DNOTICIAS.PT
Madeira

Climatologista defende antecipação do fogo para evitar "pico de instabilidade" da Depressão Francis

Especialista defende que as autoridades madeirenses não devem ficar reféns da hora tradicional

Imagem CNN-Portugal
Imagem CNN-Portugal

Mário Marques alerta que a meia-noite coincidirá com o agravamento do estado do tempo, trazendo chuva forte e vento frontal à baía do Funchal. O especialista sugere que o espectáculo pirotécnico aconteça mais cedo, salvaguardando a segurança e a visibilidade do evento.

A poucas horas das doze badaladas, a incerteza paira sobre aquele que é considerado um dos maiores espectáculos pirotécnicos do Mundo. E Mário Marques, climatologista, lançou esta manhã um alerta sério na CNN-Portugal: as condições meteorológicas previstas para a meia-noite na Madeira são incompatíveis com a realização segura e visível do fogo-de-artifício.

Por isso, a solução proposta pelo especialista passaria por antecipar o espectáculo para o início da noite, uma vez que a Região estará sob a influência directa da Depressão Francis, um sistema que trará "muita instabilidade" precisamente no momento em que milhares de pessoas esperam celebrar a entrada em 2026 no arquipélago.

Declarações Mário Marques

Face a este quadro, Mário Marques defende que as autoridades não devem ficar reféns da hora tradicional. Para o especialista, há uma janela de oportunidade antes do agravamento severo do tempo, sugerindo que o fogo aconteça por volta das 20h00, quando "o vento não será uma preocupação".

Eventualmente, se anteciparem a hora do fogo, eu acho que era uma decisão mais sensata relativamente aos dois riscos: que é a precipitação ser mais intensa e o vento soprar de uma forma gradual (...) e intensificar-se. Isso seria a melhor situação. Mário Marques, climatologista

Confira a localização dos postos de lançamento do fogo-de-artifício na Madeira

Está tudo a postos só falta as condições meteorológicas colaborarem

Confrontado com os enormes desafios logísticos que tal mudança implicaria, nomeadamente para os hotéis que têm jantares de gala cronometrados para a meia-noite, desvalorizou o transtorno face ao risco de cancelamento total ou de um espectáculo falhado.

Já na sua análise técnica detalhada à CNN-Portugal, Mário Marques não poupou nos dados científicos para justificar a sua preocupação. O climatologista descreveu o cenário que é visível nos instrumentos de monitorização atmosférica.

Olhando para a imagem de satélite, radar e também os tefigramas em termos de profundidade da atmosfera, existe muita alimentação, quer em termos de humidade e vapor de água, mas também de um forte gradiente térmico. O que é isso? Quer dizer que poderá potenciar o desenvolvimento vertical [das nuvens]. Mário Marques, climatologista

Esta configuração atmosférica cria as condições perfeitas para um agravamento rápido do estado do tempo. Segundo as previsões, a situação começará a deteriorar-se "logo a partir da hora de jantar", com uma "intensificação da precipitação" e um "aumento gradual do vento".

No entanto, o pior cenário está reservado para a madrugada, coincidindo perigosamente com a hora do espectáculo. "Esta depressão está com um fluxo mais rápido e poderá antecipar um pouco o início da precipitação mais forte", o que coloca a meia-noite no centro da tempestade.

Governo Regional mantém fogo à meia-noite, mas ajusta animação

O Governo Regional da Madeira confirma, hoje, a manutenção do tradicional fogo-de-artifício da Passagem de Ano, que será lançado à meia-noite do dia 31 de Dezembro.

Vento Frontal: o perigo para o Funchal

Mais do que a chuva, que "estraga" a festa visual, é o vento que preocupa o climatologista em termos de segurança pública. A orientação prevista para o vento é de sul-sudoeste, o que o coloca numa trajetória direta contra a cidade.

"O vento será da componente sul-sudoeste, portanto é quase frontal à Baía do Funchal. O fogo de artifício que eventualmente será projetado tende a ir para dentro da ilha todo o fumo e tudo o que é o impacto da projeção" alertou.

IPMA prolonga avisos meteorológicos para a Madeira até 3 de Janeiro

O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) actualizou a previsão de condições meteorológicas adversas na Madeira e Porto Santo, com alguns avisos a prolongarem-se por várias horas e mesmo ultrapassando o dia 1 de Janeiro de 2026.

Mário Marques foi também claro quanto aos riscos para quem assiste: "Claro que o vento terá de ser muito forte para que essa projeção cause, eventualmente, um risco muito mais elevado", mas a conjugação de chuva intensa e vento a empurrar detritos para a zona urbana é um cenário que deve ser evitado.

Para os observadores mais atentos, o mar dará o primeiro sinal de alerta. Mário Marques explicou um fenómeno curioso que serve de aviso prévio.

"Poderão ver já os chamados, entre aspas, 'carneirinhos' ou vento nas ondas, mas o vento viaja sempre muito mais depressa no seu grande comprimento de onda na superfície do mar do que propriamente na atmosfera e adianta-se, por vezes, cerca de 7 a 8 horas em relação à sua intensidade mais forte sentida na atmosfera", alertou.

Por fim, sobre a responsabilidade de tomar uma decisão tão impactante, o climatologista lembrou que, embora a ciência (representada pelo IPMA) dê os dados, a responsabilidade última é governativa.

Tem que obedecer às entidades oficiais que regulam e que são especialistas na área (...), mas a palavra final é sempre uma decisão política. Claro que o ideal é chegarem a um acordo. Eu acho que deverão ponderar de uma forma mais verosímil a eventualidade da antecipação do fogo. Acho que é a melhor opção. Mário Marques, climatologista

Além da questão do fogo, Mário Marques deixou ainda um conselho operacional: "Deixava todos os operacionais da proteção civil e também dos agentes interligados para estarem mais disponíveis caso existam ocorrências relacionadas com esta Depressão Francis", sugerindo que ter equipas de socorro focadas num espectáculo de fogo sob tempestade poderá desguarnecer a resposta a outras emergências na ilha.