Despesa, habitação e mobilidade criticadas na aprovação do Orçamento do Funchal
A Câmara tem capacidade de se endividar em 60 milhões de euros, revelou Jorge carvalho
A Assembleia Municipal do Funchal aprovou a proposta de Orçamento para 2026 da Câmara Municipal com os 25 votos a favor apenas da Coligação Funchal Sempre Melhor. Os seis deputados do Chega votaram contra, tendo os seis do Juntos Pelo Povo, os quatro do Partido Socialista e a deputada única da Iniciativa Liberal optado pela abstenção. Este e o pacote fiscal, aprovado por unanimidade, foram os pontos que mais aqueceram a sessão ordinária que teve lugar esta manhã, nos Paços do Concelho. A reunião foi interrompida para almoço, ia ser retomada esta tarde.
No período antes da ordem do dia, Sérgio Abreu do PS lembrou a falta de uma caixa multibanco no Mercado da Penteada, disse que as quebras nas vendas foram da ordem dos 30%. Questionou ainda em relação aos planos de pormenor de reabilitação urbana do Carmo e Ornelas que ficaram na "gaveta". O presidente da Câmara, Jorge Carvalho, respondeu em relação ao multibanco, informou a Assembleia Municipal de que tem desenvolvido esforços junto de instituições bancárias e outras para que a Penteada volte a ter multibanco. Quanto aos planos, coube ao vereador Paulo Lobo explicar que estes não estão esquecidos, que o do Carmo está na fase final, que em breve irá para discussão pública. Quanto ao do Ornelas, levará mais tempo, o vereador com o pelouro do ambiente acredita que irá para discussão pública até ao fim de 2026.
Houve também tempo para um voto de congratulação proposto pelo JPP à Associação Teatro Experimental do Funchal, aprovada por unanimidade.
A ordem de trabalhos começou com a discussão e votação das alterações ao regimento, tendo as alterações aos artigos 22.º; 41.º (números 4,5 e 6); 47.º (n.º5) e 48.º (n.º 4) sido aprovados com os votos a favor de todos os deputados. Já a alteração ao artigo 47.º, referente aos tempos de intervenção na Assembleia, proposto pela Coligação Funchal Sempre Melhor, foi aprovada por maioria, com votos 31 votos favoráveis da Coligação e Chega; e 12 abstenções do JPP, IL e PS. Já a alteração ao artigo 47.º (número 1) foi rejeitada com os votos contra do Funchal Sempre Melhor, votos favoráveis do JPP e IL e abstenções dos deputados do PS e Chega. Logo depois, a votação global do novo regimento para o mandato 2025-2029 foi aprovada por unanimidade.
No ponto seguinte, o PS interveio para abordar a crise habitacional lembrando o “flagelo” que atinge as famílias de baixo rendimentos, a classe média, os jovens e as famílias monoparentais. Criticou a perda de 23 milhões de verbas do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), parte do pacote de 28 milhões que deveriam ter contruído 202 fogos no Funchal. Só avançaram 33 na Nazaré, lamentou. Com base na informação escrita do presidente da Câmara, questionou sobre os bairros da Penha de França, da Ponte de Quinta das Freiras, que estão por concretizar, tendo Jorge Carvalho respondido que o concurso para o Bairro da Ponte foi lançado e que o concurso para a construção do Bairro das Freiras será para breve. Voltou a afirmar que a habitação é a área prioritária.
Aproveitando a deixa, recordou que em oito anos só foram construídos 66 apartamentos pela Coligação Confiança, liderada então pelo PS, e que os projectos que estariam em condições de serem lançados, não estavam. O presidente da câmara do Funchal garantiu: “Não se perderam verbas, perdeu-se foi tempo”.
O alojamento local também foi abordado pela socialista Isabel Garcês, que quis saber em que situação está a criação do regulamento, recordou o caso da habitação a custos controlados que foi para AL e quantos novos alojamentos foram aprovados desde Agosto, pergunta que ficou sem resposta. Jorge Carvalho esclareceu que a suspensão foi a medida necessária para fazer a “justa avaliação”, deixou claro que não está contra o AL desde que cumpra os requisitos e que situações como a da cooperativa não se voltarão a repetir. “Tudo o resto está a ser analisado”, disse apenas.
A votação do pacote fiscal deu espaço para a reivindicação de louros e para o lançamento de desafios, com a Coligação a picar o JPP em relação às diferentes medidas fiscais que defendem no Funchal e em Santa Cruz e este a lembrar que algumas medidas começaram em Santa Cruz. O PS reivindicou a paternidade da descida de impostos no Funchal, declarando que o pacote agora proposto é a continuidade do iniciado em 2013, quando a Mudança assumiu a autarquia funchalense.
Os deputados da coligação usaram da palavra para elogiar o pacote, os benefícios para as famílias, o aumento da verba devolvida aos funchalenses por via do IRS e IMI. Miguel Castro, do Chega, por seu lado, alertou: “Não podemos cair nesta teia de boas intenções”. A seu ver, nem todos os exemplos de outras câmaras devem ser seguidos. Assegurou que tudo o que sejam medidas para devolver dinheiro aos contribuintes o Chega estará a favor.
João Paulo Marques desafiou os santa-cruzenses a abrirem os olhos. “Se é possível aqui no Funchal, é possível em Santa Cruz”, disse, referindo-se à devolução máxima do IRS aos munícipes, que é de 5% no Funchal e de 1% em Santa Cruz. O deputado do Funchal Sempre Melhor acusou Élvio Sousa, do JPP, de não ser consequente.
Élvio recordou outras ajudas do Município de Santa Cruz e mesmo quando estavam com as medidas do plano de ajustamento financeiro o IMI sempre foi o mais baixo. Adiantou que o pacote fiscal será também melhorado em Santa Cruz, mas não agora. “Não foi Santa Cruz que foi atrás do Funchal, foi o Funchal que foi atrás de Santa Cruz”, afirmou o líder do JPP, lembrando que há municípios liderados pelo PSD que não devolvem nada aos munícipes em sede de IRS, como a Ribeira Brava.
“Não compreendemos a hipocrisia de dizer uma coisa no Funchal e fazer outra em Santa Cruz”, atacou ainda João Paulo Marques, sublinhando os mais de 23 milhões de euros devolvidos nos últimos quatro anos no Funchal em impostos.
Jorge Carvalho revelou que em 2026 serão 10 milhões que serão devolvidos e que se trata de continuidade porque as devoluções estão no máximo e as cobranças no mínimo. Disse que se trata de um pacote de justiça social, que dá aos munícipes o poder de decidir onde aplicar o dinheiro. “É diferente de assistencialismo social”, sublinhou, em resposta a Élvio Sousa.
A votação foi feita logo depois, com a redução do IMI a ser aprovada por unanimidade, o IMI familiar igual e o IRS, com a devolução dos 5%, também. Já em relação à Taxa de Direito de Passagem foi aprovada por maioria, a IL absteve-se. Rosie Bayntun defendeu que o pacote deveria ser mais ambicioso no alívio fiscal sobre as famílias.
A discussão da proposta de orçamento aqueceu, com a oposição a criticar o valor da despesa corrente e o baixo investimento nos quase 136,7 milhões de euros orçamentados para 2026 para a CMF. Gasta muito, investe pouco, resumiu Maria Carmo Gomes, do Chega, destacando que só 21% da verba é para investimento. Entende que é um orçamento com “pouca coragem política” numa altura “em que os fundos desaparecem”.
Álvaro Martins, do JPP, criticou os pouco mais de 5 milhões para a habitação, a forte dependência de financiamento externo e a falta de novos projectos. A cidade, criticou, está cada vez mais congestionada e o orçamento só traz mais obras viárias e mais alargamentos pontuais, lamentou. “Mais remendos”. “Não resolve os problemas, apenas adia”. O elevado custo de vida, a falta de alternativa em supermercado, com alusão ao LIDL, e a pobreza também foram focadas na intervenção.
João Paulo Marques questionou pelas propostas de alteração ao Orçamento para 2026 apresentadas pelo JPP. Álvaro Martins e Élvio Sousa acreditavam que tinham submetido, na verdade o que foi apresentado foi uma declaração de voto. A forma levou a mais troca de galhardetes, com o JPP a afirmar que efectivamente sugeriu alterações e novas medidas atempadamente e a Coligação a deixar claro que formalmente não houve nada.
Vera Duarte, eleita pela coligação, trocou o lugar na mesa da Assembleia para intervir, fazer a defesa do orçamento no que respeita à habitação. A deputada lembrou que é um “problema global e sem soluções milagrosas”, mas que há da parte do Executivo planeamento e trabalho. Acrescentou que hão se resolve só com medidas municipais, que é necessário o envolvimento do Governo Regional e do Estado. Revelou que o regulamento de atribuição de habitação social da Sociohabitafunchal, a empresa municipal, será revisto em 2026. Destacou também que desde 2021 quase duas dezenas de pessoas em situação de sem abrigo foram retiradas das ruas.
Sérgio Abreu, do PS, usou da palavra para focar o que acredita são fragilidades do orçamento, agora aprovado. Referiu o aumento dos encargos financeiros em mais de 250%. “É preocupante”.
A seu ver há um desalinhamento entre as preocupações políticas e a execução financeira, com a despesa corrente a levar 79% do total da despesa, números falados várias vezes ao longo das mias de três horas da primeira parte da reunião. Sérgio Abreu disse tratar-se de um orçamento “pouco ambicioso, não correspondendo a um primeiro orçamento de mandato”.
Rosie Baytun também criticou o documento, pela despesa, assente em fonte volátil, pela redução e capacidade de investimento limitada, pela falta de resposta na mobilidade. “Continuamos numa lógica de obra pública pontual”.
A despesa foi defendida por João Paulo Marques, que em nome da coligação, lembrou que a despesa corrente é essencialmente salários e que o aumento assenta na actualização salarial, progressão de carreiras e prémios. E lamentou a falta de apresentação de propostas de alteração, transversal a todos os partidos. “Ou se esqueceram de apresentar, que eu não acredito, ou fizeram um acto de contrição e chegaram à conclusão que não conseguiam fazer melhor”. “Se não conseguem fazer melhor, é a hora de votar de forma favorável a este orçamento”, pediu. Mas não foram nesse sentido os votos da oposição.
Jorge Carvalho saiu em defesa do seu orçamento, começando por pedir para olhar para a frente da árvore, não para a parte de trás. Lembrou que este orçamento é superior ao do ano que agora termina, mesmo se retirar os investimentos nas fugas de água, nos pavimentos, no complexo da Nazaré e no sistema de vigilância que levou 17,3 milhões em comparticipação por parte da Câmara. “O Orçamento não é de contenção nem conservador. É rigoroso”, diferenciou o presidente da Câmara do Funchal, explicando que lá não está contabilizado o que precisa de financiamento externo. Garantiu que a Câmara está em condições de endividar em 60 milhões de euros, se a oportunidade de investimentos surgir. “É rigoroso porque não deixa facturas na gaveta”, acrescentou, lembrando o diferendo da Coligação Mudança, com a Águas e Resíduos da Madeira, que ainda está em contencioso.
Os 81% de autonomia financeira de receitas próprias, fundamental para um bom exercício, o pagamento a fornecedores em média em menos de 15 dias e os 10% para funções sociais foram apontados, assim como o investimento na habitação. A quantidade e qualificação dos recursos humanos continuou Jorge Carvalho, são essenciais para responder aos munícipes. “Não podem querer ter um bom serviço à cidade se não tivermos os meios para o fazer”.
O presidente garante que a mobilidade está a ser tratada. O plano que tinham é de 2018, Jorge Carvalho acredita que está desajustado e fragmentado, a aposta será num global e actual para responder à cidade.
Entre os investimentos, o presidente destacou ainda a aposta na qualidade da água que chega a casa dos funchalenses.
Jorge Carvalho admitiu que o orçamento podia ser outro, mas que este é o que está na base da sua eleição, espelha esses compromissos com a população que o elegeu.
Idalina Silva também usou da palavra, para perguntar sobre os contratos interadministrativos da Câmara com as juntas. A ex-presidente da Junta de Freguesia do Monte lembrou que enquanto a Câmara foi liderada pelo PS não recebeu qualquer montante. O presidente respondeu que está na fase de auscultação, que a ideia é melhorar os contratos para que cada junta possa dar melhor resposta aos munícipes. Não têm todas de fazer o mesmo, esclareceu. Cada uma será contratualizada para fazer o que faz de melhor, adiantou Jorge Carvalho.
A proposta de Orçamento foi aprovada com os 25 votos da Coligação Funchal Sempre Melhor, com os votos contra do Chega e as abstenções do JPP, PS e IL:
O mapa de pessoal para 2026 também foi votado, há intenção de reforçar os quadros, serão 2.500 postos de trabalho. ”Não é a máquina a crescer, é a capacidade de resposta. Uma cidade não se governa sem pessoas” , justificou o deputado Vasco Marcial, da Coligação. Nesta votação o PS abasteve-se, os restantes votaram a favor.