Será antiga a ideia de criar um internamento de Psiquiatria no Hospital Central da Madeira?
O psiquiatra Daniel Neto afirmou, no domingo, que o Hospital Central da Madeira deve de ter um internamento de Psiquiatria, o que deve de coexistir com o serviço prestado nas casas de saúde mental, no caso, São João de Deus e Dr. Câmara Pestana. A afirmação foi feita no âmbito de uma iniciativa partidária, mas, aqui, não relevaremos o contexto, apenas o conteúdo do que foi dito.
Às palavras de Daniel Neto, muitas foram as pessoas que reagiram, nomeadamente na área da saúde, algumas dirigindo-se directamente ao DIÁRIO, afirmando que a ideia não é nova, apesar de nunca ter sido concretizada.
Terá razão quem faz tais observações?
A verificação da veracidade será feita com base em documentos oficiais (comunicado do SESARAM) e em notícias publicadas na comunicação social da Madeira.
A consulta aos arquivos do DIÁRIO rapidamente permitiu verificar que há muitos anos, pelo menos 12, é referida a necessidade de o Hospital Central da Madeira - na altura não se colocava a hipótese de outro que não o Dr. Miguel Mendonça - ter um internamento de Psiquiatria para agudos.
A criação de um espaço específico, que não de adaptação de qualquer dos existentes, esteve associada à concretização de um outro projecto, o do Medicina Reprodutiva / Centro de Procriação Médica Assistida.
Para providenciar um espaço adequado a ambas, em 2013, sob a direcção do médico Miguel Ferreira, o SESARAM avançou com uma obra de criação de um novo espaço sobre a área da consulta externa. Todo o segundo piso seria constituído por enfermaria de Psiquiatria, ficando a Medicina Reprodutiva no restante novo espaço. Esteve em causa uma obra de 6,2 milhões de euros, que deveria ficar concluída em meados de 2015.
Entretanto, no final de 2014, o médico Miguel Ferreira foi afastado do Conselho de Administração do SESARAM e Alberto João Jardim deixou de presidir ao Governo Regional, passando o cargo a ser ocupado por Miguel Albuquerque, em 2015.
Na sequência dessas alterações, um conjunto alargado de obras parou, contando-se de entre elas a ‘recuperação do edifício do Centro de Saúde do Bom Jesus – 4 milhões de euros’, a ‘Obra de Execução de edifício para instalação de sistema de tratamento por micro-ondas de resíduos no Hospital Dr. Nélio Mendonça’ – ainda está como estava, e a ‘Obra do Centro de Procriação Médica Assistida/Psiquiatria”.
A 3 de Julho de 2015, o novo secretário da Saúde, Manuel Brito, anunciava que o projecto ia ser alterado e que o espaço destinado ao internamento de Psiquiatria ia passar a ser de Medicina Interna, que teria 30 camas.
A obra, informava o SESARAM, em comunicado, a 15 de Março de 2016, ia custar 1,8 milhões de euros.
No dia 1 de Fevereiro de 2017, já com outro secretário da Saúde, Pedro Ramos, no final da primeira reunião do Conselho de Saúde Mental, o Governo Regional fazia marcha-atrás no discurso: “(...) Um caminho que tem de ser rapidamente iniciado, com a definição do Serviço de Psiquiatria dentro do SESARAM. Serviço de Psiquiatra com internamento, embora reduzido, mas para as situações mais urgentes, que precisem de outro tipo de acompanhamento.”
Questionado sobre quantas camas e em que espaço deveria ter e ficar esse internamento, Pedro Ramos respondeu: “Essa é uma pergunta um pouco descabida neste momento, porque acabámos a primeira reunião.”
Até hoje não foi definido o tal número que era descabido ser questionado em 2017.
Em Abril de 2022, era o mesmo Daniel Neto quem afirmava a conveniência de o Serviço de Psiquiatria possuir um internamento próprio, como factor capaz de fomentar a fixação de psiquiatras no serviço público de saúde.
Em Outubro de 2023, o assunto foi abordado pelo director da Casa de Saúde de São João de Deus. Em entrevista ao DIÁRIO, Eduardo Lemos disse: “A nossa estrutura é um hospital psiquiátrico. É evidente que a Lei de Saúde Mental preconiza que o internamento agudo em Psiquiatria seja no hospital central, porque há várias situações que têm a ver com comorbilidades associadas e que necessitam de uma atenção diferenciada, não só da Psiquiatria, mas de outras áreas de especialidade clínica. Achamos que está correctíssimo e que é bom que isso aconteça no menor tempo possível (…). O novo hospital contempla 24 camas [para esse efeito] e resolve-se esta questão.”
Como se constata, têm razão os leitores quando afirmam que a ideia de criar um internamento próprio de Psiquiatria no Hospital Central da Madeira é antiga, apesar de nunca concretizado.