONG).

O documento avaliou que o atual Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, continuou a "promover iniciativas contrárias às necessidades da maioria da população e prejudiciais ao meio ambiente e justiça climática. As suas declarações, que muitas vezes difamaram defensores e ativistas de direitos humanos, também minaram a Constituição e a independência do poder judiciário".

Sobre a pandemia, a Amnistia Internacional lembrou que o Senado criou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as ações e omissões do Governo brasileiro na gestão da crise sanitária, que investigou denúncias de corrupção, o colapso dos sistemas de saúde público e privado, negligência em relação às vacinas e os danos causados pela falta de políticas para lidar com a crise social em 2021.

A ONG destacou que mais de 615.000 pessoas morreram de covid-19 até dezembro de 2021 no Brasil e, de acordo com dados do grupo Alerta -- uma coligação de ONG -- até março de 2021, 120.000 mortes poderiam ter sido evitadas se o Governo não tivesse repetidamente ignorado as evidências científicas e as estratégias coordenadas para enfrentar a pandemia.

O relatório também citou um estudo realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa sobre Soberania e Segurança Alimentar, entidade nacional independente de pesquisa, para destacar que a insegurança alimentar no Brasil aumentou 54% desde 2018.

"A grave insegurança alimentar, ou fome, afetou 19 milhões de pessoas em 2021, 9% da população. Entre as famílias de pequenos agricultores e comunidades quilombolas [moradores de comunidades formadas por negros que fugiram da escravidão], indígenas e ribeirinhos [população que vive na margem dos rios em áreas isoladas], a proporção de domicílios afetados aumentou para 12%", acrescentou.

Segundo o documento, o Governo brasileiro também terá usado uma falsa dicotomia de defesa da economia ou da vida para justificar a falta de promoção de medidas de prevenção ao contágio entre aqueles que não puderam trabalhar remotamente durante a pandemia.

O relatório destacou que o Governo não garantiu adequadamente o direito à informação da população.

"Declarações públicas imprecisas ou deliberadamente enganosas sobre prevenção, tratamento e vacinas contra a covid-19 tentaram minar pareceres científicos e vozes dissidentes, que fomentaram a desinformação e reduziu o espaço da sociedade civil", salientou.

"A restrição à participação da sociedade civil no debate público intensificou-se devido à hostilidade que o Governo federal mostrou para a imprensa, movimentos sociais, ONG e outras vozes críticas", segundo a AI.

Só no ano passado houve 176 relatos de jornalistas, membros do Congresso Nacional, influenciadores, 'media' e ONG --- incluindo a Amnistia Internacional Brasil -- que foram bloqueados nas redes sociais do Presidente Bolsonaro.

Além disso, o país manteve a política de guerra contra tráfico de drogas que continuou a alimentar o ciclo de violência e homicídios no país. Em 2020, a polícia matou 6.416 pessoas. Mais da metade das vítimas eram jovens homens negros.

A violência também atingiu defensores dos direitos humanos. Segundo a ONG Global Witness, o Brasil foi o quarto país do mundo com o maior número de homicídios de líderes ambientais e defensores do direito à terra.

Entre janeiro e dezembro, 10.362 quilómetros da floresta amazónica foram destruídos no país, mais 29% face a 2020. Junto com a destruição do meio ambiente ocorreram uma série de violações dos direitos dos povos indígenas e população rural, segundo o relatório.

Em agosto, o movimento Articulação da Povos Indígenas do Brasil (APIB) apresentou uma queixa no Tribunal Penal Internacional contra o Presidente brasileiro pelo crime de genocídio devido à falta de políticas para a pandemia.